A opinião de ...

Bilhete-Postal para a Lombardia

Sofia, minha filha, desculpa.
Desde que há uma década emigraste, para Itália, primeiro, para Bruxelas, depois e, de novo para a italiana região da Lombardia, tenho sido teu correspondente neste cantinho lusitano, para, com regularidade, te ir dando notícias da política e do governo da nossa nação. Contudo, na última semana, houve um acontecimento neste lusitano retângulo que, ostensiva e reiteradamente, te escondi.
Foste cumprindo o teu ensejo de participar, ativamente na vida nacional, exercendo o direito de voto, nem sempre fácil. Este ano pudeste, pela segunda vez, fazê-lo por correspondência e estavas radiante com esta normalização, mesmo não sendo, ainda, o almejado voto eletrónico. Relataste, com alguma emoção e muita saudade à mistura, não escondendo descrições pormenorizadas, o processo como, diligente e atempadamente trataste de colocar a cruzinha na formação política da tua eleição, copiaste o teu cartão de cidadã e, seguindo meticulosamente as instruções recebidas, remeteste para Lisboa, a expressão da tua opção política.
Que palavras podia eu usar para te comunicar que afinal, todo o teu cuidado e empenho tinha sido em vão? Como dizer-te que o voto, meticulosa e aplicadamente exercido, seguindo todos os requisitos determinados pelos representantes populares... tinha sido deitado ao lixo, de forma desleixada e displicente por um irresponsável representante dos representantes populares? De forma tão tacanha, tão canhestra que não permitia qualquer retorno, qualquer resgate?
É verdade, a ti (a mim e à esmagadora dos nossos concidadãos) que não te é dada qualquer hipótese de fazer, modificar ou adaptar qualquer lei, é-te exigido que a cumpras, integralmente sem saltar uma palavra, uma letra, uma simples vírgula. Já aqueles a quem foi concedido o privilégio de redigir as regras pelas quais todos temos de nos reger, autoexcluíram-se do seu cumprimento rigoroso decidindo, desde que se mancomunassem, entre si, podiam dispensar-se da sua execução absoluta. E de tal forma levaram essa prorrogativa a peito que até prescindiram das normais salvaguardas estabelecidas para evitar situações extremas. Por isso mesmo não hesitei em me colocar ao lado de Rui Rio pois que, apesar de um qualquer comportamento errado, numa determinada altura, nunca é tarde para arrepiar caminho. Andou mal ao dar cobertura ao arranjinho, mas obviamente, emendou a mão ao reclamar da metodologia de validação da votação. Se fosse dado o devido andamento a este incidente, o desastre teria sido evitado. Tendo sido desfeita a unanimidade cabia aos presidentes das mesas, dar-lhe o devido tratamento. Não tinham que concordar com a posição do PSD. Tinham era de isolar os votos “incumpridores”. Tivessem agido em conformidade, a validade de uns e outros seria posterior e eficazmente decidida por quem de direito. Ao abusarem do seu poder, ao sobrevalorizarem um “acordo de cavalheiros” em detrimento da Lei, destruíram qualquer hipótese de retorno.
Tinha de me colocar ao lado de Rui Rio... até ao momento em que soube que o “arrependimento” do PSD foi seletivo. Só ocorreu na votação do círculo da Europa... onde corria o risco de perder um deputado.
Pois bem merece perdê-lo!
Lembra-te disso, Sofia, minha filha, quando fores, de novo, votar.

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