A opinião de ...

À espera da reforma...

Muita gente vai olhando para o progressivo aumento da idade da reforma com o olhar perdido no horizonte, com a nostalgia do tempo que passa mas não corre. O factor de sustentabilidade vai adiando, adiando, e a hora da reforma nunca mais chega. Até que o corpo, que tem o seu próprio relógio, dá de si antes da hora que os outros impuseram... A que tarda em chegar.
Há de ser mais ou menos isto que pensaria o nosso sistema eleitoral se fosse um funcionário.
Durante 45 anos cumpriu a sua função, a sua tarefa, com denodo e a eficácia possível. A produtividade esteve mais dependendo dos outros do que do próprio. Mas começa a dar sinais de cansaço e da necessidade de readaptação aos novos tempos, que já não são revolucionários como os que se seguiram à Revolução do 25 de Abril.
Nunca, como agora, esteve o Parlamento tão colorido e diversificado. Os sinais estavam lá todos, antecipando o que aí vinha. Afinal de contas, na Europa tinha sido assim há anos. A Bélgica esteve 541 dias sem Governo oficialmente formado, entre 2010 e 2011.
Por cá, como já era hábito antes do 25 de abril, as novidades tardam em chegar mas não falham.
Passado quase meio século, o sistema eleitoral vigente continua a cumprir a função para a qual foi criado, de dar a mais justa representatividade do povo na casa das decisões?
Rafael Barbosa, do JN, fez as contas. E concluiu que “se o sistema eleitoral português fosse mais proporcional, o PS teria menos 16 deputados, enquanto o PSD ficaria com menos oito eleitos”. “Por outro lado, teríamos maior diversidade política: seriam 12, em vez de nove, os partidos com representação parlamentar”.
A nível nacional, a soma dos votos brancos com os nulos daria a quinta força mais votada, com 4,28 por cento. Mais três pontos percentuais do que o CDS ou mais um do que o PAN.
Só os votos em branco foram 129 610. Um pouco menos do que o PAN, que teve 166858, mas mais do que Chega, Livre e Iniciativa Liberal, que elegeram um deputado pela primeira vez.
Por outro lado, há que pensar no que se faz a todos os votos dos 20 círculos eleitorais que não elegem. Por exemplo, em Portalegre, o PS obteve 44 por cento dos votos e ficou com os únicos dois deputados do distrito. Em Bragança, PS e PSD dividiram, mais uma vez, o espólio entre si, quando havia 18 candidaturas, todas com votos somados.
Segundo as mesmas contas do JN, se houvesse um único círculo nacional, “o grande vencedor, o PS, continuaria a ter a maior bancada na Assembleia da República, mas, em vez de 106 deputados, teria 90 (perdia 16). O outro grande “perdedor” seria o PSD, que conseguiu 77 mandatos, mas perderia oito, para ficar nos 69. A partir daqui ficariam todos a ganhar, porque os dois grandes partidos perderiam o seu “prémio” atual de 24 deputados, que seriam distribuídos por outros 10 partidos. Desde logo pelo Bloco de Esquerda, que em vez de 19 deputados teria 23 (mais quatro). A CDU teria mais três eleitos, chegando aos 15, enquanto o CDS duplicaria o seu grupo parlamentar de cinco para dez deputados. O mesmo milagre da multiplicação faria com que o PAN passasse de quatro para oito deputados..
Seria uma das soluções possíveis para aumentar a representatividade. Outra seria a manutenção dos 20 círculos eleitorais mais um nacional, como já foi nestas páginas proposto há alguns meses. Certo é que o sistema precisa de reforma. E a reforma nunca mais vem...

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