Nordeste Transmontano

Análise aos resultados eleitorais no distrito de Bragança

Publicado por CR em Seg, 2013-10-07 14:41

César Urbino Rodrigues faz uma análise aos resultados eleitorais das autárquicas no distrito de Bragança:

Uma análise cuidadosa dos resultados eleitorais do passado fim-de-semana, para as autarquias, no distrito de Bragança, permite-nos perceber que algumas das tendências verificadas a nível nacional foram contrariadas entre nós, tendo em conta os resultados obtidos por cada partido em cada um dos concelhos do nosso distrito.

Alfândega da Fé – PS e PSD perderam votos

Neste concelho, a vitória do PS, através de Berta Nunes, foi significativa, tendo aumentado a diferença de votos do PS para a coligação PSD/CDS, já que em 2009 o PS teve mais 402 votos do que esta, enquanto que nestas últimas eleições a diferença de votos passou para 651.

No entanto, este aumento na diferença de votos, entre as duas candidaturas, não corresponde a um aumento da votação da candidatura vencedora. Pelo contrário, o PS perdeu 193 votos relativamente a 2009. Só que a coligação PSD/CDS ainda perdeu mais, já que obteve menos 442 votos que nas eleições anteriores.

Estes resultados podem reflectir as dificuldades financeiras que o Município de Alfândega da Fé tem vindo a atravessar, já que Berta Nunes tinha herdado um dos municípios mais endividados do país, o que a obrigou a tentar o reequilíbrio das finanças municipais durante estes últimos 4 anos, sem capacidade financeira para lançar novas obras com significado.

A terceira força política concorrente, PCP/PEV, obteve um acréscimo de 20 votos, passando de 44 para 64.

A abstenção também aumentou ligeiramente, ainda que sem grande significado.

Bragança – PSD e PS também perderam votos

A capital de distrito atrai sempre uma atenção especial, porque uma vitória aqui tem mais importância do que uma vitória em qualquer outro dos municípios do distrito. No entanto, os dois principais partidos concorrentes, o PSD e o PS, adoptaram estratégias semelhantes, que passaram pelo enfeudamento dos candidatos ao aparelho partidário.

É certo que Júlio Meirinhos, do PS, não se pode considerar um militante do aparelho, mas, ao não conseguir desvincular-se das imposições da Concelhia socialista, acabou por se tornar refém desse mesmo aparelho.

No caso do PSD, o candidato é o próprio presidente da Concelhia, impondo-se assim ao número 2 do executivo anterior, contrariando desta forma a solução mais comum nos municípios em que os presidentes não se podiam recandidatar e que foram substituídos pelos seus números 2. Podemos dizer, por isso, que a candidatura do PSD é claramente uma candidatura do aparelho.

A candidatura de Júlio Meirinhos sofreu desde logo os efeitos desse enfeudamento ao aparelho, já que nem conseguiu ganhar na aldeia natal do seu nº 2. Por outro lado, o distanciamento entre o aparelho socialista e o eleitorado é bem evidente nos resultados finais, já que teve menos votos do que em 2009, perdendo 712 votos dumas eleições para as outras.

Além disso, esta descida é ainda mais incompreensível tendo em conta que o PSD não só não manteve a votação de 2009, como até perdeu 906 votos. Por outro lado, a candidatura de Humberto Rocha também não se apossou destes votos perdidos pelo PSD, pelo que mais grave é a votação de Júlio Meirinhos.

Certamente que o desaire da candidatura socialista não se fica a dever apenas às fragilidades da lógica aparelhística. A própria figura de Júlio Meirinhos, que não é natural do concelho e que não tem propriamente nenhuma ligação especial a Bragança, também terá tido a sua influência nos resultados finais. A estes factores há que acrescentar a natureza da campanha adoptada, sem cartazes, e baseada apenas em 2 carrinhas «pão de forma» e nas deslocações pessoais. Por outro lado, foi notória alguma descoordenação, quando não algum contravapor por parte de alguns dirigentes do partido, tendo vindo ao de cima alguns interesses pessoais, que se sobrepuseram aos interesses do partido.

