Pede-se ao governo que seja sério. Também com os polícias
O tema da infiltração das ideologias da extrema direita nas polícias tem sido recorrente nos últimos anos. Vem à tona da imprensa na sequência de relatórios sobre a atuação policial ou quando um serviço de interação policial com cidadãos integrantes de grupos de risco, como são os ciganos ou migrantes, não corre bem, como se espera e é desejável. As acusações de xenofobia, racismo e discriminação sucedem-se. O caso recente foi o desmantelamento do grupo radical Movimento Armilar Lusitano (MAL), que pretendia formar uma milícia armada com objetivos antidemocráticos e de ataque a instituições basilares da democracia. O material apreendido, a rede de contactos e forma de trabalhar para disseminar a sua propaganda ideológica, incluindo o recrutamento de novos membros, associado a outros dados que vão sendo conhecidos, a serem todos verdadeiros, parecem provar que é um caso para levar a sério no âmbito do combate ao terrorismo interno. Entre os seis detidos, encontrava-se um chefe da PSP. Podemos dizer que era só um polícia entre tantos. Mas esse é um problema e coloca a questão do porquê.
Conhecido o problema pergunta-se o que é que já foi feito pelos governantes responsáveis para lhe dar solução. E a resposta só pode ser uma. Nada. Limitam-se a palavras de circunstância. Que a atuação policial, por regra, respeita a lei e os direitos de todos os cidadãos. Que não se pode confundir a parte com o todo. É necessária prudência e dar tempo à justiça. Que é necessário continuar a investir na formação inicial e contínua dos profissionais. Que os princípios éticos e deontológicos têm que ser respeitados. Os que infringem, as tais “ovelhas negras” têm que ser descobertos, severamente punidos e expulsos.
Aos responsáveis mais diretos, aos superiores hierárquicos e supervisores pede-se que exerçam a sua capacidade de influência por uma melhor formação, melhor gestão e procura de melhores condições de serviço para os seus profissionais, num diálogo permanente e de influência e exemplo de boas práticas. Que exercem a disciplina coerciva sempre que tais situações são conhecidas. Que utilizem com critério todos os meios disponíveis para prestar aos cidadãos e às comunidades um serviço de segurança pública de excelência.
Apesar da atenção mediática e da gravidade dos casos noticiados, os dados disponíveis indicam que a confiança geral dos portugueses na polícia permanece elevada. Portugal figura consistentemente entre os países mais seguros do mundo. Em 2024 aparece em 7.º lugar no Índice Global de Paz. O orgulho dos cidadãos na sua polícia depende da transparência, da justiça e da capacidade das instituições de se autorregularem e punirem os desvios e os excessos.
Os portugueses têm a polícias que merecem? Essa é uma pergunta carregada de emoção e depende muito da perspetiva. Os polícias cumprem a sua missão com profissionalismo e dedicação. As exceções, elas existem, levantam dúvidas sobre os mecanismos de recrutamento, formação e supervisão. É aqui que os governos falham. As condições de trabalho com uma enorme exposição pública, a limitação de direitos e a não compensação devida pela carga dos deveres, a falta de reconhecimento e dignificação profissional. O programa do governo promete bastante. Oxalá seja capaz de cumprir.