A opinião de ...

A Igreja que luta pelos refugiados

As comunidades cristãs e os ses líderes, perante os dramas humanos, podem acomodar-se e preocuparem-se mais com os seus problemas internos, não reparando nos irmãos que sofrem. Não é essa a atitude que o Papa Francisco sustenta: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças”, escreveu na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium.
A crise migratória tem marcado a atualidade nos últimos dias. A fotografia de Óscar Ramírez, de 25 anos, e da sua filha Valeria, com quase dois anos, que morreram afogados no rio Bravo ao tentarem atingir os Estados Unidos depois de uma longa peregrinação desde El Salvador, de onde fugiram da guerra e da miséria, chocou o mundo. Ilustrou a manchete do Ossevatore, o jornal do Vaticano, com o título “Imensa tristeza”. Foi o que o Papa Francisco sentiu ao ver a foto.Já por diversas vezes o Papa se tem referido a este tema. Condenou a construção de muros em vez de pontes – uma alusão implícita ao presidente norte-americano, Donald Trump, e à construção do muro na fronteira com o México. No final do ano passado, criticou os líderes nacionalistas que propõem discursos xenófobos, culpam os emigrantes pelos problemas dos seus países e geram a desconfiança e a rejeição dos refugiados. Um dos destinatários está bem próximo dele: o vice-primeiro ministro italiano, Matteo Salvini. É ele que tem impedido os barcos que resgatam refugiados no Mediterrâneo de atracarem em Itália. Há dias o barco da ONG Sea Watch teve de forçar a entrada no porto de Lampedusa com refugiados, tendo a sua capitã, a alemã Carola Rackete, sido detida.
No final do mês Vladimir Putin, o presidente da Rússia, levantou a sua voz na última cimeira dos G20 para criticar as democracias liberais que, segundo ele, estão a definhar por causa do multiculturalismo e das políticas de fronteiras abertas.
Mas há quem não desista de enfrentar os poderosos e continuar a defender os emigrantes. Nos confins dos Estados Unidos com o México, também na semana passada, o bispo da diocese de El Paso, no Texas, Mark Joseph Seitz, escoltou uma família hondurenha na travessia da fronteira. Atravessou a ponte internacional com os pais e duas crianças, uma com deficiência cognitivas e outra com problemas de coração. Criticou as condições miseráveis em que vivem os refugiados na fronteira do México, que afetam particularmente as crianças. Ele e outros voluntários empunharam durante a travessia fotos de várias crianças falecidas enquanto aguardavam a autorização para entrar nos Estados Unidos, depois de percorrerem milhares de quilómetros.
Esta atitude terá sido uma gota no oceano. Mas, como diria a Madre Teresa de Calcutá, sem essa gota o oceano estaria mais vazio. Todos podemos contribuir com a nossa gota, mais que não seja ao não nos deixarmos enganar pelas narrativas que alimentam a suspeita e o ódio contra os refugiados.
O bispo de el Paso tem procurado desmontar esse discurso e tem promovido muitas outras iniciativas em defesa dos emigrantes. Apesar de estar no Texas, um estado tradicionalmente conservador e apoiante de Donald Trump e da sua política de rejeição dos emigrantes, este prelado tem estado à altura do que a realidade lhe exige.

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