A derrota de Júlio Meirinhos é também a derrota de quem o impôs contra a vontade do presidente da Distrital, que estava convencido de ser capaz de, à 3ª vez, de ganhar a Câmara ao PSD, embora seja certo que, em actos eleitorais, os candidatos a candidatos muitas vezes confundem a sua imaginação e as suas próprias ilusões com a realidade.

Na candidatura do PSD vieram também ao de cima os efeitos do desgaste da governação do mesmo partido, a nível nacional, já que Hernâni Dias perdeu quase 1000 votos em relação à votação de Jorge Nunes em 2009, não obstante este também já ter perdido mais de 1 milhar de votos nas eleições de 2009.

Com as candidaturas do PSD e do PS a perderem cerca de 1600 votos, seria de esperar que a candidatura independente do« Movimento Sempre Presente», que teve em Humberto Rocha o seu principal rosto, subisse significativamente a sua votação. Não foi isso, no entanto, o que se  verificou, já que a candidatura de Humberto Rocha ainda perdeu 167 votos.

Curiosamente, também o CDS e o Bloco de Esquerda perderam alguns votos, embora não muitos, porque a sua votação de 2009 já não foi famosa. Dumas eleições para as outras, o CDS perdeu 95 votos, enquanto que o Bloco de Esquerda perdeu 62 votos. Por este andar, qualquer dia o CDS desaparece do mapa eleitoral do concelho.

 A única candidatura que conseguiu escapar desta vertigem de perda de votos foi o PCP/PEV, que subiu 67 votos, de 2009 para 2013. Nada de especial, mas sempre é melhor do que perder votos.

Carrazeda de Ansiães – PSD muito forte

 Neste concelho, sobressaem dois factos. Por um lado, a expressiva vitória do PSD arrasou tanto o CDS como o PS. Este ficou reduzido a cerca de metade dos votos obtidos em 2009, enquanto que o CDS se ficou pelos 789 votos. Em sentido contrário, o PSD passou de 1766, em 2009, para 2615, em 2013, o que equivale a uma subida de cerca de 900 votos.

A este facto temos de acrescentar um outro que poderia perspectivar outros resultados. É que a candidatura do CDS era apoiada por dois antigos presidentes de Câmara de Carrazeda, um do CDS e outro do PSD.

 

Freixo de Espada à Cinta – a tradição de nenhum presidente ganhar 3 eleições

Em Freixo de Espada à Cinta cumpriu-se a tradição de nenhum presidente de Câmara conseguir fazer mais do que 2 mandatos, perdendo sempre a reeleição no fim do segundo mandato.

Por isso, a derrota do PS não se pode considerar uma surpresa total, embora se possa falar em meia surpresa já que José Santos, mais do que pelo que tem feito na Câmara, é uma pessoa de grande influência no concelho pelo que tem feito na Santa Casa da Misericórdia, na Adega local e nos Bombeiros.

Desta vez, o PSD ganhou por 62 votos em relação ao PS. Para o efeito até nem precisou de subir muito a sua votação relativamente a 2009, já que passou de 1283 para 1357 votos, ou seja, um total de 74 votos. O PS é que perdeu bastantes mais do que aqueles que o PSD ganhou, porquanto passou de 1747, em 2009, para 1295, em 2013, o que perfaz uma perda de 452 votos.

De salientar que a lista vencedora, do PSD, tem nos 2 primeiros lugares, 2 antigos militantes do PS, o que não deixa de ser também uma bofetada no aparelho local do partido.

Macedo de Cavaleiros – a desilusão socialista

Este concelho era um daqueles em que o PS esperava uma vitória, não só porque o Beraldino Pinto já não se podia recandidatar por ter atingido o limite máximos dos 3 mandatos, mas também porque o CDS se desligara da coligação anterior com o PSD, concorrendo com listas próprias.

