A opinião de ...

Serviço público está fora de moda

De acordo com a Fundação Francisco Manuel dos Santos, numa publicação sobre direitos e deveres dos cidadãos, o serviço público é o conjunto de atividades e tarefas destinadas a satisfazer necessidades da população. Esses serviços são normalmente prestados por entidades de natureza pública, mas também podem ser assegurados por entidades de natureza privada ou mista, sob fiscalização do Estado.
A própria lei fundamental do país, a Constituição, obriga o Estado a assegurar diferentes serviços públicos, desde aqueles que se referem a áreas de soberania do Estado (defesa, segurança e justiça) à prestação de cuidados de saúde, segurança social, disponibilização de escolas, e o próprio serviço de rádio e televisão. A qualidade de vida das pessoas, em especial das mais desfavorecidas, exige ainda que se garanta a prestação universal de certos serviços básicos, como energia, transportes e telecomunicações, seja a cargo dos próprios poderes públicos, seja por empresas privadas que se obrigam a fornecê los. Os serviços públicos constituem um elemento essencial do Estado social e do modelo social europeu.
Para efeitos de proteção dos mesmos utentes e dos consumidores em geral, a lei define como serviços públicos essenciais os fornecimentos de água, de energia elétrica, de gás natural e de gases de petróleo liquefeitos canalizados; as comunicações eletrónicas; a recolha e tratamento de águas residuais e a gestão de resíduos sólidos urbanos; o transporte de passageiros e os serviços postais.
Vem isto a propósito do processo de renovação do contrato de concessão do serviço postal feito pelo Estado aos CTT, que foram privatizados há alguns anos.
O contrato de concessão do serviço postal universal dos CTT, que estava previsto terminar no final de 2020, foi prorrogado por um ano, até 31 de dezembro de 2021.
Em 25 de fevereiro, os CTT anunciaram que tinham apresentado ao Governo uma proposta de criação de uma comissão de negociação para rever as condições do contrato de concessão do SPU.
O serviço postal é daqueles que, hoje em dia, parecem anacrónicos, sobretudo vistos à luz dos cliques num qualquer gabinete em Lisboa.
Mas o país é muito mais do que Lisboa.
Recentemente, o presidente da Comissão Executiva dos CTT, João Bento, assumiu que o serviço postal dava “prejuízo” à empresa, muito mais interessada na entrega de encomendas e nos serviços bancários.
Mas, por esse país fora, sobretudo em regiões recônditas como o Nordeste Transmontano, em que se está no Interior do Interior (ou na “periferia das periferias”, como diz o Papa Francisco), o serviço postal é, ainda hoje, essencial para manter as populações das aldeias em contacto com o mundo e como garante do funcionamento do seu dia a dia. Desde o recebimento de reformas à marcação de consultas até ao recebimento de faturas de contas como água, luz ou telefone. Ou, até, a chegada deste (como de outros) jornal.
Alguém imagina estas populações a viverem sem o carteiro?
Aquilo que a atual administração dos CTT está a tentar fazer é livrar-se do que menos lhe interessa e ficar com o ‘filet mignon’. Mas, como diz o povo do alto da sua sabedoria, “quem me come a carne tem de me roer os ossos”.
Cabe ao Governo fazer cumprir a lei, sobretudo a mais fundamental delas todas, a Constituição, que não está, nem pode estar, ao sabor de um qualquer CEO, mais interessado nos prémios milionários que pode receber ao final do ano do que no serviço prestado às populações, à custa das quais ganha esses mesmos prémios. Isso não é serviço público.

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