A opinião de ...

Uma crise institucional e de regime

regime democrático em que vivemos, desde há quase 50 anos, tendo tido, nos últimos 30 anos, abalos sucessivos pela degradação progressiva da vida democrática e pela profunda crise da chamada democracia representativa.
Com efeito, as suspeitas sobre políticos, a emergência de situações que violam os mais elementares princípios da ética de representação pública e, em particular, a falta de competência para o exercício das funções de representação e de governação a que são chamados, tem deteriorado a relação de confiança entre eleitores e eleitos. O progressivo crescimento dos níveis de abstenção, a limitação de candidaturas emergentes da sociedade civil, o monopólio da vida democrática exercido pelos partidos, sindicatos e confederações patronais tornou o regime vulnerável a impulsos populistas que têm medrado exponencialmente.
Nas últimas eleições legislativas, com a maioria absoluta obtida pelo Partido Socialista, o país estava à espera que o atual Primeiro Ministro usasse a confiança dada pelo povo nas urnas para escolher um governo que escapasse à “tralha” do aparelho partidário e se apresentasse renovado, com pessoas competentes dentro das diversas áreas da governação e, sobretudo, acima de qualquer suspeita. Pura ilusão! António Costa, que em tempos terá dito que Mário Soares era um político de exceção, mas com a fragilidade de não saber escolher as pessoas certas, veio mostrar que é, nesse particular, muito pior que Mário Soares (que nunca teve nenhuma maioria absoluta) ao escolher gente do aparelho socialista a quem ninguém conhece outra profissão que não seja a “escola” da “jota” e depois a passagem por gabinetes, das Câmaras à Assembleia da República e do partido ao Governo, e que, portanto, nada mais podem exibir no seu currículo.
A governação de um país exige competência e conhecimento, em boa parte colhido na experiência e interação com as realidades dos mais diversos setores da atividade económica, social e cultural. A escolha dos Ministros e Secretários de Estado deve ser criteriosa e acompanhada de um conhecimento sobre as políticas que melhor podem contribuir para o desenvolvimento do país aos seus diversos níveis. É inaceitável que, após 7 anos de governação liderada por António Costa, o país não tenha assistido a nenhuma reforma profunda que, no plano do desenvolvimento da sociedade, tenha contribuído para a melhoria da eficiência do Estado e para a mais eficaz resposta das empresas. Da justiça à educação, da saúde à coesão territorial, da investigação científica ao registo de marcas e patentes, da atividade económica à segurança social, em geral nada melhorou porque nada de substancial foi feito. O sistema judicial é hoje um entrave à confiança dos investidores e dos agentes económicos e os processos arrastam-se nos tribunais por tempo infindo. Na educação, a supressão dos exames e de mecanismos de avaliação adequados permitiu que cheguem ao ensino superior alunos sem preparação de base e incapazes de sentir qualquer apelo ao estudo e ao esforço, que a busca do conhecimento exige. Na saúde o panorama é crítico e, não obstante a injeção de mais dinheiro, os problemas de fundo continuam por resolver. O modelo de gestão não existe ou não funciona e o dinheiro que se gasta não tem os reflexos e o retorno esperado. Há, pois, na generalidade, uma ineficácia do Estado que sobrecarrega a classe média com mais e mais impostos e não lhe retribui serviços adequados e que respondam às suas legítimas preocupações. O modelo de financiamento da Segurança Social está esgotado e é indispensável encontrar soluções que garantam a sustentabilidade futura das prestações sociais. Mas para isso é necessário desenvolver um programa de ação para o curto e o médio prazo, definindo prioridades e orçamentando as intervenções a fazer, num quadro articulado com uma estratégia de médio prazo que vise a estabilização das principais respostas que o Estado tem de garantir aos cidadãos: Saúde, Justiça, Segurança Social, Ensino, Segurança e políticas públicas para a dinamização da economia e do emprego.
Até 2030 Portugal vai receber da União Europeia cerca de 40 mil milhões de euros e a não existência de programas que tendam a valorizar esse manancial de recursos pode deitar a perder aquela que pode ser a última oportunidade de fazer convergir o país e de salvar a democracia como regime que garante a satisfação de direitos fundamentais aos cidadãos. Mas para isso o governo tem de substituir os protagonistas por quem saiba e por quem faça e, muito particularmente, ultrapassar o preconceito ideológico que tem obstaculizado a uma intervenção global nas estruturas organizacionais do Estado, que são financiadas pelo esforço dos contribuintes através da carga fiscal incidente. O tempo que hoje vivemos não é o tempo de há 20 ou 30 anos. É um tempo que exige da política um avanço ao nível do que foram os progressos da ciência, da tecnologia e do conhecimento. A retórica política tem de assentar na factualidade que decorre da realidade, dando respostas capazes e implementando políticas que honrem e satisfaçam o esforço feito pelos portugueses através dos impostos que pagam. É essa relação de respeito e de bom uso dos dinheiros públicos que contribuirá para a recuperação da confiança dos cidadãos e para a neutralização das iniciativas populistas que cavalgam a onda do descontentamento e da desconfiança tão à epiderme da generalidade dos portugueses. É, sem dúvida, absolutamente urgente não esperar mais e definir um rumo e um desígnio nacional.

Edição
3917

Assinaturas MDB