Nordeste Transmontano

Eleições na Caixa Agrícola de Alto Douro envoltas em polémica

Publicado por António G. Rodrigues em Sáb, 2021-12-25 13:54

As eleições para os órgãos sociais da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Alto Douro, que compreende 18 agências em oito concelhos dos distritos de Bragança e Vila Real (incluindo a da sede, em Bragança), estão marcadas pela polémica.

Pela primeira vez, ao ato eleitoral concorrem duas listas. Uma, proposta pela atual Administração, liderada por Paulo Martins (atual presidente do Conselho de Administração, tendo substituído no cargo Adriano Diegues), e outra, subscrita por cerca de 900 associados, que inclui nomes como o de Jorge Nunes (antigo presidente da Câmara de Bragança) ou Fernando Peixinho, e diversos representantes de associações de produtores agrícolas da região e cujo mandatário é o vice-presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal, Mário Abreu Lima.

Ora, esta lista oponente considera que o processo eleitoral, que começou em julho e que deve culminar com o ato eleitoral na próxima terça-feira, dia 28, que o processo “não está a ser legítimo nem democrático”, apontando uma série de alegadas irregularidades em conferência de imprensa, na passada terça-feira.

“É a primeira vez na história da instituição que se quebra o paradigma de lista única. Na anterior eleição, num universo de cerca de 14 mil associados, votaram cerca de 70, ou seja, 0,5% do colégio eleitoral, o que diz muito sobre o despeito que aos Associados tem sido reservado pelas últimas administrações”, explicou Mário Joaquim Abreu Lima.

O mandatário desta lista aponta mesmo sete irregularidades ao processo eleitoral.

“Aos actuais três membros integrantes da comissão de Avaliação, foi conferida posse, não pelo presidente da mesa da assembleia geral da CCAM Alto Douro, mas pelo próprio e actual presidente do conselho de administração, também candidato ao mesmo cargo nas eleições a realizar, num evidente exercício abusivo e usurpador de funções. É ainda de salientar que a anterior presidente da comissão de avaliação foi substituída no termo do prazo regulamentar para apresentação dos relatórios de avaliação definitivos”, referiu.

Por outro lado, “estando por regulamento estipulado que os relatórios de avaliação definitivos dos membros integrantes de ambas as candidaturas deviam ter sido apresentados até ao 35º dia anterior ao 1º dia do mês em que se realizam as eleições, neste caso, até ao dia 27 de outubro de 2021, só em 24 de novembro foram alegadamente apresentados ao presidente da mesa da assembleia geral”, dizem, acrescentado que “ao contrário do estipulado, tais Relatórios nunca foram até hoje, fornecidos a esta candidatura, desconhecendo-se na íntegra, as razões arregimentadas pela comissão de avaliação para considerar adequados ou não adequados os membros indicados por ambas as listas para os órgãos de administração e de fiscalização”.

Mário Abreu Lima diz ainda que “tais relatórios deviam estar igualmente à disposição de qualquer associado da CCAM Alto Douro com, pelo menos, 15 dias de antecedência relativamente ao acto eleitoral designado para o dia 28/12/2021, o que, ainda hoje, a menos de uma semana, não sucede”.
“Após a alegada apresentação dos relatórios de avaliação definitivos, o presidente da mesa da assembleia geral da CCAM Alto Douro comunicou ao representante desta candidatura a rejeição definitiva da mesma”, refere a organização de agricultores, que diz que assim “desautorizou-se a si própria e ao presidente da mesa, a comissão de avaliação”.

Cinco dias depois “e após reclamação desta candidatura, [o presidente da mesa da assembleia geral da CCAM Alto Douro] notificou o seu representante para proceder ao suprimento das faltas de adequação de alguns dos candidatos consideradas supríveis, e à substituição dos candidatos ou à recomposição dos órgãos, relativamente às faltas de adequação consideradas insupríveis, diligência extemporânea e indevida”.