Mesmo assim, e não obstante o PSD ter perdido 1485 votos relativamente ao resultado obtido pela coligação vencedora em 2009, o PS acabou por ficar com menos 119 votos do que o candidato vencedor, do PSD.

O CDS acabou por amealhar praticamente os mesmos votos que o PSD perdeu em relação a 2009, o que deixa perceber que o PSD fez uma jogada arriscada ao desfazer a coligação.

Miranda do Douro – todos perderam em relação a 2009

Neste concelho sucedeu algo curioso, que veio acentuar a perspectiva do descrédito dos partidos junto dos eleitores. Na verdade, se é certo que, em vários outros concelhos, os principais partidos perderam votos relativamente a 2009, em quase todos esses casos houve sempre um ou outro partido que reforçou ligeiramente a sua votação. Aqui passou-se algo de diferente, já que todos os partidos que repetiram a candidatura em 2009 e 2013 perderam votos relativamente às eleições anteriores.

Assim, se o PSD perdeu 306 votos, o PS perdeu 382 e o PCP/PEV ficou com menos 11 votos. De salientar, no entanto, que desta vez o CDS e o Bloco de Esquerda também concorreram, o que não tinham feito em 2009, ainda que não tivessem passado duma votação residual, tanto num caso como noutro.

Mirandela – perdas significativas de votos tanto do PSD como do PS

Em Mirandela os dois partidos mais votados há 4 anos foram os que mais votos perderam, agora, já que o CDS perdeu apenas 108 votos, enquanto que o PSD perdeu 2142 votos, e o PS obteve menos 1260 votos.

A descida do PSD pode dever-se ao protesto pela política de Passos Coelho a nível nacional, mas a mudança de candidato também não será indiferente a este resultado. Efectivamente, as grandes manifestações que José Silvano promoveu em Mirandela contra algumas medidas do Terreiro do Paço, nomeadamente na área da saúde, por causa da Maternidade do hospital local, não só consolidaram como reforçaram a sua implantação no concelho a ponto de no último acto eleitoral em que participou ter aumentado a sua votação anterior. Por isso, seria muito difícil ao seu sucessor manter a votação conseguida há 4 anos atrás pelo PSD. Aliás, acreditamos que o próprio José Silvano teria dificuldade em manter a mesma votação, no quadro da política de austeridade promovida pelo líder do seu partido a nível nacional.

Quem não se aproveitou da descida do PSD foi o PS, que, embora menos, também desceu a sua votação, não obstante ter apresentado um candidato que já exercera importantes funções cívicas e políticas no concelho.

O CDS desceu muito ligeiramente, enquanto que o PCP/PEV e o Bloco de Esquerda subiram, embora também muito ligeiramente, nenhum deles tendo aproveitado a quase hecatombe do PSD.

Mogadouro – a grande surpresa do distrito deu a vitória ao PS

Num concelho de forte implantação do PSD ninguém esperaria uma vitória do PS nestas eleições. Na verdade, aquando das Legislativas, o PSD costuma arrasar a concorrência a ponto de o PS raramente chegar aos 30%.

É certo que a vitória do PS foi muito curta, ou seja, de apenas 10 votos na noite eleitoral ou de apenas um voto, após a recontagem da votação, mas em democracia por um se ganha, por um se perde.

Esta vitória do PS assenta, a meu ver, em vários factores conjugados. Em primeiro lugar, a política de austeridade do governo central, que penalizou o PSD na maior dos concelhos, também não podia deixar de se fazer sentir em Mogadouro. Em segundo lugar, a guerra surda entre o grupo do candidato e o grupo de João Henriques poderá ter tido também alguma influência. Em terceiro lugar, que até podia ser em primeiro, o perfil do candidato do PS, que mostrou ter uma aceitação junto do eleitorado bem superior à que muitos lhe davam.

