A opinião de ...

Lembrar e enaltecer

Estaremos num momento de viragem no que respeita à pandemia que assola o Planeta? E o nosso País? Os indicadores indiciam uma melhoria que não sabemos se é efetiva. As afirmações dos especialistas ora convergem, ora divergem, sobre os sinais de abrandamento. Entretanto e curiosamente, há países que vão iniciar o processo de administração da terceira dose…. Claro que muito países estão na gaveta fundeira da recuperação, dadas as grandes carências em dispositivos clínicos e em stocks de vacinas (em muitos países de África não têm sequer 10% de imunizados). Crónicas são as suas carências. África, o continente que sofre, desde há séculos, a pobreza, muito por obra da exploração desenfreada levada a cabo por europeus, e, também, por americanos, russos e chineses. Como lembra Francisco na sua obra ‘revolucionária’ Fratelli tutti, «O mundo existe para todos, porque todos nós, seres humanos, nascemos nesta terra com a mesma dignidade.» Como vencer esta atávica conjuntura, menos de 5% da população manda no mundo da economia e da finança? Bom, há sinais de que «a juventude, no seu ativismo rebelde de artistas, de poetas, de dramaturgos, de homens de teatro, de rappers, de cantores se mobiliza…» (Boaventura Sousa Santos, Jornal das Letras, 3.11.2020, p.31). Eu estou convicto de que os jovens poderão contribuir para mudar o rumo do homo sapiens sapiens – o homem que sabe que sabe.
Mas não queria afastar-me do que o título desta crónica sugere. Venho, de novo, enfaticamente, recordar o papel dos profissionais de saúde. A sua dedicação e o seu altruísmo demonstraram decisivamente as virtualidades do Serviço Nacional de Saúde. Também a necessária complementaridade de alguns Serviços de Saúde Privados. Médicos, enfermeiros, técnicos, assistentes administrativos; também bombeiros e proteção civil mostraram como é possível fazer sempre mais e melhor, em circunstâncias adversas. Recordar estes profissionais é um imperativo ético e universal. Não é, portanto, demasiado enaltecer o seu trabalho e o seu sacrifício.
Agora, o que vem aí? Relembro as palavras atualíssimas do eminente professor, neurocirurgião, já falecido, João Lobo Antunes, proferidas numa entrevista dada ao Diário de Notícias, em 25 de Abril de 2014, que transcrevo, porque imensa atividade ficou por realizar durante a pandemia: «Preocupa-me o tempo de espera nas consultas e cirurgias. Preocupa-me a organização dos serviços em dar resposta às novas circunstâncias». E acrescentou a propósito do ensino da Medicina e das outras ciências da saúde: «Temos de aprender uma nova medicina…que não seja exclusivamente a que vence a doença». Acrescentou, moderado que era: «Na Saúde, na Educação e na Ciência é necessário garantir a continuidade das políticas [concertadas que sejam – acrescento] e ao mesmo tempo a sua adaptação evolutiva a novas realidades. Eis alguns desafios que enfrentamos. Quando trabalhei, como administrador hospitalar, em diversos hospitais, pude compreender que a saúde não tem preço, mas tem custos, como ensinava Correia de Campos (Saúde – o custo de um valor sem preço, Lisboa, 1983). Como é de calcular, os profissionais de saúde estarão sempre confrontados com a adaptação ao mundo em mudança constante na relação médico-doente e na utilização das tecnologias inovadoras.

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