Torre de Moncorvo

“O endividamento é pior do que esperávamos”, admite Nuno Gonçalves

Publicado por António G. Rodrigues/Francisco Pinto em Sex, 2013-11-29 12:22

O Mensageiro de Bragança arranca nesta edição com uma série de entrevistas aos Presidentes de Câmara do distrito. Nuno Gonçaves, o mais novo dos 12 autarcas, foi o primeiro, numa entrevista reveladora em que não foge a nenhum assunto, nem aos mais polémicos.
 
Mensageiro de Bragança: Tomou posse há pouco mais de um mês. Já tomou consciência do que tem em mãos?
Nuno Gonçalves: Já. Primeiro, devo agradecer aos funcionários do município, que não é fácil quando vem um novo presidente e um novo executivo, com formas diferentes de atuar, ser solidário com quem governa. E devo dizer que, nisso, os funcionários da Câmara de Torre de Moncorvo foram excelentes. Depois, a consciência de que a noção que tínhamos sobre o endividamento pode ser pior. Mas tenho a consciência que temos potencialidades para fazer face a esse endividamento. E neste momento é isso que estamos a estudar. Teremos de reduzir todos os acordos e protocolos que temos em cerca de dez por cento. É inevitável. Teremos que reduzir as parcerias que o anterior executivo entendia estratégicas com determinadas associações...
 
MB.: ...Nomeadamente no futebol?
NG.: O fomento desportivo terá que passar por alguns encargos ficarem com a Câmara, por apoiar o fomento desportivo de jovens e a criação de todas as classes até aos seniores e, também, por pensarmos custos/benefícios. Mas tendo sempre em conta que uma instituição centenária – e agora falo no caso do Grupo Desportivo de Moncorvo – terá que continuar. Mas com o conceito que este executivo tem e com o problema que à nossa volta se gerou que são os constrangimentos orçamentais. Penso que vamos chegar a um acordo.
 
MB.: Mas tem consciência que o facto de o presidente do GDB ter sido o seu adversário nas eleições autárquicas pode levar muita gente a pensar que se trata de uma espécie de retaliação?
NG.: Penso que ninguém vai pensar isso por uma razão muito simples, já fazia parte do meu programa há quatro anos e fez parte do deste ano e foi um dos temas de debate antes das eleições. Toda a gente sabe que eu apoio o fomento desportivo dentro de regras e com clareza. As pessoas têm de saber com o que contam desde o início. A partir daí serão regras iguais para todos.
Este executivo tem dois enfoques fundamentais: aproveitar o que tem em termos de património, não só o natural mas, também, o edificado, para a vertente cultural e turística, e, depois, o enfoque social. A Câmara, neste momento, não pode assobiar para o lado pensando que não existem dificuldades com famílias e crianças no concelho. Esse passo com as instituições de solidariedade social terá de ser dado. E como os fundos de equilíbrio diminuem em vez de aumentar e as receitas do município são as mesmas há muitos anos e não temos forma de nos autofinanciar de outra forma, temos de reduzir nos gastos que entendemos supérfluos para os adaptarmos às condições em que vivemos. E a coesão social, mais uma vez, é importantíssima para este executivo. Se não pudermos ter dois espetáculos e só pudermos ter um, fica só um espetáculo. Mas fica salvaguardado que nenhuma criança e nenhum idoso vai passar fome ou frio no concelho de Torre de Moncorvo.
 
MB.: Qual é a dívida da Câmara neste momento?
NG.: Ainda estamos a acabar de ver todos os dados mas o passivo é bem superior a 21 milhões de euros.
 
