A opinião de ...

Zero

A taxa zero do IVA será aplicada a um conjunto limitado de produtos alimentares de primeira necessidade, ou seja será um subgrupo do conjunto de mercadorias já contemplado com a taxa reduzida de 6%. Será, portanto, se refletida na totalidade, no preço final, um ganho pequeno. Seis euros em cada cem! De tal forma pequeno que o próprio ministro das Finanças, em entrevista à RTP, para o assinalar alterou a escala: “doze euros, numa despesa mensal de duzentos!” E, é aí, que começa a primeira fragilidade desta medida porque pretendendo ser um apoio adicional às famílias mais desfavorecidas funciona de forma inversa à que se pretende. Pois se, pelas palavras do governante, permite a economia de pouco mais de uma dezena de euros para um agregado com baixas despesas no cabaz alimentar, esse montante sobe significativamente para quem tendo maior poder de compra, gaste, consideravelmente mais! O apoio é tanto maior quanto maiores forem os recursos dos cidadãos, o que é substancialmente injusto, neste caso de produtos de primeira necessidade, em período de austeridade.
Tudo isto, com o pressuposto de que o processo implementado funcionará na perfeição. O que é duvidoso. A começar pela garantia de que toda a poupança fiscal chegará ao bolso dos consumidores. Tal implicará, uma operação gigantesca (improvável) de observação e fiscalização minuciosa ou o cumprimento efetivo e de boa-fé de todos os intervenientes, o que não é, seguramente, um dado adquirido. A começar pelo estranho prazo de quinze dias para implementar a efetiva baixa de impostos. Numa altura de total informatização em que os armazéns são geridos em tempo real, é estranha tal exigência! Mesmo que a redução fosse nos meios de produção, que só afetasse as novas aquisições, podendo haver a necessidade de garantir a rentabilidade das existências, quinze dias era um período exagerado! A rotatividade, até por uma questão de validade, para a maioria dos produtos, é bem inferior! Mas acontece que a baixa do IVA, uma vez aprovada é automática e abrange todos os produtos, mesmo os que estão em loja! Para quê tanto tempo para refletir no utente uma poupança que será, imediata, para o vendedor? Alguém acredita que se, em vez de uma baixa fosse um aumento, o seu reflexo demorasse igual período até chegar às prateleiras dos hipermercados?
Ao recusar tabelar os preços (ou fixar valores máximos), o Governo admite (a justificação para não o fazer vai, precisamente, nessa direção) que vai (ou pode vir) haver aumento nos custos a pagar pelos consumidores. E, assim sendo, como e com que meios vão as autoridades garantir que os diferenciais mantêm a rigorosa independência da descida do imposto. Para além disso ficará sempre a dúvida, a seu tempo e oportunamente levantada por Mário Centeno, da influência indireta da atual baixa, numa lógica subida provocada pelo normal acerto entre as curvas de oferta e procura que regulam o mercado.
Há uma regra, genericamente aceite, que estabelece que, em situações idênticas, as mesmas causas provocam as mesmas consequências. Para que tal não aconteça é necessário que as condições ambientais sejam substancialmente diferentes. O que mudou tão radicalmente para que uma atuação que fracassou aqui ao lado, em Espanha e que por isso foi, durante algum tempo, recusado repercutir em Portugal, para que aqui possa ter sucesso?

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