// Entrevista a António Pimentel, novo presidente da Câmara de Mogadouro

“O desleixo que fez perder dois vereadores trouxe um prejuízo de um milhão de euros por ano ao concelho”

Publicado por António G. Rodrigues/Francisco Pinto em Qui, 2021-12-02 10:23

Na primeira grande entrevista desde que reconquistou a Câmara de Mogadouro para o PSD, o empresário mogadourense revela como encontrou a autarquia após oito anos da governação de Francisco Guimarães.

António Pimentel foi vereador entre 2002 e 2013, ano em que perdeu a corrida eleitoral para Francisco Guimarães por apenas 11 votos. Oito anos depois voltou à carga e teve uma vitória expressiva. Ao Mensageiro, conta o que entrou e quais os planos para o mandato.

Mensageiro de Bragança: Foi candidato à Câmara de Mogadouro há oito anos, que perdeu por cerca de uma dezena de votos. Chegou ao cargo com um atraso de quase uma década?
António Pimentel:
Acho que foram umas férias bem merecidas, de oito anos, que me permitiram, até, dedicar-me um bocadinho à minha vida pessoal. Houve uma interrupção, as pessoas entenderam a diferença do trabalho executado pelo executivo que geriu a Câmara entre 2002 e 2013 [do qual António Pimentel fez parte] e do que esteve entre 2013 e 2021. Tudo isso pesou na balança. Durante 12 anos desenvolveu-se um trabalho considerado por toda a gente notável ao nível da transformação de Mogadouro. Sei como encontrámos o concelho e como o deixámos, saudável financeiramente, com projetos em execução e com todas as infraestruturas que um concelho do interior do país gostaria de ter.
Penso que foi essa sementeira ao longo desses 12 anos que fez perceber aos mogadourenses que, agora, era altura de substituir a gente que estava a ocupar o poder em Mogadouro durante estes oito anos. Considero que foram oito anos perdidos para Mogadouro. E faço-o com factos.
O anterior deve ser o único presidente de Câmara que conseguiu passar dois mandatos sem inaugurar praticamente uma única obra (penso que só inaugurou duas casas mortuárias). É muito pouco para oito anos.
Para além disso, as pessoas também entenderam que, durante este período, o executivo se virou muito para dentro. Concentrou-se, sobretudo, naquilo que era a Câmara em si e esqueceu-se de desenhar uma estratégia de desenvolvimento para o concelho, de projetor aquilo que é necessário para criar âncoras para o desenvolvimento do concelho no seu todo, com uma estratégia que dê alguma coesão ao território e afirmar o território pelo menos nesta sub-região entre o Douro e o Sabor.
Não tenhamos ilusões, porque não vamos ser os melhores de Trás-os-Montes pois não temos nem potencial nem localização para isso. Mas penso que Mogadouro reúne todas as condições para se afirmar como uma centralidade nesta sub-região.
Era essa a visão que eu tinha e daí ter lutado por algumas infraestruturas que ajudassem a construir essa centralidade nos anteriores mandatos, enquanto vereador, e por isso me empenhei seriamente na vinda do centro de diálise para Mogadouro. Também apoiámos fortemente outras instituições, nomeadamente a Santa Casa da Misericórdia para que tivesse infraestruturas que servissem a população do concelho e de outras regiões. E, já na altura, a luta pela instalação, juntamente com o provedor [João Henriques] para a instalação de um centro para a demência, luta que vamos retomar.
Por isso, defendo que, a par disto, outros investimentos como a construção do matadouro, são importantes.
Não desisto e quero avançar com essa infraestrutura para suportar a pecuária da região.
Deixei de acreditar no projeto intermunicipal e decidi fazê-lo em Mogadouro, haja ou não financiamento comunitário.
Soube que a Câmara de Miranda do Douro está a dar passos nesse sentido, creio que baseada num protocolo de há muitos anos, mas para o qual não se chegou a definir uma localização porque cada município tinha o seu interesse. Daí ter tomado essa decisão e a ter assumido esse compromisso.
É uma infraestrutura fundamental para o concelho.

MB.: Falou do apoio à terceira idade e à demência e às instituições sociais. O que pensa fazer?
AP.:
Mesmo antes de entrarem em vigor os regulamentos que estamos a criar, tomámos a decisão de tornar gratuito o almoço para todos os alunos do ensino básico, independentemente do escalão em que se encontrem.
Temos em preparação sete regulamentos, dois deles já revistos.

Fez há pouco tempo um mês que tomámos posse, os regulamentos estão apenas em condições de serem revistos para entrarem em ação o mais rapidamente possível, quer seja o de apoio às creches, jardins de infância e amas, em que suportaremos os custos totais, num investimento total de 200 mil euros, para que os pais não tenham esses custos.
Temos em preparação avançada um regulamento de apoio à agricultura onde se definem os níveis de apoio quer à preparação dos solos quer às plantações quer de um modo geral.
Temos, também, o apoio à recuperação do edificado do concelho, que já está executado, e o regulamento de apoio às pré-aposentações na Câmara Municipal. Para que pessoas que já tenham uma idade avançada e 40 anos de serviço possam sair, dentro da legalidade, e permitir alguma renovação dos funcionários da autarquia.
Temos, também, já concluído, o regulamento de apoio à criação de emprego, que já existia mas limitado apenas ao apoio de cinco mil euros à criação de um posto de trabalho com contrato sem termo. Esse regulamento vai, complementarmente, definir que vamos suportar os custos que as empresas têm com a Segurança Social relativos a esses contratos.