MB.: Os últimos números conhecidos falavam em 19 milhões... Esses 21 milhões poderão, ainda, aumentar?
NG.: Não tenho dúvidas que vai aumentar. Nos últimos dias de uma campanha eleitoral se gasta muito. É mais uns bonés, mais umas camisolas. E quem está no poder também faz isso, o que eu acho que é um erro. Fazem-se os passeios prometidos há dez anos mas que só são feitos agora. Se for preciso, pinta-se uma fachada de um edifício sem se importar com o custo que ela tenha. Ou seja, em 15 dias quer fazer-se o que não se fez ao longo de mandatos. E faz-se à custa do aumento da dívida da Câmara. Foi o que aconteceu aqui.
 
MB.: Tem ideia de quanto se gastou nas últimas semanas de mandato antes das eleições?
NG.: Perto de um milhão de euros, só na campanha eleitoral.
 
MB.: E esse dinheiro está devidamente fundamentado com faturas e concursos?
NG.: ... Essa dívida vai ficar sustentada...
 
MB.: Ou seja, vai assumi-la?
NG.: Vou porque o município de Torre de Moncorvo é uma pessoa de bem. Repare, para mim era fácil esquecer-me desse milhão de euros e os prestadores de serviços terem de ir a tribunal provar que, efetivamente, fizeram esses trabalhos. Penso que o Município tem de fazer uma coisa: com os seus técnicos, ver qual a dívida que temos até 31 de outubro e ver qual a das obras que foram lançadas e não estão comprometidas, outra das obras que não estão cabimentadas e a dívida total. Depois, como estamos em saneamento financeiro, o seu responsável ver que determinadas obras não estão cabimentadas e que vamos entrar em maior desequilíbrio. E, depois, uma entidade externa validar esses valores. É isso que temos de fazer. A partir do momento que saiam esses valores, este executivo não vai mais dizer que se deve ou que a culpa é do anterior se não fizermos. Vamos dar conhecimento dos valores corretos e, a partir daí, acabou. Vamos fazer a nossa gestão com o que prometemos e comprometemos com os nossos cidadãos.
 
“Quando se chega ao ponto de não conseguirmos ter uma ideia com pouco dinheiro e que tem sempre de se sustentar numa grande obra, esse é o primeiro passo para nós pensarmos que estamos a mais.”
 
MB.: Face a este cenário, haverá coisas que pensava fazer e que agora já não serão possíveis?
NG.: Obviamente. Por exemplo, o fluviário da Foz do Sabor. Mas tem de haver criatividade. Um dos males de quem está muito tempo no poder é que perde criatividade. Quando se chega ao ponto de não conseguirmos ter uma ideia com pouco dinheiro e que tem sempre de se sustentar numa grande obra, esse é o primeiro passo para nós pensarmos que estamos a mais. Temos de ter essa criatividade. Fazer mas com pouco dinheiro, aproveitando os recursos naturais que serão 75 por cento dos gastos que já estão feitos. Por exemplo, temos a serra do Reboredo e não é possível, tendo ao nosso lado o país com mais inscritos em pedestrianismo, não termos rotas pedestres. Não cabe na cabeça de ninguém, quando está toda a gente a falar no projeto mineiro, que uma rota que está pensada – a das aldeias mineiras – ainda não estar no terreno. É nisto que temos de pensar para atrair as pessoas que possam vir a Moncorvo. Não é possível estar a sustentar a mesma ideia, que vem de há 20 anos, da amendoeira em flor. Não é possível sustentarmos uma feira de produtos da terra e do artesanato nos mesmos moldes de há 20 anos. Vai-se deteriorando ao longo do tempo, deixa de haver apelo às pessoas. E é essa nova roupagem que pode trazer, outra vez, visitantes a Torre de Moncorvo e é nisso que temos de apostar.
 
