// Entrevista - Orlando Rodrigues, presidente do Instituto Politécnico de Bragança

“Esperamos, no próximo ano letivo, poder ter já os nossos doutoramentos aprovados”

Publicado por António G. Rodrigues em Qui, 2023-02-23 10:59

Mensageiro de Bragança: Será discutida na sexta-feira a alteração da designação dos Politécnicos. Acredita que isto poderá dar um impulso a estas instituições?
Orlando Rodrigues:
Sim. Na iniciativa de cidadãos estão duas propostas. Uma é a possibilidade de conferirmos o grau de doutor. Até agora, isso era permitido pela lei de graus e diplomas, que é uma lei específica, mas não pelo regime jurídico do Ensino Superior e pela lei de bases do sistema educativo, que não contemplavam isso e era preciso fazer essa alteração. O Ministério da Ciência e Tecnologia, há cerca de quatro anos, tinha promovido essa alteração mas não se fez a alteração no regime jurídico e na lei de bases. Uma vez que são leis, tinham de ser aprovadas no parlamento e nunca se criou o consenso necessário para que isso acontecesse. Daí que os politécnicos tenham apresentado esta iniciativa de cidadãos no parlamento.
Vai ser votada no dia 24 [amanhã] e a informação que temos é que, relativamente aos doutoramentos, será aprovado, com unanimidade de todos os partidos representados na Assembleia da República. O que é de uma elementar justiça, uma vez que os politécnicos, e nós em particular, estão a fazer doutoramentos. A lei de graus e diplomas estabelece, como requisito para conferir o grau de doutor, ter centros de investigação avaliados com muito bom ou excelente. O IPB tem dois centros avaliados com excelente enquanto algumas universidades não têm sequer um centro avaliado com muito bom ou excelente e estão a dar doutoramentos. Há aqui algumas coisas que não estão bem.
Seja como for, o grau de doutor é avaliado pela Agência de Avaliação do Ensino Superior e, portanto, há uma avaliação de qualidade.
Para nós, dar o grau de doutor é fundamental. Temos cerca de 150 estudantes de doutoramento na nossa instituição, que estão a fazer o doutoramento integralmente connosco, orientados por pessoas aqui do IPB e a fazer o trabalho de investigação nos nossos centros mas que depois têm de ir defender a tese noutra universidade, portuguesa ou espanhola.
Mas é importante que possamos dar esse grau de doutor para podermos ajustar os doutoramentos às necessidades da nossa região e à especialização da nossa investigação. Temos vindo a procurar especializar as nossas linhas de investigação naquilo que nos parecem que são as necessidades da nossa região e não faz sentido que, tendo aqui tantos jovens a fazer doutoramento, tenhamos de condicionar as suas teses às orientações da Universidade de Salamanca ou do Porto ou de outra universidade qualquer. Devemos orientá-las e especializá-las para aquilo que são as necessidades da nossa região. Por isso é que é tão importante este impedimento que nos estava a ser imposto. Era uma grande limitação e uma menorização sem sentido.

MB.: O IPB já era uma das instituições com corpo docente mais qualificado. Esta alteração poderá influenciar isso?
OR.:
Dos docentes de carreira, já é quase 100 por cento. Depois, temos muitos docentes que vêm das empresas e do mercado de trabalho e, desses, alguns são doutorados mas outros não, nem é isso que se procura. Nesses casos, é o conhecimento e a experiência profissional. Nos docentes de carreira, o número de professores doutorados já é muito próximo dos cem por cento.
Continuamos a ser das instituições com maior qualificação, embora todas as instituições, nos últimos tempos, tenham vindo a fazer esse percurso.
Já não é tanto a qualificação dos docentes que distingue uma instituição mas o que se faz com essa qualificação. O que temos feito é desenvolver a investigação, os nossos centros. Hoje, o que nos distingue, é a grande capacidade de investigação que temos.
Temos dois centros de investigação com a classificação de excelente. Em todos os Politécnicos do país, só há cinco. Nós temos dois, o Politécnico do Porto tem outros dois e Leiria um. E muitas universidades não têm, sequer, centros com excelente.
O que tem vindo a fazer a diferença é o nosso corpo docente e de investigadores ter sido capaz de desenvolver linhas de investigação de competitividade internacional. Aparecemos em todos os rankings internacionais em posições muito elevadas, fruto desse trabalho.
Portanto, os doutoramentos são fundamentais para que continuemos a especializar as nossas linhas de investigação nas necessidades da região, para que consigamos continuar a aumentar a atratividade internacional.
Vamos propor doutoramentos logo que a lei seja aprovada e esperamos, no próximo ano letivo, poder ter já os nossos doutoramentos aprovados.

