A opinião de ...

As pedras do caminhar cristão

 
Em 21 de Fevereiro de 2018, a Comissão Nacional Justiça e Paz publicou um documento para reflexão quaresmal intitulado «Fazer Caminho: das pedras ao fogo da Páscoa», no qual os membros da Comissão transmitem o essencial da mensagem do Papa Francisco para a preparação da Páscoa 2018, mensagem intitulada «Porque se se multiplicar a iniquidade, vai esfriar o amor de muitos».
A reflexão da Comissão Nacional é extensa e, por isso, damos aqui conta dos tópicos essenciais, para o grande público, ainda que limitados pelo espaço de que dispomos.
O documento descreve e fundamenta o humanismo cristão do Papa, não só na relação do homem com Deus mas também na construção da comunidade justa e solidária de homens e de cidadãos, de que também é tarefa a preservação da «Casa Comum», o ambiente natural em que vivemos, ideia tão bem expressa na Encíclica Laudato Si. Situando-nos nos tempos conturbados em que vivemos, dizem os membros da Comissão que «Vivemos tempos difíceis, “tempos de pedra”, “sabemos que os pisamos” (p. 3). E perguntam: «Como podemos transcender as situações de violência e injustiça que nos assolam, como deixarmos de estar “sentados num bloco de gelo”?».
Quais são então as pedras com que nos deparamos e em que, por vezes, não reparamos e tropeçamos? Os membros da Comissão seguem a mensagem papal e elencam-nas, uma a uma; 1) a falta de comunhão com Cristo, comunhão que é condição essencial para viver o humanismo cristão; 2) a ambição do poder e do dinheiro, raízes de todos os males, porque a ganância gera as maiores desigualdades e iniquidades sociais; 3) destas iniquidades e da inconsciência delas deriva a alienação ideológica, cultural e social com que os media manipulam a informação, exploram a emoção, e afastam os homens do ideal de justiça que deriva do amor de Deus e a Deus; 4) e também a ligeireza com que os arautos dessas iniquidades abordam o envenenamento do Planeta Terra e a “guerra em lume brando” «que tem sobretudo expressão ao nível dos conflitos locais (p. 5); 5) os novos nacionalismos e o terrorismo; 6) a «globalização económico-financeira que, em vez de nos trazer maior solidariedade, nos atrofia e abafa com tentáculos invisíveis» (p. 5); 7) «O excesso de relações online, das horas em frente aos ecrãs que nos consomem a vista e a vida roubando um imenso espaço a todo o resto» (5) e provocando uma “rotura comunicacional” grave; 8) a desigualdade económica no mundo, aumentando exponencialmente a grande massa de pobres; 9) o índice de “desenvolvimento inclusivo» que, em Portugal, «continua a ser baixo» (p.6); 10) a triste marginalização dos idosos, dos jovens e do interior de Portugal, para este último com expressão no abandono a que os CTT o votaram; 11) a corrupção em toda a vida económica e social emergindo agora com gravidade no Desporto; 12) a sofisticação cada vez maior da violência social, doméstica e no namoro; 13) o desemprego juvenil e a emigração forçada; 14) «a sujeição (dos jovens) a formas de trabalho degradantes, reduzindo as pessoas a nómadas, proscritos, “não cidadãos”.»; 15) o consumismo e o culto de valores supérfluos fazendo esquecer os ideais de Deus e perder a noção de cidadania e de intervenção social; 16) a crescente apatia face aos refugiados.
Face a todas estas «pedras», a mensagem do Papa e a reflexão dos membros da Comissão apelam para uma vida segundo os valores de Deus, alicerçados no amor a Ele e ao nosso próximo, na caridade, na misericórdia, na oração que nos une a Ele e aos outros e nos faz sentir mais fortes, mais solidários e mais cidadãos.

Edição
3670

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