MB.: Qual será a importância do interface do IP2 e do IC5?
NG.: O IP2 e o IC5 possibilitaram a vinda de visitantes que antes não vinham, sobretudo dos concelhos limítrofes. Possibilitou ir almoçar a Mogadouro, por exemplo. Agora, o próximo passo é fazer com que as quintas do Douro Superior, elas próprias se unam para, juntamente com os municípios, quem nos vem visitar ter o turismo gastronómico, o turismo vitivinícula. No Douro Superior temos de dizer que não vamos concorrer uns com os outros mas vamos concorrer em termos de região. Viseu, Aveiro e Guarda, por exemplo, querem criar um núcleo, o da A25. O Porto quer estar a presidir a uma grande área que vem até Bragança. O Douro Superior tem de fazer o mesmo. Quais foram os vinhos premiados este ano? Quantos são do Douro Superior? Esta região não pode ir com os outros potenciando o que tem de menos qualidade. E o que é isso? Estruturas, população (somos menos). Mas temos uma coisa superior à dos outros, que é a qualidade dos produtos que temos. E aí também Moncorvo está já a fazer. Alem de registar todos os seus nomes de marca, nomeadamente o do ferro, é preciso uma loja online com os produtos made in Moncorvo. Isso permite-nos uma certificação de qualidade. O produtor tem o seu mercado e a Câmara tem de potenciar esses mercados.
 
“A grande ambição, em termos estruturais, será termos um cais de desembarque na Foz do Sabor.”
 
MB.: O que ainda falta fazer no concelho?
NG.: A grande ambição, em termos estruturais, será termos um cais de desembarque na Foz do Sabor. Essa é a grande ambição, o grande projeto para termos a possibilidade de entrada no nosso território pela autoestrada do futuro, a fluvial. Temos de ter aqui uma porta que traga os turistas ao nosso concelho.
 
MB.: Mas a obra dessa dimensão envolve alguns riscos...
NG.: Obviamente, por isso é que não disse que o vou fazer já. É uma das grandes ambições deste mandato. Temos de contar com as entidades externas que têm de dar o parecer, licenciar, e com a situação orçamental. Quanto aos operadores turísticos, julgo que têm a ganhar com o turismo fluvial. Por dia passam vários barcos. Temos de saber vender o nosso produto. Não nos interessa que saiam no cais de Foz Côa e vão para Barca D’Alva e, daí, para Salamanca. O projeto Aquafishe é visionário nesse aspeto. Essa será outra mais valia e uma valência importante para o concelho.
 
“Não há plano B”
MB.: Há um mês, na tomada de posse, falávamos da forma como o município se libertaria desta amarra, que é a dívida. Falou-se das minas, das eólicas e da Foz do Sabor. Neste momento, a questão das minas poderá não ser tão célere quanto desejável. Se um destes planos falhar, qual é o plano B?
NG.: Não há plano B. Há um plano que segue de acordo com o que nós pensamos que deve ser a gestão camarária e passa muito pela gestão. A diminuição das despesas correntes e das despesas de capital, obviamente.
 
MB.: E a nível de pessoal?
NG.: Obrigamo-nos a isso quer pela lei dos compromissos quer ao abrigo do saneamento financeiro. Estamos a seguir esse programa, que vinha do anterior mandato. Não iremos praticar o esbulho de trabalho, que é rescindir com as pessoas. Naturalmente, se se reformarem duas, só pode entrar uma. Mas este é aquele conceito que temos de ter. Para alem disso, terá de ser feita a tal renegociação dos protocolos, a diminuição das transferências que a Câmara faz. E outras coisas pequeninas. Por exemplo, renegociámos os contratos de telecomunicações que tínhamos e poupámos mil euros por mês. Também estamos a renegociar rendas, o que vai implicar a diminuição de um custo de mil euros por mês, com a possibilidade de nos transformarmos, nós próprios, em senhorios do Estado, o que vai trazer um acréscimo de rendas próprias do município. E com isto estamos a falar de três mil euros por mês. Ao final do ano já é alguma coisa. E não podemos estar a governar a pensar nas próximas eleições. Temos de governar para atingirmos a sustentabilidade financeira do município. A partir do equilíbrio financeiro, tudo é mais fácil.
Por exemplo, se for a um empreiteiro para fazer uma obra, juntamente com um município que não esteja endividado, para ele a obra fica mais barata. Com Moncorvo, o empreiteiro conta logo com prazos de pagamento, mais os juros, custos que o outro não tem. É a esse patamar que temos de chegar. E precisamos de ter um aproveitamento perto dos cem por cento das ajudas comunitárias. Os municípios do Interior têm de ter uma entourage técnica que possibilite que 95 por cento do que possa servir para o município se concretize.
 
