A opinião de ...

Direito para todos

Habeas corpus… que tenhas o teu corpo….
Quem leu uma das últimas crónicas aqui publicadas sobre a acção pauliana, certamente percebeu que a chamada acção pauliana tinha por principal objectivo a defesa do cidadão da antiga Roma contra as arbitrariedades dos credores que podiam fazer do devedor (corpo do devedor) o que quisessem, nomeadamente esquarteja-lo, fazer dele escravo ou vendê-lo, além de outras barbaridades. Com a publicação da Lei Pauliana, (169 AC), por dívidas, só respondia o património do devedor. Esta lei representou um grande avanço na defesa da integridade física do cidadão de Roma e influenciou futuras leis de protecção da vida do homem.
Ao longo da história, foram surgindo outras leis, tratados ou convenções que marcaram o progresso da humanidade e de que hoje mal nos apercebemos talvez por fazerem parte do nosso quotidiano e não sentirmos o bem que temos já que só estamos habituadas a reagir aos atropelos que nos fazem. Isto também acontece nas religiões. No chamado sermão da montanha (e não só), Jesus Cristo enunciou princípios universais que são um avanço, uma mudança de comportamentos do homem para com o seu semelhante.
Apenas vou lembrar duas Declarações que modificaram as relações humanas e, sem dúvida, contribuíram para melhorar a vida de todos nós. Refiro-me, em primeiro lugar, à Magna Carta, (magna carta libertatum), ou seja, uma declaração assinada pelo Rei de Inglaterra, João Sem Terra, em 1215. Esta Declaração, exigida pelos nobres ao Rei, impunha que ninguém pudesse ser mantido preso sem a prévia decisão de um Juiz, ou seja, exigia o controlo legal da prisão de qualquer cidadão. Uma machadada na arbitrariedade das prisões mandadas efectuar pelo Rei. Desta Declaração, ficou para a história, até aos nossos dias, o chamado Habeas Corpus que etimologicamente significa (para que tenhas o teu corpo - a expressão completa é: habeas corpus ad subjiciendum). Este princípio foi adoptado por (quase) todas as nações e está consagrado na Constituição da República Portuguesa, artigo 31º: - ( 1º - haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal… 2º - a providência de habeas corpus pode ser requerida pelo próprio ou qualquer cidadão… 3º - o juiz decide no prazo de 8 dias… ). Igualmente, está previsto no Código de Processo Penal os pressupostos em que deve ser instruído e tramitado o processo da providência do pedido de habeas corpus. Este processo é considerado urgente, ou seja, tem prioridade sobre os outros processos e, bem se entende, dado estar em causa a ofensa à liberdade de um cidadão. Não podemos esquecer que a liberdade é o bem mais precioso de que o homem pode usufruir.
Em segundo lugar, refiro-me á Declaração Universal dos Direitos do Homem, cujo texto foi proclamado pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua resolução de 10 de Dezembro de 1948. Esta declaração é composta de 30 artigos, sendo o primeiro: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. O artigo 3º - todo o indivíduo tem direito à vida, liberdade e segurança pessoal. No artigo 9º, está escrito: ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado. No preâmbulo da Declaração estão descritos considerandos referentes ao reconhecimento da dignidade inerente a toda a família humana e seus direitos iguais e inalienáveis que constituem o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo. Só transcrevo estes três artigos por os considerar mais significativos para que cada cidadão do mundo possa viver em plena liberdade. Mas, a liberdade só pode ser considerada uma conquista da humanidade quando todos os cidadãos do mundo sejam detentores de direitos civis e políticos e reconhecido o direito a uma vida com dignidade onde estejam incluídos direito a salários justos e condições de trabalho seguras e saudáveis, entre outros.
Amigo leitor, neste natal, ofereça aos seus amigos uma qualquer edição da Declaração Universal dos Direitos do Homem; será a melhor prenda com que pode dar a alguém de quem goste; ali se evoca a fraternidade, a paz, o respeito e a amizade que deve existir entre todos os homens independentemente de raça, de cor, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação….
Não será isto o espírito desta época do ano, lembrar a prática da fraternidade entre os homens? …. Para todos, Bom Natal.

(Depois de escrever esta crónica, foi noticiada a morte de Nelson Mandela. Aqui fica a minha homenagem, com a devida vénia, transcrita do editorial do jornal Público: um símbolo de um homem bom; não foi um político, foi um homem de estado; não foi um calculista, foi um visionário; não foi rancoroso, foi magnânimo; não foi mesquinho, foi altruísta; não foi arrogante, foi humilde).


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