A opinião de ...

Peixes, moscas, ratinhos e avatares

Por volta do meio-dia do passado dia 28 de fevereiro mais de quatro dezenas de alunos do décimo primeiro e décimo segundo anos, e professores, do agrupamento Abade de Baçal entraram na receção principal da Fundação Champalimaud para darem início a uma visita de estudo. Depois de confortado o estômago, a comitiva rumou ao Grande Auditório onde assistiram a um filme resumindo a atividade da instituição fundada pelo empresário António Champalimaud e dirigida por Leonor Beleza, antes de ouvirem uma apresentação, especialmente preparada para eles, por Catarina Ramos que, como introdução às quatro bancas experimentais que já os esperavam no átrio, lhes falou dos modelos animais que, a propósito, dão título a esta crónica. Despertou curiosidade a revelação de que, contrariamente ao que se poderia esperar, as ratazanas (mais usadas na investigação em neurociências por causa do seu tamanho) são muito mais dóceis que os ratinhos afinal mais agressivos se assustados. Para além da observação direta de atividades, associadas à microscopia de alta resolução e ao biobanco, foi possível participarem, ao vivo e em grupos de dez, em algumas experiências com moscas da fruta e peixes zebra. Naquelas, foi possível testar e verificar os efeitos do envelhecimento (condicionado pela temperatura em que se desenvolveram). Já os peixinhos foram observados, vivos, não só por fora mas também por dentro dado serem totalmente transparentes, na sua juventude. Porém, o mais impressionante é a sua utilização como avatares de doentes com cancro, para, de forma segura e (mais) rápida, poderem ser testadas, com evidentes ganhos, várias terapias alternativas apurando, em tempo útil, a que mais se adequa ao paciente, em tratamento, na clínica. Era a mostra evidente da aplicação da atividade científica na medicina, conhecida como investigação translacional.
No final, uma visita ao espaço laboratorial mostrou aos jovens nordestinos o lugar onde centenas de investigadores passam os seus dias a alargar as fronteiras do conhecimento segundo o propósito assumido pela comunidade cientifica do Centro Champalimaud para o Desconhecido. De seguida, foram conduzidos ao novo edifício Botton Champalimaud onde está já a funcionar um ambicioso projeto de investigação e tratamento do cancro do Pâncreas com generosas doações das famílias Botton e Wurth. A visita terminou no interior de um gigantesco armazém onde durante anos se transacionou peixe e onde vai nascer o maior espaço laboratorial da península, quiçá, um dos maiores da Europa e onde são esperados, vindos de todo o mundo, investigadores, técnicos, médicos, farmacêuticos e muitos outros profissionais interessados em desenvolver, explorar, descobrir e partilhar conhecimentos em várias áreas da biomedicina, sobretudo terapias inovadoras para tratamento do cancro, baseadas em novas tecnologias, nomeadamente em inteligência artificial. Para tanto, ao lado da área técnica, de apoio e laboratorial, vai ser construída uma aprazível zona de lazer onde, em frente ao Tejo, poderão partilhar uma cerveja que, como lhes foi explicado, pode ser o ponto de partida para o desenvolvimento de um projeto capaz de figurar na capa de qualquer uma das revistas científicas mais prestigiadas do planeta. Repetindo, aliás, algo já acontecido, como lhes foi revelado, em jeito de despedida, ao mesmo tempo que ficou o convite para, um dia destes, no futuro, regressarem para degustar um fino que, em Lisboa, vá-se lá saber porquê, se chama imperial.

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4027

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