“O mais difícil de mudar não é a capacidade de gerir, são as mentalidades.”
 
MB.: Falou da necessidade de unir esforços com outros municípios. Mas há sempre determinados assuntos que abrem diferenças. Por exemplo, a Urgência Básica, que está agora instalada em Vila Nova de Foz Côa. Como está essa luta?
NG.: Defendo que o modelo criado não é o correto. Um paciente que tenha de se deslocar para Foz Côa e regressar para Mirandela, podem ser minutos importantes para salvar uma vida. Estamos a 14 quilómetros de Foz Côa. Um paciente vai daqui para lá e, de lá, tem de ir para o hospital de referência, que é Mirandela. Isto não é eficiente. Mas o responsável e com quem temos de ter uma conversa mais séria não é com o nosso vizinho, é com o Estado. Explicar ao Governo que a forma como está pensado o funcionamento das SUB não é aquele que interessa às populações. Moncorvo tem uma centralidade com Freixo que Foz Côa não tem. Não foi pensado pelo Estado central o Norte do distrito de Guarda e o sul de Bragança terem uma centralidade. Se o território for pensado como uno e não como capelinhas, nenhuma das reformas que nos foram apresentadas está correta. Não quero acreditar que a das Finanças seja para ir para a frente. Mas o que apareceu com Vila Flor e Mirandela, quando Mogadouro tem um cadastro em termos prediais que é único no distrito, como pode passar pela cabeça de alguém que não esteja aberto. Ou seja, nem sempre o que é decidido pelo poder central e sem ouvir os municípios está correto. Como é que o Estado central defende que não deve haver tanta despesa, nomeadamente na Saúde, equipa um centro de saúde com todas as condições para ter um SUB e, depois, põe-no a funcionar numas “casotas” de estaleiro. E quando quer poupar e fecha edifícios, propõe uma despesa que é a construção de um edifício [uma despesa de cinco milhões de euros]. Mas não estou contra o colega de Foz Côa, estou a dizer é que está mal pensado pelo Poder Central. Entendo que foi um dos erros crassos e uma medida errada do Governo. Numa altura de desertificação, a população de Torre de Moncorvo sobe em termos percentuais com a construção da barragem, com a construção do IC5 e IP2, e nada disso é válido? É como irmos para um concurso, dizemos as regras e, a meio, as mudarmos. A coesão territorial tem de ser decidida pelo Estado que, até agora, só dividiu para reinar. Quantas vezes não ouvimos falar de autarcas do nosso distrito que se gabavam de ir ao gabinete deste ou daquele ministro, com quem tinham uma relação mais próxima? Por isso é que o executivo de Moncorvo tinha 28 anos. O mais difícil de mudar não é a capacidade de gerir, são as mentalidades. A intermunicipalidade tem de ser os próprios presidentes de Câmara aceitarem que nuns casos têm de ter determinados serviços e noutros têm de ser complementados com os do concelho vizinho. Só assim é que os municípios do Interior conseguirão competir com os do Litoral.
 
MB.: Como está a saúde da coligação?
NG.: Está boa e recomenda-se. Aliás, já trabalho com a vereadora do CDS há 12 anos. Há oito em coligação e há 12 éramos parceiros na Assembleia Municipal. É uma relação forte. Aqui vemos mais o interesse de Moncorvo do que o interesse dos partidos. Por muito que se tente, não vai ser fácil que esta relação tenha algum tremor.
 
MB.: E como está a relação com a concelhia do PSD?
NG.: Desconheço a concelhia do PSD.
 
