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Da Aclamação à Restauração 1640-1668: Motivação e Conspiração

Senhora» de uma Ibéria unificada e poderosa desde 1581, Castela viveu a partir da década de 1630 uma série de problemas, confrontada com revoltas sociais em Portugal, na Catalunha e Galiza, quebra de remessas de minério das Américas e envolvimento militar em guerras contra a França, Holanda e Inglaterra.
Em Portugal, os aparentes benefícios de casta nobiliárquica, unicidade religiosa e, sobretudo, de comércio burguês assumidos após o desaparecimento de D. Sebastião e a entrega do trono ao castelhano Filipe II desvaneceu-se. Os castelhanos colocavam tudo e todos na Lusa Pátria sob mordaça, os Holandeses, inimigos de Madrid, apropriavam-se da terra brasílica e dos proveitos do açúcar, o mítico e heróico Oriente, forjado à espada por heróis como D. Francisco de Almeida, D. Afonso de Albuquerque ou D. João de Castro, era abandonado e com ele muita da evangelização e poder global, os impostos aumentavam e o povo mingava à fome, os nobres de capa eram politicamente ignorados e os de espada canalizados, mais as gentes dos seus termos, para guerras europeias de interesse castelhano. Começou a murmurar-se entre a «gente miúda» e frei Heitor Pinto iniciou o brado de alma dizendo: «el-rei Filipe bem me pode meter em Castela, mas Castela em mim é impossível». Do mesmo modo, enquanto os freires de Santa Cruz de Coimbra passavam a enaltecer a figura galvanizadora de D. Afonso Henriques e o espírito patriota do resistente D. António Prior do Crato (derrotado por Filipe II na luta pela coroa portuguesa), os abades cistercienses de Alcobaça aconselhavam a leitura da epopeia camoniana Os Lusíadas como conforto moral e espiritual e redigiam a Monarquia Lusitana, obra grandiloquente que relembrava a grandeza de Portugal, forjando ainda as célebres Atas das Cortes de Lamego, que justificariam a ilegitimidade da dinastia filipina, e até o Sapateiro bandarra de Trancoso escrevia sobre o Encoberto, que viria para resgatar a Pátria num qualquer dia de nevoeiro, levando as gentes a pensar tratar-se de D. Sebastião, que velava algures.
Entretanto surgem duas grandes motivações e uma soberana oportunidade para restaurar Portugal. As motivações foram, por um lado, a ação insidiosa do cardeal Richelieu, 1.º Ministro de França, que instigou a nobreza a refutar a suserania castelhana, mediante promessas de apoio político e ajudas financeiras e militares. Por outro, a derrota naval da frota hispânica de Oquendo na Batalha das Dunas, ante a da holanda de Stromp, que originou o abatimento do poder naval da Monarquia, que possibilitou em Lisboa a ausência de meios navais hispânicos de controlo. A Insurreição e proclamação de independência na Catalunha, face ao poder tutelar de Castela, em 6 de junho 1640, surgiu como a grande oportunidade. Consequentemente, a alta nobreza, representada por Antão de Almada, e a fidalguia de menor condição social, com João Pinto Ribeiro, secretário do duque de Bragança à cabeça, assumiram-se como conjurados e aceleraram os preparativos; os teólogos da Companhia de Jesus, animados por um espírito anti castelhano e imbuídos de um carácter messiânico, trataram de animar os espíritos nacionais para a Nova Dinastia; o alto clero, classe pouco entusiasmada com o que se congeminava, tinha no arcebispo de Lisboa, D. Rodrigo da Cunha, o seu lídimo representante; o padre Nicolau da Maia fomentou a revolta no povo e no baixo clero, servindo como elo de ligação com a burguesia financeira de Lisboa e a Casa dos Vinte Quatro; D. Filipa de Vilhena e D. Mariana de Lencastre preparavam as mulheres portuguesas, incitando ainda os seus filhos à luta.
Para estes o encoberto que resgataria o trono, restauraria a dinastia e garantiria Portugal era D. João, 8.º Duque de Bragança. A decisão definitiva de Aclamação da Dinastia Nova foi deliberada em 12 de outubro de 1640, numa assembleia realizada em casa de Antão de Almada, em Lisboa. O Duque de Bragança deu o assentimento para golpe através de uma carta escrita em Vila Viçosa que chegou aos conjurados em 21 de novembro e, quatro dias depois, teve lugar a última e decisiva reunião. Os dados estavam lançados. A execução do golpe teve lugar na manhã de Sábado de 1 de dezembro de 1640, desencadeada a partir do Terreiro do Paço, em Lisboa, contra o poder hispânico instalado no Paço da Ribeira!
… Continua no próximo número …

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3912

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