A opinião de ...

Camões e as decisões

Foi há precisamente oito dias que o Presidente da República anunciou que face à situação política do país iria convocar eleições pela segunda vez no seu mandato.
Se, na primeira, foi o impasse em torno da aprovação de um Orçamento para o país, esta segunda justificou-a com a demissão do Primeiro-Ministro, envolvido numa investigação pela Procuradoria-Geral da República. Uma demissão tendo por base escutas de terceiros que, alegadamente, implicavam António Costa.
Até que se chegou à conclusão que, de facto, o Costa implicado era outro, pelo menos em alguma delas. Isso diz muito da sanha persecutória ao Costa Primeiro.
Para já, fica a ideia de que, hoje em dia, é simples afetar a democracia do país, basta haver uma qualquer acusação, mesmo que depois não resulte em nada, deixando o país entregue aos humores de quem não é eleito.
Agora, ao contrário das eleições para Presidente da República, as eleições Legislativas não servem para escolher o Primeiro-Ministro, embora seja isso que aconteça na prática. Servem, sim, para escolher a constituição da Assembleia da República (os seus deputados), que, de entre eles, elegem um que será o Primeiro-Ministro e liderará o Governo do país.
Por isso, António Costa não foi eleito PM, foi eleito deputado pelo povo e escolhido para PM pelos restantes.
Por tradição, aquele que será designado PM apresenta-se nessa condição aos eleitores.
Em 2004, quando Durão Barroso trocou o lugar de chefe de Governo pelo de presidente da Comissão Europeia, o Presidente da altura, Jorge Sampaio (do PS), entendeu dar oportunidade à coligação PSD-CDS, que tinha sido eleita nas urnas, de continuar a governar com o seu programa, o mesmo que tinha sido sufragado no ato eleitoral. Aceitou a indicação da coligação de Santana Lopes como novo PM.
Agora, Marcelo não fez isso. Entendeu usar da desconfiança de que a indigitação de um novo PM levaria, necessariamente, a novas eleições dentro de pouco tempo. É uma visão talvez injusta.
Em vez da ânsia de vingar as afrontas de Costa, poderia ter dado corda a um novo PM indicado pelo PS. A correr bem, era ao Presidente que se devia. Se corresse mal, dava corda ao PS para se enforcar, acabando por promover um novo governo de Direita, que, no fundo, sempre foi essa a sua ideia.
Certo é que pela segunda vez no seu mandato, verifica-se instabilidade governativa. E aquele passeio noturno até ao Beco da Traição, onde foram executados os Távoras, porque ousaram desafiar o chefe do regime, diz muito das motivações de uns e outros.
E, como dizia Luís de Camões, nos Lusíadas, “um rei fraco torna fraca a forte gente”.
Já um rei forte protege os seus. O líder forte tem de ser reto. Em tempos de crise, de conflito, precisamos de líderes fortes. Exige-se uma liderança forte.
Será que foi isso que tivemos?

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