MB.: Durante quanto tempo?
AP.:
Durante quatro anos. Fomos eleitos por quatro anos.

MB.: Em que estado é que encontrou esta casa? Foi o que estava à espera?
AP.:
Gosto de ser otimista. Disse em campanha e reafirmo que quem esteve cá foi eleito e teve legitimidade para fazer o que fez. Confesso que não gostei de receber algumas “prendas”, para as quais ainda não tenho solução. Entendo que devem ter um tratamento institucional e não vou fazer grandes comentários sobre isso.
Sob o ponto de vista financeiro a Câmara não tem problemas, mas também não houve grandes realizações.
Mas quando as pessoas se viram muito para dentro, cometem-se eros. Há algumas anomalias que temos de ver como serão ultrapassadas...

MB.: Ao nível de procedimentos?
AP.:
Também ao nível de procedimentos. Nalguns casos há ausência de procedimentos e vamos ver como vamos ultrapassar, procurando cumprir a lei.

MB.: Mas encontrou matéria para enviar para o Ministério Público?
AP.:
para já, não me vou pronunciar sobre essa situação porque estamos a tratar dos assuntos da forma que pensamos ser a correta e é nesse caminho que vamos continuar. Vamos ver se não há necessidade disso.
Seguiremos o caminho que for necessário, isso é uma certeza.

“O desleixo que fez perder dois vereadores trouxe
um prejuízo de um milhão de euros por ano ao concelho”

MB.: Mogadouro só elegeu cinco vereadores, e não sete, porque perdeu 11 eleitores. De que forma se pode recuperar população?
AP.:
  Esse desleixo, de se terem virado muito para dentro e não terem acompanhado os processos como devia ser, trouxe um prejuízo ao concelho de Mogadouro de aproximadamente um milhão de euros, por ano. Significa uma descida significativa de receita face àquilo que o município vinha arrecadando.
Como vamos ultrapassar essa ausência dessa verba? Vai ter de ser com trabalho e com os vários programas comunitários.
Apesar de termos tomado posse há cerca de um mês estamos já com um conjunto de projetos em movimentos, quer em adjudicações quer em planeamento, para podermos avançar quando as candidaturas ao PRR quer ao atual que ainda vai ter muitas operações de overbooking, procurar recuperar o que perdemos com a descida do concelho de segunda para terceira categoria.

MB.: Em termos de obras, o que tem previsto?
AP.:
Sempre disse que a minha primeira preocupação era dar resposta às consequências da crise financeira e da crise pandémica. Estamos a fazer isso, a aprovar os regulamentos para dar resposta às pessoas e às empresas.
Em relação à crise pandémica, disponibilizámo-nos para tudo o que a ULS necessitar para podar desenvolver com normalidade e o mais rapidamente possível esta campanha de vacinação. Por pressão nossa, vai vacinar-se também ao fim de semana, em regime de casa aberta. Temos os três autocarros a trazer os munícipes, fornecer refeições às pessoas que lá trabalham.
E, apesar de ter dito que o betão não seria a nossa principal preocupação, isso não impede de dizer que o concelho precisa de investimentos que alavanquem o crescimento económico.
O projeto da Av. do Sabor está em fase de adjudicação. O ginásio municipal irá ter um centro de apoio ao BTT. O bairro de S. José foi o único que não foi recuperado durante os 12 anos de mandato em que estivemos na Câmara e irá ser uma prioridade.
Vamos avançar com o Museu do Moderno Escondido em Bemposta, cujo projeto já aqui ficou em 2013.
A par disso, há dois investimentos em marcha. Um projeto de execução para os lagos do Sabor, de um eco-resort com 15 bungalows, piscinas e outras infraestruturas. Será um projeto do município. Já foi entregue o estudo prévio e aprovado.
Estamos a avançar com uma réplica desse projeto junto à ponte de Remondes. Já tenho um primeiro esboço. Será melhorado com uma praia fluvial.
Estamos a falar de um projeto de quatro milhões de euros no Medal e três milhões junto à ponte do Sabor.
Para além disto, há um problema que Mogadouro tem e que não podemos atirar para debaixo do tapete.
Temos um projeto de recuperação e ampliação da ETA (estação de tratamento de água) de Bastelos, para melhorar o tratamento da água para ver se conseguimos resolver o problema do manganês de uma vez por todas. É um projeto de 700 mil euros, que será acompanhada de uma outra candidatura para a recuperação das infraestruturas de Castelo Branco e de Meirinhos, que já estão em obra mas ainda não têm financiamento.