Há quem fale ainda na saturação psicológica do eleitorado perante a hegemonia abissal de figuras do PSD em várias instituições do concelho, um pouco à semelhança do que aconteceu em Freixo de Espada à Cinta, desde os Bombeiros, à Misericórdia e ao Desportivo.

Torre de Moncorvo – PSD regressa ao poder 28 anos depois

O concelho de Moncorvo foi, há umas décadas atrás, um dos poucos baluartes socialistas no distrito. Nos últimos 28 anos teve sempre Aires Ferreira como presidente da Câmara, depois de alguns anos de executivos do PSD e do CDS.

Durante esses 28 anos, José Aires, o agora candidato do PS, foi sempre o nº 2 de Aires Ferreira. Poder-se-ia pensar, pois, que a candidatura socialista sairia novamente vencedora. Só que não foi isso que aconteceu, não obstante a candidatura do PSD/CDS ter aumentado a sua votação apenas em 96 votos. Só que a candidatura do PS perdeu 725 votos em relação a 2009.

Tendo em conta que, nas eleições para os últimos mandatos, a diferença de votos entre o PS e o PSD andava quase sempre na casa das dezenas de votos, o PS teria de gerir a sua candidatura com muito acerto para não perder votos para o PSD/CDS. Só que os erros do ainda presidente de Câmara, da Concelhia do PS e do próprio candidato foram tantos que seria preciso um milagre para ganhar estas eleições.

 Por isso, ninguém pode falar numa surpresa nos resultados finais das eleições em Moncorvo. A haver surpresa será apenas pela fraca subida de votos da candidatura do PSD/CDS, que não foi capaz de aproveitar os erros do PS e a debandada de votos da sua lista.

A candidatura do PCP/PEV, como era de esperar, também não aproveitou o colapso do PS, acabando por subir apenas 84 votos.

Vila Flor – sem surpresas o PS ganhou facilmente

Em Vila Flor apresentaram-se a sufrágio apenas 3 candidaturas, o PS, a coligação PSD/CDS e a coligação PCP/PEV. Curiosamente a Esquerda – PS e PCP – perderam votos, enquanto que a Direita – PSD/CDS – ganharam votos. O ganho destes não foi proporcional à perda daqueles, mas andou lá perto.

Por isso, pode-se dizer que a única surpresa de Vila Flor residirá apenas no facto de os partidos do governo terem aumentado a sua votação, ao contrário do que aconteceu um pouco por todo o país.

A este facto não será também alheia a circunstância de o PS ter mudado de candidato à Câmara em virtude de o anterior ter atingido o limite máximo de mandatos. Artur Pimentel tinha de facto uma implantação que será muito difícil de igualar por qualquer outro candidato socialista.

Vimioso – tanto PSD como PS perderam votos

No concelho de Vimioso verificou-se um fenómeno que foi comum a outros concelhos do distrito, ou seja, o PSD baixou de votação, mas o PS não beneficiou com esse facto. Aliás, neste concelho, as perdas do primeiro são sensivelmente iguais às perdas do segundo.

Para lá das razões comuns a outros concelhos do distrito, neste concelho temos de levar em conta um outro factor, é que o candidato socialista não é residente no concelho, o que poderá ter tido alguma influência no resultado final.

Vinhais – PS ganhou folgadamente, mas desceu em relação a 2009

Em 2009, o PSD e o CDS apresentaram candidaturas autónomas. Desta vez apostaram numa coligação, cuja votação é superior à soma dos votos conseguidos pelo PSD e pelo CDS em 2009. Efectivamente, o candidato do CDS/PSD desta vez chegou aos 2426 votos, enquanto que há 4 anos atrás, o PSD e o CDS juntos obtiveram apenas um total de 2039 votos, o que dá um acréscimo de 487 votos.

No entanto, este acréscimo da coligação de Direita não reflecte todas as perdas do candidato do PS, que teve uma descida de 1041 votos.

Mesmo assim, a candidatura socialista ganhou folgadamente porque teve quase mais 2000 votos que a candidatura opositora do CDS/PSD.

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