A opinião de ...

Antes de melhorar, vai piorar

Estes tempos que hoje vivemos não são tempos de meias palavras nem de meias medidas. E, muito menos, de brincadeira. Nos últimos dias, o número de casos positivos no distrito de Bragança (sobretudo em Bragança mas com origem em Mirandela) disparou. E vai continuar a subir nos próximos dias.
Os positivos a que temos vindo a assistir (e a noticiar), só não subiram ainda mais porque as autoridades não têm mais testes disponíveis para fazer. Se não, seriam mais.
A ideia não é criar alarmismo mas é preciso que todos tomemos consciência da gravidade do que estamos a viver. Todos. Não devia ser preciso a PSP deter cidadãos que se recusam a proteger-se e a proteger os familiares, vizinhos, amigos.
Em Itália e em Espanha já estão a decidir quem vive e quem morre, por não ser possível atender todos os que precisam. Um padre italiano recusou um ventilador que poderia salvar-lhe a vida pois faria falta a outra pessoa.
Depois disto, nada será como dantes. A normalidade, como a conhecíamos, não voltará, quando o vírus passar e tivemos imunidade de grupo, seja daqui a dois, seis ou 12 meses.
Pelo caminho ficarão muitos indefesos, muitas empresas familiares, pequenos negócios que vinham subsistindo graças à carolice do dono. Mas também muitas grandes empresas sofrerão abalos sísmicos de consequências imprevisíveis.
Johann Fortwengel, um investigador da Kings College, em Londres, apontava, na semana passada, três grandes focos de mudança: na forma como encaramos as viagens de trabalho e a sua necessidade (serão muito menos frequentes graças à utilização das novas ferramentas online); o teletrabalho (apesar das vantagens do trabalho presencial para a dinâmica e espírito de grupo e mesmo sanidade do trabalhador, o facto de esta crise nos obrigar a desenvolver competências nessa área produzirá, certamente, modificações no futuro na forma como trabalhamos); e, por fim, grandes alterações nas indústrias (a economia de sofá traz novos desafios, novas necessidades de regulação) ou mesmo no ensino superior (novas formas de dar aulas permitem atingir novos públicos e com menores custos para todos).
Mas, para chegarmos a essa fase, temos de sobreviver a esta, primeiro. E com a ajuda de todos.
No Nordeste Transmontano, os casos vão continuar a avolumar-se nos próximos dias, à medida que vão despontando as infeções disseminadas antes do estado de emergência e do encerramento das escolas (e potenciadas pela realização de certames que juntaram multidões, como aconteceu com a Feira da Alheira, em Mirandela, ou com jogos de futebol).
Tenhamos, pois, a noção de que as coisas vão piorar, bastante - tendência de duplicação de casos a cada dois dias -, antes de melhorarem. E não devemos entrar em pânico por isso. Mas não podemos baixar a guarda e achar que só acontece aos outros. Para eles, os outros somos nós…

PS1.: Um investigador amigo já me tinha avisado, numa situação destas a tendência é resvalar para o autoritarismo. Mas em questões como a da comunicação, e quando se pede a ajuda de toda a população, as instituições têm, também, de agir de acordo com o que pedem. A DGS não autoriza as entidades locais a informarem a população sobre os casos em cada distrito. Não vivemos no século XIX nem no início do Séc. XX, quando grassou a gripe espanhola. Nos dias de hoje, querer estancar a informação é como tentar conter a fuga de uma barragem com as mãos. A dada altura hão de faltar os dedos e apanhamos com a enxurrada em cheio na cara...
PS2.: O presidente da Câmara de Bragança aceitou dar a cara em tempos de crise. Outros, com responsabilidades intermuniciais, não. Depois não digam que são os jornais...

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