“Conforme comunicação da presidente da comissão de avaliação de 15 de dezembro de 2021, está ainda em curso a avaliação de adequação dos novos candidatos e a conclusão da avaliação de adequação dos demais candidatos, o que, a 13 dias do acto eleitoral, hoje, a escassos sete dias, inviabiliza a realização na data designada, bem como qualquer iniciativa de apresentação e divulgação da candidatura e do programa junto dos associados, em cumprimento do direito e do dever de informação e esclarecimento que assiste aos candidatos”, acusam.

Na sequência da comunicação de rejeição definitiva desta candidatura, “o seu representante apresentou, em 29 de novembro deste ano, duas Reclamações contra a rejeição e contra a admissão da candidatura subscrita pela actual Administração, desde logo porque alguns dos seus membros não reúnem manifestamente os requisitos de idoneidade, independência, competência, experiência e disponibilidade, situação, aliás, que foi já concretamente identificada pelo Banco de Portugal relativamente a alguns desses candidatos ao conselho de administração e ao conselho fiscal”.

“Tais reclamações deviam ter sido apreciadas pela mesa da assembleia geral até ao dia 3 de dezembro 2021. Contudo, até hoje, não recaiu sobre as mesmas qualquer decisão”, revelou o mandatário.

Tendo em conta estas alegações, foi já interposta, no tribunal de Bragança, uma providência cautelar “visando a imediata suspensão do ato eleitoral e a anulação do processo eleitoral desde a aceitação formal pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral das duas candidaturas, nomeadamente por não ter sido assegurado o cumprimento integral dos prazos e dos procedimentos previstos nos Estatutos e Regulamentos, e estabelecidos com o propósito de garantir a realização de eleições sérias, genuínas, democráticas, isentas e imparciais”.

Jorge Nunes fala em “processo inaceitável”

António Jorge Nunes, candidato a presidente do Conselho Superior da instituição, reafirma a disponibilidade da lista mas para um ato eleitoral legítimo.
“Estamos preparados para um ato eleitoral que seja estruturado, devidamente organizado, democrática e legitimamente, em que os associados tenham acesso à informação, aos respetivos programas, os possam confronta, percebam as diferenças de perspetiva de gestão da instituição e o benefício que essa gestão pode trazer para a região. E isso requer um calendário normal. Nós estamos a falar em manter-nos na corrida num quadro com um calendário normal, não num quadro anormal e antidemocrático, relativamente ao qual qualquer cidadão percebe que é absolutamente inaceitável.

Nenhuma assembleia, por mais elementar que seja o seu nível de organização, se procede à discussão e agendamento de assuntos para votação dos associados, cujo conteúdo não é previamente divulgado, conforme o tempo exigível em termos estatutários da mesma.

Não se faz isso a não ser que não se queira que a informação seja analisada, discutida, confrontada. Isso é ocultação de informação. Queremos mobilizar os associados, que são milhares. Não se percebe que votem apenas 70 associados, isso é uma anormalidade. Como é que poderíamos ser contemplativos com uma situação dessas?”, questionou.

Já Fernando Peixinho sublinhou que “vivemos num Estado de Direito e a legalidade deve ser o primado de qualquer instituição”. “Só estamos nisto porque nos estamos a bater pela legalidade, pela transparência e pelos interesses de uma das mais importantes instituições da região. Não podemos aceitar que uma administração seja eleita com votos de 0,5 por cento dos seus associados. Isso é a negação daquilo que deve ser o espírito democrático e o espírito cooperativo”, disse.

Paulo Martins, presidente do atual Conselho de Administração, numa declaração sem direito a perguntas, confirmou que “está a decorrer um processo eleitoral” para o triénio 2022-24 e que “foram entregues duas listas”. Considera que as acusações têm "como único objetivo prejudicar o normal decurso do processo eleitoral" e que a lista por si liderada "não quer influenciar o processo em curso". 

O Mensageiro de Bragança tentou obter uma reação por parte do presidente da Mesa da Assembleia Geral, José Luís Baltazar, mas, até ao fecho desta edição, os contactos revelaram-se infrutíferos.

Ao que o Mensageiro apurou, um dos nomes reprovados à lista opositora pela comissão de avaliação foi o do candidato a presidente do CA, que baixou a terceiro da lista e foi substituído por um dos outros elementos na indicação para a presidência.

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