A opinião de ...

Combater a inflação

É dos livros. Perante uma situação de inflação (subida de preços que acaba por cortar no poder de compra), sobem-se as taxas de juro de forma a arrefecer a procura. Tendo por base a lei da oferta e da procura, havendo menos vontade de consumir, os preços tenderão a baixar, do mesmo modo que quando a procura é alta, os preços sobem.
Isso é o normal.
O que não é normal é a causa desta inflação que, com o tradicional remédio, vai provocar a tempestade perfeita para as famílias, sobretudo dos países mais remediados, como é o caso de Portugal.
Esta inflação foi provocada, essencialmente, por dois fatores. Primeiro, uma pandemia mundial, como há um século não se via, que baralhou as cadeias de produção e distribuição de bens. Com a procura de certos bens a cair a pique, muitas empresas direcionaram as suas prodições para outro tipo de bens, mais procurados. Veja-se o caso dos microships, por exemplo. A pandemia provocou uma paragem abruta da mobilidade. Logo, os microships foram dirigidos para outros segmentos, como videojogos ou smartphones, que, com as pessoas retidas em casa, tiveram um aumento exponencial de procura.
Quando a economia regressou, gradualmente, à normalidade, já não havia microships disponíveis para as utilizações tradicionais (carros novos, por exemplo).
Aos problemas das cadeias logísticas de distribuição de bens pelo mundo provocados pela pandemia, somou-se, logo a seguir, o da guerra na Ucrânia, que gerou uma escalada no preço dos combustíveis.
Com uma economia assente precisamente em combustíveis (desde os transportes ao aquecimento doméstico até à produção de energia para as empresas), que afeta todo o tipo de produtos. A alimentação depende de combustíveis (os tratores dos agricultores não andam a água, os camiões dos transportadores não andam a vento), assim como toda a distribuição de produtos.
Essa escalada refletiu-se numa subida genérica dos preços de todos os produtos. A somar a isso, outras matérias primas, como os adubos usados na produção de alimentos, também dispararam, uma vez que a Ucrânia e a Rússia eram dos maiores produtores mundiais deste tipo de produtos.
Ou seja, desta vez, a inflação não teve origem num aumento de procura, habitual com uma economia pujante, mas noutros fatores.
Por isso, a decisão dos bancos centrais de subir taxas de juro para controlar o problema não só não vem trazer uma solução como vem acrescentar ainda mais problemas ao comum do cidadão, que terá cada vez menos liquidez.
Isso vai levar, certamente, a uma travagem brusca no consumo, criando ainda mais dificuldades para a economia. Os empresários e produtores, para além de terem de acomodar os aumentos de custos com energia e matérias primas para conseguirem produzir os seus bens, ainda vão ficar com eles nos armazéns, nas lojas, tirando ainda mais valor à economia.
Combater doenças novas com remédios antigos não traz a cura. Ainda faz pior à saúde.
E o pior cego é aquele que não quer ver.

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3901

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