A opinião de ...

Vida de cão!...

Já por diversas vezes pensei em abordar este assunto. Porém, sem saber bem a razão, este meu propósito tem sido negligentemente adiado. Percebo que se trata de um assunto que, como tantos, agradará a uns e desagradará a outros, mesmo tendo em conta que a frontalidade que tanto se valoriza, é aplaudida quando convém, ou agrada, na mesma proporção em que é censurada quando não cai “goto”, o que é revelador de ambiguidades e hipocrisias.
Vem isto a propósito, não só do que penso, mas também do que constato, na relação das pessoas - seres humanos - com os animais domésticos, neste caso, com os cães. Desde já quero dizer que tenho, no meu quintal, a “Xanel”, uma cadela linda, de pelo negro e brilhante, que me recebe quando chego a casa, sempre com boa disposição e rejubilando de alegria. Uma cadela, como tantas outras, mas que procuro tratar como cadela. Simplesmente. Anda solta no quintal, onde tem o seu espaço, de quando em vez passa umas horas a brincar com cão, vizinho, dá umas corridas, e pronto. Aliás, corrida pode fazer todos os dias. Tem espaço para isso.
Porém, impressiona-me a forma como muitas pessoas tratam, ou se relacionam como os seus cães, adulterar a sua natureza, ou seja, limitar a sua existência a um percurso muito diferente do que deve ser a vida de cão. Como os humanos gostam de ter um estilo de vida de humanos, também os cães têm o direito de ter vida de cão. Tudo o resto…
Pois, bem, no passado Domingo, por ocasião do meu café matinal, fazendo a minha prospeção sobre as notícias do dia, dei por mim a ler, na revista “Notícias Magazine”, um pequeno texto sobre o comportamento, desta feita intitulado “Animais devem ser tratados como tal”. Entendendo que vai de encontro ao meu pensamento e à minha forma de tentar perceber a vida de cão, não resisto em transcrever: “É comum a ideia de que os cães são parecidos com os donos (e vice-versa), membros queridos da família, os amigos leais que o homem pode ter. Ainda assim, alerta um estudo da Faculdade de Veterinária da Universidade Nacional do Nordeste, na Argentina, tratar os cães e os gatos como se fossem humanos – vesti-los, dar-lhes comida de gente, sentá-los à mesa, atribuir-lhes sentimentos humanos e outros procedimentos afins – não é uma atitude equilibrada nem saudável da parte dos donos. Mais grave ainda: tentar humanizá-los pode gerar sérios problemas comportamentais, de ansiedade, agressividade, depressão e stress, sobretudo nos cães, que fazem de tudo para corresponder às expetativas das pessoas e se sentem frustrados quando estas os proíbem de se coçar, ladrar, lamber os genitais e ter atitudes próprias da espécie. Há prazeres na vida de um dono que os animais nunca irão entender, mas o inverso também é verdadeiro.”
Posto isto, não tenho dúvidas em continuar a pensar que não parece uma atitude correta e de respeito pelo superior interesse da vida dos animais, os humanos alterarem, quase por completo, o que deve ser vida de cão, sobretudo quando se aproveitam da sua inocência para não lhes permitirem a sua verdadeira identidade e genuína vivência. A minha “Xanel” vai continuar a ser acompanhada regularmente pelo veterinário, terá a sua licença de acordo com a lei instituída, mas vai continuar a ser tratada como uma cadela, não vai andar conspurcar os espaços públicos, nem vadiar na rua. Em suma, quero que se sinta feliz no seu espaço, no quintal, vivendo, o mais possível, de acordo com o que deve ser uma vida de cadela. Sem incomodar os vizinhos!...

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