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Portugal é mais do que o Terreiro do Paço ou uma história de superação

Digno de um filme. Vila Real acolheu, no passado fim de semana, a 50.ª edição do Circuito Internacional, um marco para todo Trás-os-Montes. Ao longo do fim de semana, por lá terão passado entre 150 a 200 mil pessoas. Mais do que as populações de cada um dos distrito, Bragança e Vila Real.
Mais do que apenas um evento para amantes dos automóveis, o evento deste ano deixa pelo menos duas lições a ter em conta.
Por um lado, o exemplo de superação do piloto Tiago Monteiro. A 07 de setembro de 2017, o único português a conseguir subir ao pódio na Fórmula 1 (2006), sofreu um violento acidente, em Barcelona, quando o carro que testava ficou sem travões no final da reta da meta. O embate no muro foi a cerca de 200 quilómetros por hora.
A pancada afetou os movimentos mas, sobretudo, a visão. Os médicos mal acreditavam que pudesse ter uma vida normal, quanto mais voltar às corridas.
Durante meses dolorosos de recuperação, o próprio Tiago Monteiro duvidou, muitas vezes, da pertinência do sacrifício. “Muitas vezes faltavam-me forças para me levantar de manhã. Com a carreira que eu tenho, as conquistas que já fiz, valerá a pena tudo isto? Mas não desisti”, contou ao Mensageiro em março deste ano.
No final do ano passado voltou às corridas, no Japão, com resultados modestos. Este ano, regressou ao Mundial de Carros de Turismo a tempo inteiro. Depois de um início prometedor, em Marraquexe, passaram-se quatro jornadas (com três corridas cada) a marcar passo.
Até que chegou Vila Real. O público, a envolvência, o circuito técnico, fizeram a sua parte, Tiago Monteiro fez a dele. A vitória na terceira corrida do fim de semana, a mais importante das três realizadas em Vila Real, era o toque final de um guião que parece escrito de propósito para cinema, sobre uma das recuperações mais épicas da história do desporto, pelo baixo grau de probabilidade de acontecer.
“Prometi ir a Fátima... Agora lá terá que ser”, confessou Tiago Monteiro ao Mensageiro, numa prova de que a Fé move montanhas, desde que façamos a nossa parte e vamos empurrando também.
E isto leva-nos à segunda lição. É que nem todos fazem a sua parte e entregam os destinos de muitos à fé dos outros.
O Circuito Internacional de Vila Real, desde que integra o calendário de uma competição mundial (primeiro Campeonato do Mundo de Carros de Turismo, agora Taça do Mundo de Carros de Turismo), tem tido um impacto crescente na economia transmontana (e não só).
Estudos de duas consultoras independentes (uma delas internacional) estima um impacto de 80 milhões de euros a edição de 2018. Os números que o Eurosport (promotor do campeonato) apresentou sobre as primeiras cinco corridas do ano (Vila Real foi a sexta) apontam para um crescimento de 30 por cento na mediatização do campeonato. As corridas são transmitidas para dezenas de países em todo o mundo, com o devido reflexo que as imagens têm na atração de turistas nos meses seguintes.
Para Vila Real, a última etapa do campeonato na Europa, os pilotos trouxeram as famílias, amigos, etc. Os hotéis estavam cheios num raio de 40 a 50 quilómetros.
A equipa da TVI, por exemplo, responsável pela transmissão das corridas em Portugal, ficou alojada em Mirandela, assim como muitos outros adeptos se espalharam por toda a região, comprando por aqui as suas lembranças, fazendo as suas refeições.
Ora, já se sabe que um euro gasto no interior tem um efeito multiplicador superior a um euro gasto no Porto ou em Lisboa.
Então porque é que faltam apoios de nível nacional, sejam eles privados ou públicos? Não haverá instituições com o dever de promover e fomentar regiões como estas? Sejam do Turismo, sejam outras instituições que recolhem dinheiro de todo o país em jogos de sorte e azar?
É que há muito mais país para além daquele que se vê desde o Terreiro do Paço.

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