MB.: Vai avançar com uma candidatura às eleições internas?
NG.: Vou ser candidato a um órgão da distrital. A concelhia não está no horizonte.
 
MB.: Agora, considera que sem a coligação tinha vencido na mesma?
NG.: Os nossos parceiros são sempre para manter ao nosso lado. Hoje voltaria a escolher os mesmos parceiros. É essencial em Moncorvo que o PSD e o CDS se entendam para dirigir o município. São os dois partidos que estarão estruturalmente mais identificados com a população do concelho.
 
MB.: Uma da sua grande base de apoio foi o associativismo, nomeadamente ao nível dos produtores. Mas agora é preciso repensar algum do apoio ao associativismo. Poderá estar aberta a porta a problemas?
NG.: Não. O apoio do associativismo ao PSD, que tanto se debateu na campanha, era o apoio que o anterior executivo tinha. O executivo tem de olhar para os seus parceiros, sobretudo para os investidores, como aliados. São eles que criam emprego, que dinamizam a economia local. Não podemos olhar para eles como inimigos. As próprias associações sabem os constrangimentos em que o município está, em que o país está e em que o próprio associativismo está. Portanto, quando se propõe uma redução, propõe-se caso a caso e vendo as necessidades da associação e vendo o papel que têm no concelho de Torre de Moncorvo. Que ninguém espere que eu fale mal de uma associação que se dedique à amêndoa. Desde logo porque é um produto de excelência, turístico, estratégico de Moncorvo. Essas associações terão todo o carinho necessário para se desenvolverem. Teremos de repensar se noutros casos valerá a pena manter aquele apoio, se deverá ser reduzido e, nalguns casos, aumentado. Há associações no concelho, nomeadamente as IPSS e outras, de cariz social, que nesta conjuntura, terão de ser mais apoiadas do que outras que, a nível cultural, das artes, já tiveram o seu apoio.
Por exemplo, o município vai manter a escola Sabor Artes, que mudou o seu nome para Escola Municipal Sabor Artes, para as pessoas perceberem que o município assume o custo social daquela escola. Mas teve de haver uma redução de preços e de valores gastos e uma maior participação dos inscritos. Se queremos que os nossos filhos tenham aulas de viola, de guitarra, de piano, de ballet, tem de haver também uma participação das pessoas que queiram que haja essa formação. Não pode ser de borla. Quando me dizem que um espetáculo é de borla desconfio sempre. Não gosto, acho desnecessário e até é mau para quem vai ver. Se foi de borla, não posso exigir mais. Visto de outra forma, chamámos os professores e dissemos que queríamos continuar, mas queríamos criar condições de qualidade. Vai começar já, ao contrário dos anos anteriores que começava em janeiro, e vai ter mais espetáculos. E isto não envolveu retirar uma valência, ampliámo-la, mas renegociando-a. Não podemos ter tudo a qualquer custo. E muito menos podemos ter algo, que é a dívida.        
 
MB.: Daqui a quatro anos, como espera ter a dívida?
NG.: Bastante reduzida. Espero que pelo menos não tenha que estar sob um saneamento financeiro, que os fornecedores possam ser pagos a 30 dias. Neste momento estão a mais de 90 dias e alguns empreiteiros a mais de mil dias. Espero ter o pagamento a 30 dias.
 
Órgãos
“Quando começar a sentir sinais que estou por ganhar eleições mas que o concelho disso não tira benefício, espero ter a consciência e a ombriedade de dizer para mim próprio que chega, e com a capacidade de nunca me candidatar depois a outro órgão que não seja a presidência da Câmara.”
 
