A opinião de ...

Não deixar ninguém para trás

Pronto, a segunda vaga está aí, com a força de um tsunami. Os telejornais voltam a ser dominados pelos números, numa altura em que o novo coronavírus parece mais ativo do que nunca, ultrapassando, mesmo, os tempos iniciais de confinamento, em que o medo se instalou no meio de nós.

Nesta fase, passado mais de meio ano, as contingências da crise sanitária que vivemos já começam a ser assimilados como “o novo normal” e, salvo algumas (cada vez menos) exceções, há cada vez menos a capacidade de questionar as restrições às liberdades e garantias que vão sendo impostas, bem como aos efeitos que toda esta situação tem no outro.

A preocupação com o indivíduo é cada vez mais acentuada, até pela retórica dominante, de distanciamento social. Em si mesma, a expressão vai muito além do significado que se lhe quer, aparentemente, atribuir.

Cada palavra tem o seu significado próprio e usar determinada palavra ou expressão para significar algo “aproximado” induz em erro.

Aplicar a expressão distanciamento social quando, na realidade, se pretende é que as pessoas mantenham algum distanciamento físico, algum espaço entre elas, faz germinar a ideia de afastamento em vários contextos e fomentar o individualismo, numa sociedade já de si cada vez mais individualizada.

Quem não se lembra das brincadeiras na rua com os amigos? Olhando, hoje, para as ruas desertas dos nossos bairros (um fenómeno pré-covid) não deixa de questionar a forma como sociabilizam, hoje, os nossos jovens, sem sair de casa ou mesmo do quarto.

Certo é que o afastamento social tem deixado mascarados muitos outros males. Das doenças escondidas, sejam elas oncológicas, cardíacas ou outras, aos flagelos da sociedade que se passam entre quatro paredes, como a violência doméstica, num fenómeno potenciado pelo confinamento obrigatório.

No distrito de Bragança, e como explica na página 5 a responsável do Núcleo de Apoio à vítima, Teresa Fernandes, “a diminuição do número de denúncias não significa que as situações reais de violência doméstica tenham também diminuído, antes pelo contrário. A violência doméstica, durante o corrente ano, escalou de frequência e de gravidade, já que os atendimentos aumentaram mas também os acolhimentos de emergência de vítimas, acompanhadas ou não por filhos menores ou maiores a cargo”.

Como dizia o Papa Francisco no Angelus, “enquanto houver um irmão ou irmã a quem fechamos os nossos corações, ainda estaremos distantes de ser discípulos, como Jesus nos pede. Mas a Sua divina misericórdia não nos permite desanimar, pelo contrário, Ele nos chama a recomeçar todos os dias para viver de forma coerente o Evangelho”.

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