MB.: Prevê esvaziar a albufeira de Penas Roias?
AP.:
Não está nos meus planos. Penso que com esta intervenção na ETA, atualizando a capacidade de filtragem, iremos conseguir resolver o problema.
Deixe-me dizer que há um outro projeto que considero fundamental, que tem a ver com a Ribeira do Juncal e que iniciámos no último mandato e onde se encontram já 12 hectares que expropriámos para complementar aquele projeto com uma outra valência que trouxesse visitantes a Mogadouro. Está em fase de adjudicação um projeto para a instalação de um parque biológico, porque vai comportar fauna e flora. Terá uma amostra de toda a fauna e flora da região, que considero fundamental para complementar o que já lá se encontra.
A ideia já existia.
Também entendemos que a preparação física das pessoas é importante. Temos em elaboração um projeto para um ginásio que reúna todas as condições, ao qual será acoplado o centro de apoio ao BTT. Será junto à fonte das três bicas.

MB.: Não tiveram tempo de fazer isso tudo em apenas um mês. São projetos que já tinham há oito anos?
AP.:
Quando se é autarca durante 12 anos, como eu fui, criam-se noções do território e desenvolvem-se ideias. Estavam na minha cabeça, constam do nosso programa e procurámos implementá-las logo. Sem projetos não há obra e é fundamental que, neste primeiro meio ano, a Câmara esteja munida de projetos para que, quando as candidaturas a financiamentos abrirem, os termos já disponíveis para não andarmos como um bombeiro à procura da mangueira.

MB.: Qual será o valor do próximo orçamento?
AP.:
Teremos um orçamento e um plano plurianual condicionado, especialmente para 2022, porque temos obras que já deveriam ter sido concluídas há um ano e não o foram. Por exemplo, o centro de apoio do mercado, que já devia estar concluído e está com 28 por cento de execução. A cantina escolar, junto ao liceu, está com cerca de 40 por cento de execução. O bairro fundo de fomento já duplicou o prazo de execução e ainda vai demorar alguns meses porque é preciso alojar as pessoas para demolir as casas.

MB.: Em termos de acessibilidades, só a parte sul do concelho está mais desafogada, com o IC5. Qual é a sua estratégia?
AP.:
Se olharmos só para Mogadouro, em termos de desenvolvimento, o IC5 veio ser uma âncora muito grande. Em termos regionais, há duas coisas que entendo como fundamentais, que são a ligação do IC5 a Espanha e a ligação de Vimioso à autoestrada (A4).

MB.: E o troço entre entre Mogadouro e Vimioso?
AP.:
Acho que não vale a pena perder muito tempo porque sabemos que não a vamos ter. Mogadouro alimentou sonhos durante muito tempo sem ter sido sequer equacionada a construção de um hospital no concelho.
Isso não passa de utopia.
É preciso é manter a estrada. O principal estrangulamento é entre Vimioso à A4. O bom é, muitas vezes, inimigo do ótimo e temos de ter a noção do que pode ser feito. Não alimento grandes esperanças embora desejasse ver o IC5 terminar onde termina o território ou uma ligação do IC5 contornando a A4. Mas deixemo-nos de utopias.

MB.: Como estamos de rede viária municipal?
AP.:
Quem conhece o concelho sabe que toda a rede viária, à exceção de duas estradas, foi feita entre 2002 e 2013. As ligações de Variz a S. Martinho e a estrada da Granja já estão, também, executadas.
Mogadouro deve orgulhar-se da qualidade dos acessos que as suas freguesias têm, todas com repavimentações recentes. As ligações que faltam fazer são ligações complementares ou caminhos rurais, que constam do nosso programa, nomeadamente Urrós-Bemposta, Gregos-Teixeira e Estação de Mogadouro-Vilar do Rei.
São estes acessos complementares que falta executar.

MB.: E em termos de eventos?
AP.:
Já tive a oportunidade de discutir o assunto com a vereadora do pelouro e já definimos que vamos manter o que é bom e procurar melhorar, nomeadamente o festival Terra Transmontana, o Red Burros e complementar com outro projeto que ainda não está confirmado. Queremos construir a Semana da Juventude, que englobará o festival, o Red Burros e um grande evento no fim de semana seguinte, a desenvolver no campo de aviação, talvez um festival de música.
Queremos apostar em eventos que tenham caráter de continuidade porque o efémero não tem qualquer valor.

MB.: Em termos de associações, como a CIM ou as associações de municípios, qual será a estratégia?
AP.:
Fui eleito para tratar dos destinos de Mogadouro e o meu foco será essencialmente em Mogadouro. A CIM está muito bem entregue ao Jorge Fidalgo, ao colega de Vila Flor (Pedro Lima) e ao colega de Vinhais (Luís Fernandes).
Ficarei à frente da co-gestão do parque do Douro Internacional.
Estarei na direção da Associação de Municípios do Douro Superior e na do Baixo Sabor mas o meu foco é Mogadouro.

Assinaturas MDB