 
MB.: Ainda mal tomou posse e já foi eleito para uma série de cargos, nas Associações de Municípios e mesmo dentro do partido. Esperava esta aceitação por parte dos seus pares? Foi fácil?
NG.: Foi fácil, não esperava mas também não esperava ser candidato à Câmara de Moncorvo. Sempre respeitei as condições que eram impostas. Contava ser eleito presidente do Conselho Jurisdicional dos Autarcas Social-democratas? Não contava, até porque a concorrência era enorme. Fui numa lista de consenso e foi o próprio presidente que me telefonou a perguntar se aceitava. Para a Associação de Municípios do Baixo Sabor, foi consensual. No Douro Superior, foram os meus colegas presidentes de Câmara que me propuseram, unanimemente, ser o presidente da Associação. Não contava ter todos estes cargos. Espero que sirva para a defesa da intermunicipalidade.
 
MB.: Quanto espera estar à frente da autarquia?
NG.: os mandatos necessários para cumprirmos o que nos propusermos e enquanto pensar que sirvo os interesses da população. Quando começar a sentir sinais que estou por ganhar eleições mas que o concelho disso não tira benefício, espero ter a consciência e a ombriedade de dizer para mim próprio que chega, e com a capacidade de nunca me candidatar depois a outro órgão que não seja a presidência da Câmara.
 
MB.: O anterior executivo tinha um espaço de contacto com a população através da rádio. Esse espaço será para manter?
NG.: Espero que a Associação Cultural me traga o que sempre pedi, as contas, as eleições, o relatório de atividades e saber quem é quem na Associação Cultural. Se isso for durante este mandato, e espero que assim seja porque gostaria que esta associação estivesse com este executivo para discutir apoios, por exemplo, gostaria de dar apoio a essa associação. Mas só serão dados quando tiver o que entendo necessário. Não estou com isto a querer dizer que o anterior presidente não gostava de saber quem eram os seus responsáveis. Não podemos negar que a rádio é uma forma privilegiada de chegar ao cidadão. Mas a Câmara tem um papel preponderante com as associações. Não basta ser sério, é preciso parecê-lo. Todas as que quiserem estar connosco com as contas em dia, podemos sempre com elas conviver. Mas eu sou muito mais para a escrita do que para a rádio. Se me dessem a escolher preferia uma crónica do que rádio.
 
 
“Implementámos uma atitude diferente do anterior executivo, que só recebia as pessoas às sextas-feiras. Aqui, a Câmara está com a porta aberta, todos os dias, para quem quiser vir, durante todo o horário de funcionamento.”
 
MB.: Há colegas que usam as redes sociais para chegar às pessoas. Será uma via?
NG.: Implementámos uma atitude diferente do anterior executivo, que só recebia as pessoas às sextas-feiras. Aqui, a Câmara está com a porta aberta, todos os dias, para quem quiser vir, durante todo o horário de funcionamento da Câmara. E isto porque entendo             que só se é presidente da Câmara enquanto estivermos ao serviço dos munícipes. Quando deixarmos de estar, somos um mero órgão executivo. Há muita gente que precisa de vir aqui, nem que seja para apresentar cumprimentos.
 
 
 
"Minas têm viabilidade"
MB.: Ficaram dois dossiês em aberto. As minas e as eólicas. Em relação às minas, o que espera deste projeto? Acredita mesmo que vai para a frente?
 
NG.: Acredito que as minas têm viabilidade, desde que o Estado queira acreditar neste projeto da forma como este ministro da economia o entendia, ou seja, fulcral e dinamizador do próprio pais e não apenas do concelho ou do distrito. Estamos a falar de um investimento que é superior ao PUB da Autoeuropa. É nacional. A empresa ou o município não têm capacidade de, só por si, alocar o investimento, pelos valores de que estamos a falar. Desde logo, pela necessidade de construir um mineroduto. A despesa com o transporte do minério. Será feito por via fluvial? Levamo-lo até ao Pocinho e daí sai por ferrovia para Espanha? Sucessivos erros levaram ao encerramento da linha de Barca D’Alva. São problemas que herdámos já dos anos 60.
Moncorvo tem essa matéria prima. O concelho pode ajudar a beneficiar a economia nacional. E um dos benefícios será a partir do momento em que o Estado comece a pensar nas matérias primas que tem no seu território e que podem ser para definitivamente alavancar a economia nacional.
Por isso, acredito, pois temos a matéria prima necessária. Mas o município e a empresa provavelmente não o conseguem só pelos dois. E aqui entramos num tema que me é caro, que é o da coesão territorial, que deve ser o Estado a fazê-la e não a faz. Deve ter confiança no Poder Local.
 