MB.: Em que áreas?
OR.:
Ainda não está definido mas tem que ser, necessariamente, na área em que temos centros de investigação com excelente. Temos o CIMO – Centro de Investigação de Montanha – cujas áreas de investigação vão desde as ciências agrárias às ambientais, alimentar, produtos e processos. Pelo menos dois doutoramentos avançarão.
Depois temos do CEDRI – Centro de Investigação em Digitalização e Robótica Inteligente -, que também tem excelente. Trabalham sobretudo em problemas da indústria, da inteligência artificial, com a agricultura. Temos capacidade de ter um doutoramento.
Três será o mínimo que iremos submeter.

MB.: Relativamente à mudança de nome, está confiante que vá acontecer?
OR.:
O que propunha a iniciativa de cidadãos era que os politécnicos passassem a assumir a designação de universidades politécnicas. A informação que temos é que o partido socialista propôs uma redação alternativa e, como tem maioria, deverá ser aprovada.
Esta proposta é um pouco diferente daquela que os politécnicos defenderam na AR. Prevê que em língua inglesa se possa usar, de imediato, essa designação, de Polytechnic University. Em língua portuguesa fica desde já inscrito que a alteração será permitida mediante as condições que vierem a ser definidas na revisão do RJIES em 2024, no pressuposto de que o regime jurídico será alterado e então aí fixar-se-ão as condições para poder utilizar a designação em português.
É um pouco diferente do que propúnhamos mas quaisquer que sejam as condições que o RJIES venha a impor, estaremos em condições de utilizar essa designação.
O próprio RJIES já define que, para ser universidade, é preciso ter pelo menos três doutoramentos e mais do que duas escolas.
Se os doutoramentos forem aprovados – e estamos em crer que sim – ficaremos, imediatamente, com essas condições.

MB.: Esse adiamento é uma desilusão para os politécnicos?
OR.:
Não, não é uma desilusão. Entendemos que houve aqui uma intenção de procurar que esta oportunidade permita aos politécnicos desenvolverem-se.
Na verdade, para nós é importante em termos internacionais. Podermos utilizar internacionalmente a designação já é um grande avanço. O problema é que estamos envolvidos em cooperação internacional – nós, sobretudo, porque somos a instituição mais internacionalizada e participamos num consórcio de universidades europeias, temos acordos de dupla-diplomação – e é sempre um embaraço estar a justificar internacionalmente o que é um instituto politécnico.
Frequentemente, temos a necessidade de justificar aos nossos alunos, que vão exercer a profissão noutros países, até com uma declaração a dizer que somos uma instituição de ensino superior.
Internacionalmente, universidade é a designação universal para o ensino superior. Podermos usar esse termo é um grande avanço e resolve a maioria dos nossos problemas. Não estamos tão preocupados com a questão interna mas com a nossa competitividade internacional.
Com estas duas alterações, os dois maiores fatores de limitação ficam resolvidos e, nessa medida, é um grande avanço.
Em termos nacionais, ficaremos a aguardar tranquilamente, seguros de que quaisquer que sejam as condições que venham a ser impostas, estaremos em condições de as cumprir.

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