Incêndio na Aveleda queimou mais de 200 hectares e provocou prejuízos aos agricultores

Ainda não passou um ano desde que um incêndio provocado por uma tempestade de verão deixou em sobressalto o Parque Natural de Montesinho, em Bragança, e as chamas já estão de volta àquela área protegida, causando mais prejuízos quando ainda nem os do ano passado foram ressarcidos.
“É uma tristeza”, desabafava Felismina Mateus, depois de ter ido, acompanhada pelo Mensageiro, ver com os próprios olhos os prejuízos causados pelas chamas, sobretudo na freguesia da Aveleda.
“Contámos mais de 150 castanheiros novos queimados só num souto mas perdemos castanheiros mais velhos noutros, vedações. Houve um vizinho que perdeu oliveiras novas. Como este fogo não me lembro. Andamos a trabalhar para termos as castanhas e chegar aqui e ver isto, custa. Estes já estavam todos a produzir. É uma tristeza muito grande”, desabafava.
Gilberto Ferreira, também da Aveleda, não perdeu tantos castanheiros mas o prejuízo acaba por ser maior. É que a dúzia de castanheiros que ficaram queimados já tinham mais de 20 anos e já produziam castanha. “É complicado. Para quem viva da agricultura, as pessoas acabam por se desanimar. Principalmente no castanheiro, com doenças, animais, é complicado. Aqui até estavam lavrados”, aponta.
O incêndio que deflagrou junto à aldeia da Aveleda, na passada sexta-feira, e que chegou a ter duas frentes ativas, foi combatido por quase 200 bombeiros, 70 viaturas e nove meios aéreos, que impediram que a tragédia fosse maior. Ainda assim, estima-se que tenham ardido cerca de 230 hectares, nas freguesias de Aveleda, França e Rabal, todas no Parque Natural de Montesinho.
Praticamente no mesmo local onde há quase um ano, (10 de agosto de 2024) arderam cerca de 300 hectares.
“O problema é que, agora, os animais como veados, como javalis como corsos vão descer para as hortas das aldeias e causar ainda mais prejuízos. É sempre mau”, aponta Gilberto Ferreira, sem grande esperança de ver os prejuízos ressarcidos.
Tal como Carlos Gonçalves, que até já escreveu para o Primeiro Ministro e para o Presidente da República por causa dos prejuízos do incêndio de 2024, que lhe queimou apiários (perdeu cerca de 25 mil euros) e agora viu arderem mais 25 colmeias.
“Até agora recebi zero. Tenho esperança de vir a receber mas já fiz o investimento que eles me mandaram fazer na reposição do material e até agora nada. Mas mais de metade do investimento vai novamente para o Estado. O meu prejuízo foi de cerca de 25 mil euros entre apiário e produção. Do material que tive de comprar, o IVA vai para o Estado. E vou ter de declarar esse dinheiro como se fosse rendimento. Vai-me limpar mais uns 20 por cento. E vou ter de pagar a uma pessoa que me fez o projeto. Fora o tempo que perdemos.
E ainda tive de escrever ao Primeiro-Ministro e ao Presidente da República”, conta, inconformado.
Agora, mais prejuízos. “Arderam-me mais 25 colmeias. Arderam touças, carrascos, colmeias, pastagens, castanheiros. Houve pessoas que estiveram proibidas de cortar carrascos e agora arderam de um momento para o outro”, aponta.
Já a António, outro habitante de Rabal, arderam-lhe cerca de 80 fardos de feno. “Tinha ido buscar um reboque de fardos de manhã. Depois apercebi-me que havia um incêndio no alto. Ainda trouxe 100 mas arderam 80. Eram fardos dos pequenos. Depois ardeu o lameiro.
Agora peço contas a quem? Se houver muita burocracia, dirijo-me a quem?”, questiona.
Agricultores revoltados
Carlos Gonçalves é que não cala a revolta. “Quem teve verdadeiramente o prejuízo, fica com ele.
Ainda vou demorar três anos a repor o potencial produtivo. É uma vergonha.
No ano passado ardeu ali, este ano arde noutro lado. Os do Parque [Natural de Montesinho] estão mortinhos para que arda na zona das casas que têm abandonadas para receberem dinheiro de projetos. É revoltante uma pessoa que não tem subsídios, investir na nossa zona e ter um prejuízo destes. Tenho sempre o coração nas mãos.
Uma pessoa acaba por desistir e deixar tudo ao abandono”, lamenta.
Para já, o valor dos prejuízos ainda não está quantificado mas, passados quatro dias, a aldeia da Aveleda ainda não tinha comunicações porque também arderam postes e fios do telefone.
“Ninguém se preocupa em fazer um levantamento e quantificar o prejuízo. A quem arderam as vedações no ano passado foi-lhe negado o apoio porque dizem que as pessoas não tinham animais. Mas se não tiverem vedações, os javalis e os veados comem a produção toda.
Eu disse ao presidente da Câmara que parece que estamos a pedir uma esmola.
Outra coisa que não consigo entender. Incêndios houve sempre. Mas cada vez arde mais e os incêndios são maiores. Cada vez têm mais meios. Mas os incêndios são cada vez maiores”, diz, incrédulo.
No ano passado, ainda recebeu um pequeno apoio, mas de uma empresa privada. “Ainda me deram quatro enxames através da Nestlé. Aqui não me deram nada. Iludem as pessoas para irem buscar dinheiro, as pessoas empenham-se e depois o Estado é que lucra. Não se limpam os caminhos todos os anos. Se o ICNF não deixa limpar, o ICNF que se atravesse a pagar os prejuízos às pessoas, porque a Câmara diz que o ICNF não permite limpar os caminhos”, aponta.