MB.: Mas criou-se aqui uma espécie de impasse. Considera que o processo foi bem gerido?
NG.: Com todas as vicissitudes que sofreu, como a de ter só uma empresa a explorar, depois ter uma segunda empresa a explorar e quando o próprio ministro, que sustentava esta solução, sai do Governo, o processo não pode ter sido bem gerido, obviamente. O que nos interessa é que daqui para a frente o Estado não deixe cair este projeto, que é nacional.
 
MB.: O seu antecessor chegou a declarar publicamente que considerava tudo isto um logro. Partilha dessa posição?
NG.: Acredito que é possível.
 
MB.: Desde o início?
NG.: Vamos ver. Quando nos deparamos com um projeto de milhões, nos falam da Rio Tinto, que vem dizer não estar envolvida no processo, as pessoas começam a ter alguma descrença. E isso é o pior que se pode fazer para um projeto que se quer concretizar, que os próprios habitantes não acreditem.
 
MB.: Mas foi mesmo constituída a MTI Ferros de Moncorvo SA. Isso veio trazer confiança.
NG.: Por isso é que eu digo que neste momento acredito que possa ser possível. Mas a possibilidade é diferente da realidade. Temos matéria prima, temos tudo o que é necessário para ser uma realidade. Falta o Estado português dizer que também quer estar presente. O grande entrava às minas não é a possibilidade ou não de haver minério de qualidade. É o custo de transporte desse minério.
 
MB.: Então a interioridade é um fator a ter em conta...
NG.: Sempre foi. Voltamos à questão da coesão territorial. Mas gostaria que a empresa me dissesse que, não havendo a capacidade para transportar todo o minério, que há capacidade para parte dele ser transformado em Moncorvo. Aí conseguiríamos diminuir o custo do transporte bem como o peso dele no projeto.
 
 
MB.: Esteve presente na apresentação do projeto das eólicas. Que perspetivas lhe traz este projeto?
NG.: Acredito que é compatível com o do ferro, sobretudo agora, que se utiliza o sopé da Lousa. Para o concelho, que está financeiramente desestruturado, era uma forma de suportar essa própria desestruturação. Estamos a falar de um protocolo que prevê, até julho, a entrada de 3,750 milhões de euros, mesmo tendo em conta que alguns dos geradores serão instalados no concelho de Carrazeda de Ansiães. Mesmo assim é estruturante para Moncorvo.
Eu não faria da mesma forma. O timing foi errado, foi na pré-campanha e não faria a apresentação nesses moldes. Preferiria uma apresentação no terreno e após as eleições. Posso dizer que, até hoje, não fui contactado pela empresa em causa.
Já li os documentos, estão assinados por pessoas que me merecem toda a confiança, nomeadamente o anterior presidente da Câmara, pelo que estará, de alguma forma, assegurado. Mas é um projeto que não podemos deixar cair. Também neste novo executivo as eólicas são fundamentais.
 
MB.: Viu pulso firme na empresa em levar o projeto avante?
NG.: Recordo-me de o presidente de então perguntar ao representante da empresa se o CEO percebeu os momentos que teria de entregar em 2014. Quem cala consente.
 
 
Neste momento, Torre de Moncorvo tem de pagar dívidas e não podemos entrar em loucuras.”
MB.: Defende a revitalização da última aldeia piscatória do distrito e da envolvência da serra do Reboredo. Isso não choca com restrições ambientais?
 
