A opinião de ...

Muita conversa, poucas soluções

Os assuntos dominantes nos últimos tempos têm sido a recuperação da economia, a crise demográfica e a crise do financiamento da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações. Curiosamente, o emprego para os jovens continua a ser esquecido e, como veremos, ele deveria ser o principal objecto de preocupações de longo prazo porque, sem esse emprego, não haverá Estado Social. Percorramos um pouco estes quatro tópicos.
Recentemente, no painel comemorativo dos 75 anos de Mensageiro de Bragança, ocorrido no auditório do NERBA, o Doutor António Gomes, reputado demografo, propôs um choque demográfico para resolver os problemas demográficos do país, sobretudo os do interior deste (ausência de jovens e sobreenvelhecimento). Tal choque consistiria na importação de imigrantes, a partir de um programa acordado pelo menos entre os principais partidos (PS, PSD, CDS e PCP). Tal programa é concebível teoricamente mas a sua execução está envolta em múltiplos problemas. Primeiro, porque esta solução não é ainda geralmente aceite; segundo, porque, à falta de indústria e comércio, os imigrantes teriam que trabalhar a terra; terceiro, porque não existe um programa de gestão da propriedade agrícola; quarto, porque não sabemos se tais imigrantes querem e sabem fazer agricultura; quinto, teriam de ser essencialmente jovens para renovar a população. Sinceramente, tal programa era bem capaz de trazer mais problemas do que resolvê-los. Mas teve o mérito de ser uma proposta e de lançar o debate.
Outro tema que tem dominado as atenções é o da Segurança Social, a tal área que, sozinha, gasta 50% do orçamento do Estado e, em conjunto com a Educação e com a Saúde, representam 70% desse orçamento. Mas é uma área que é responsável pela assistência social, pelo RSI, pelo Subsídio de Desemprego, pela assistência na doença e ainda, directamente, pela vida de 4,5 milhões de pessoas (2,9 milhões de pensionistas da Segurança Social, 600 mil pensionistas da Caixa Geral de Aposentações, 400 mil desempregados, 300 mil RSI, 150 mil complementos solidários).
O que se discute é a sustentabilidade, isto é, se, no futuro, esta despesa pode ser paga. Aqui, entram os jovens, os que deviam estar a trabalhar para sustentar a despesa. Este aspecto é geralmente ignorado pelos nossos políticos e pelas nossas elites. Gerem o sistema como se ele fosse imune às mudanças de vencimento e às oscilações do mercado do trabalho. Sobre as primeiras, hoje, o vencimento médio é proporcionalmente inferior em 50% ao existente há 20 anos. Assim, o conjunto das prestações pagas pelos trabalhadores também é 50% inferior, apesar do aumento das taxas. Sobre as segundas, há 20 anos, 80% dos jovens ficavam a trabalhar em Portugal. Hoje são apenas 50% e apenas 30% trabalham, sendo as remunerações iniciais de 40% das praticadas há 20 anos.
O Partido Socialista pôs em debate a ideia de baixar as contribuições para a Segurança Social durante quatro anos, através de um abaixamento da Taxa Social Única, em quatro pontos percentuais, ficando em 19,75% para as empresas, 26% para trabalhadores independentes e em 7% para trabalhadores por conta de outrem. As consequências são que ao defíce actual de 5,3 mil milhões de euros (receitas totais de 18,650 mil milhões de euros contra despesas totais de 23,950 mil milhões), iria ser acrescentado um défice anual de mais 1,850 mil milhões por ano (mil milhões pelos trabalhadores e 0,850 mil milhões pelas empresas e trabalhadores independentes). Tudo somado, passaríamos a ter um défice de 7,150 mil milhões por ano que, em 2020, nos transportaria a um défice quase igual à receita de um ano. É preciso repensar tudo isto.
Quanto à recuperação da economia, Portugal e o Governo tiveram a sorte de, na segunda fase do «brutal aumento de impostos», o preço do petróleo ter caído para um terço e o euro se ter depreciado em quase 20% em relação ao dólar. Com isso, o Estado conseguiu reduzir a despesa pública em 13 mil milhões de euros, em quatro anos, sem, contudo, ter conseguido baixar a dívida pública, hoje de 129% do PIB, ou seja, 225 mil milhões de euros. Neste cenário, precisamos de muito diálogo e de pessoas sabedoras, maduras e experientes na condução da política portuguesa. Qualidades que não parece não abundarem nos partidos com assento parlamentar. Mais grave que a crise económica é portanto a crise de elites e a crise de valores.

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