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A Economia IV – A feira de gado

Se também havia feira de gado, lá havia um local onde este se juntava. Havia de tudo desde rebanhos de ovelhas e cabras a vacas de leite e de trabalho. Por esta data ainda havia muitos burros, cavalos, machos e mulas, para trabalho, estes muitas vezes trazidos pelos ciganos, que desde sempre se dedicavam a este negócio.
É muito característica a dinâmica destes negócios. Os compradores aproximavam-se, e observavam o animal, sem demonstrar interesse, procurando informações pelas conversas a decorrer. Afastavam-se e corriam as demais ofertas, em busca do pretendido. Havia um grande sentido de secretismo. Desconheço se seria ou não eficiente, mas era a praxis comum. Localizado o alvo, faziam-se as perguntas pertinentes, sempre com o ar desinteressado que criou o provérbio, quem desdenha quer comprar. Já se sabiam os preços de várias possibilidades. E cai a pergunta mais directa, quanto quer pela vaca? Vinte e cinco notas. Era esta a unidade monetária nas feiras de gado, a nota; uma nota eram 100 escudos. A resposta frequente era o sr não quer vendê-la! E afastava-se de novo, ou não, mas mais cedo ou mais tarde iniciava-se o regateio. Andava-se ali um tempo, mais nota menos nota, até que alguém apressava o negócio com o famoso “deixai-vos disso, racha! Era o sinal para dividir a diferença ao meio. Muitas vezes este facilitador do negócio era disso encarregado, por uma ou outra das partes, e também ganharia alguma coisa com isso.
Era muito interessante o aspecto geral da feira; todos eram animais de grande porte e por isso mantinham-se afastados uns dos outros para evitar manifestações territoriais, e assim a feira era formada por grupos de pessoas rodeando um ou dois animais, um zoo arquipélago.
Os rebanhos de ovelhas ou cabras ocupavam muito mais espaço, pois chegavam a atingir a centena de animais. Procurava-se vender o rebanho como um todo, por necessidade ou por mudança de actividade. Esta mudança de actividade chamava-se, nestas décadas, emigração e, nesta época venderam-se quantidades enormes de gado. Aqui acorriam muitos comerciantes à procura de gado para clientes, ou simplesmente de gado barato, para negócio. Outros, criadores, simplesmente procuravam machos para renovar o rebanho.
Este era um negócio de homens, não se viam aqui mulheres quase nunca. Além da aguilhada, traziam um naco de pão e presunto embrulhados num pano, no bolso do casaco. Vinham de longe e a pé, e o tempo passava devagar até se terminar o negócio.
Quase todos traziam uma aguilhada, a vara para tocar a cria que fazia parte integrante do ser destas pessoas. Quase sempre de freixo ou marmeleiro, endireitada por imersão prolongada em água e logo a casca queimada numa fogueira, que permitia arrancá-la sem ficarem feridas na madeira. Tirava-se à mão, queimava que se fartava, mas ficavam lisas e brilhantes.
A feira não acabava aqui, atingido o objectivo, havia sempre um local onde beber um copo, comer a merenda e cumprir o ritual social, a troca de informação.
Nunca se acabava sem gabar o negócio feito e a perspicácia própria.

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