NG.: Tenho essa noção mas a reunião que tive com o ICNF correu muito bem. Tem de ter a perspetiva que só ter preservação ambiental e não ter a capacidade de incluir projetos do Homem nessa preservação ambiental, conduz a mais desertificação do que aquela que já existe. E a Foz do Sabor tem um interesse vital para o próprio ICNF. Temos a última aldeã piscatória do distrito; temos condições únicas para proporcionar turismo gastronómico que não existe em mais nenhum local do distrito de Bragança; temos a possibilidade de fazer o encontro com o turismo vitivinícula, através da Foz; e temos a possibilidade de fazer da Foz a entrada nos grandes lagos do Sabor [ndr.: que se criarão com as barragens]. Pelo menos para o concelho de Moncorvo é essencial que sirva para isso mesmo.
Há quatro anos, quando nos apresentámos pela primeira vez e perdemos, um dos grandes projetos que tínhamos era um fluviário para o estudo e preservação ambiental quer da fauna, quer da flora. Era importantíssimo para dar ao ICNF a constatação que este era um município responsável pela preservação da sua fauna e da sua flora. Essa era a nossa grande ideia, trazer o estudo e a capacidade de envolver os técnicos dessas áreas no próprio concelho. Obviamente que não estávamos à espera das constrições orçamentais que se vieram a verificar e de a própria EDP querer fazer, em vez do fluviário, quase um berçário. A ideia é bem vinda. Uma não implica que se ponha de lado a outra. Não pode é ser para já. Um colega meu dizia que o primeiro mandato é para pagar dívida, o segundo para lançar obras e o terceiro, se a população deixar, para se despedir. Neste momento, Torre de Moncorvo tem de pagar dívidas e não podemos entrar em loucuras. Mas também não podemos deixar de dizer que a Foz tem uma característica única no distrito que temos de potenciar. E pode ser potenciada quando a fluvina que está lá, que teve o seu momento próprio mas que em termos turísticos não traz mais valias porque os barcos passam mas as pessoas não ficam. O nosso interesse é que as pessoas tenham um cais e as pessoas possa entrar. Esse é que é o enfoque principal.
 
 
“A Associação de Municípios do Baixo Sabor não pode continuar como está.”
 
MB.: Com isso, abandonar-se-ia o projeto de recuperação da escola do Felgar?
NG.: Não, mas temos que ver que a escola nunca conseguiria abarcar todo este conteúdo que é importante que fique no distrito de Bragança, na influência dos municípios da albufeira e que, se possível, todo integrado no mesmo núcleo museológico. Tem obrigatoriamente de ficar na região, tem de ficar junto e temos condições para os manter, no estaleiro da Póvoa.
A EDP está interessada em ser um parceiro ativo. A Associação de Municípios do Baixo Sabor não pode continuar como está. Neste momento, reúne o Conselho estratégico mas o fundo que a EDP disponibiliza para o Baixo Sabor é gerido em Lisboa pelo ICNF. Isso é um conceito que não queremos. Queremos que o ICNF e a EDP sejam parceiros mas que o desenvolvimento e as obras estruturantes dos municípios sejam eles a decidi-las. Desta forma teremos de ir para outro passo. Poderá alterar-se com a criação de uma Agencia de Desenvolvimento. Temos um plano estratégico já elaborado, que coincide com o plano que a Agencia visa propor aos municípios. O que falta agora é a criação da Agencia, que pode ser na hora. Estatutariamente pode ser criada na hora. O que faltava saber era se os municípios queriam a Agencia. Falo pelos quatro que estamos agora e é unânime. A partir desse momento, que seja consensual.
 
MB.: Acredita que isso poderá ficar resolvido até março?
NG.: Temos de o ter resolvido até março.  E quando o município de Moncorvo foi eleito para presidir à Associação de Municípios do Baixo Sabor, esse era um dos pontos essenciais, estar resolvido até março, estar a agencia criada e com o seu plano estratégico aprovado.
 

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