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Soldado Milhões – Herói Transmontano da 1.º Guerra Mundial

A 10 de abril, foi inaugurada na freguesia de Valongo de Milhais/Murça a Casa-Museu em homenagem do Soldado Milhões, o único soldado português distinguido com a Ordem da Torre e Espada do Valor Lealdade e Mérito por feitos em combate na I Guerra Mundial. Distinção que se segue a um busto descerrado na praceta de Murça, a 9 de julho de 1995. Ícone da presença militar portuguesa na Grande Guerra na Flandres, Aníbal Augusto Milhais distinguiu-se por atos de bravura e camaradagem e é o lídimo representante dos muitos «soldados desconhecidos» que deram tudo pela Pátria.
De acordo com a sua Folha de Matrícula militar, nasceu a 9 de julho de 1895 na aldeia de Carvas-Valongo/concelho de Murça; órfão de pai e mãe, Jornaleiro de profissão, analfabeto e com 1,55 metros de altura, assentou praça no Regimento de Infantaria (RI) 30, de Bragança (forte de São João de Deus), em 13 de maio de 1916, onde prestou Juramento de Fidelidade a 30 de junho. Feita a Instrução Básica, foi transferido para o RI 19, de Chaves (sito no Castelo), onde concluiu a recruta. Em 1917, inicia-se a projeção de unidades do Corpo de Exército Português (CEP) para a Flandres e o soldado atirador Aníbal Milhais segue, com os demais efetivos, para Lisboa, tendo a Flandres como destino final no final do mês de maio. Aqui é sujeito a instrução de metralhadora ligeira Lewis 7.7 mm, onde se destaca. Depois, é integrado no BI 15 de Tomar, na guarnição de Metralhadoras, onde faz adaptação ao contingente militar luso-inglês, ao terreno e ao inimigo. É a fase dos trabalhos de trincheira, dos bombardeamentos de flagelação alemães e dos raides pela «terra de ninguém».
Quando, na madrugada de 9 de abril de 1918, os alemães iniciam a Batalha de La Lys com intensos bombardeamentos de Artilharia e atacam com a Infantaria as posições defendidas pela Divisão Portuguesa, as forças onde se inclui o soldado Milhais estão posicionadas em Croix Marmouse e fazem parte da reserva divisionária britânica. Avançam então para a área de Huit Maison onde, juntamente com tropas escocesas, organizam uma posição defensiva e fazem fogo sobre os alemães, retardando-lhes a progressão. Cerca das 14 horas, retiram sob pressão para a área de La Fosse, quando a posição é envolvida. É este o grande momento de Aníbal Milhais, pois reteve “com grande vigor o avanço inimigo, não abandonando o seu posto senão quando os portugueses e os escoceses já tinham retirado, salvando alguns destes de caírem nas mãos do inimigo, pois protegeu a retirada de todos, manejando a sua metralhadora com valor lealdade e mérito, indiferente à artilharia e metralhadoras inimigas” (Ordem Serviço, BI 15, de 15 de julho). Destemido, «cortava-os à rajada pela cintura», contaria mais tarde. O «Murça» (assim conhecido entre camaradas) só abandonou a posição com a sua «Luisinha» (metralhadora Lewis) ao cair da noite, errando pelos caminhos até La Fosse, na área da retaguarda, onde chegou a … 12 de abril, exausto e esfomeado, onde amêndoas doces foram o seu sustento. E é então que depois de ouvir a sua epopeia e tomar conhecimento de elogiosos relatos orais por camaradas de armas portugueses e britânicos, que o major Ferreira do Amaral, comandante do Batalhão 15, se lhe dirige com a frase pela qual ficaria conhecido: «és Milhais, mas vales milhões. Agora és Milhões». Regressou de França a 2 de fevereiro de 1919, foi licenciado e escriturado no RI 30 de Bragança, indo domiciliar-se na freguesia de Valongo. Foi-lhe concedido pela Secretaria da Guerra, o abono de $50 diários, o que daria para glosar a sua passagem de Milhais a Milhões e, depois, a tostões.
O «estrelato» acontece em 1924, depois da criação da Liga dos Combatentes da Grande Guerra e de o Diário de Lisboa o referenciar como herói e símbolo de generosidade e valentia dos soldados portugueses que combateram na Grande Guerra. Teve a honra de acender a chama na inauguração do Lampadário do Soldado Desconhecido no Mosteiro da Batalha, a 9 de abril. É também nessa altura que o nome da sua freguesia natal passou a chamar-se Valongo de Milhais. Morreu a 3 de junho de 1970 e os seus feitos heroicos foram passados à tela em 2018 pelos realizadores Gonçalo Galvão Teles e Jorge Paixão da Costa

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