A opinião de ...

O universo da Justiça

A primeira representação imagética que me acode da Justiça é a da figura corpulenta, de olhos esbugalhados e mãos a denunciarem espanto, desespero e revolta do genial Orson Welles no filme inspirado na obra-prima de Franz Kafka, O Processo.
Do filme retirei a conclusão de que devemos amar a justiça se a venda, efectivamente, lhe tapar os olhos, no mais manda a prudência manter-nos afastados dos tribunais, tal como dos hospitais. As minhas experiências, forçadas na qualidade de testemunha são negativas, por isso mesmo preferi suportar uma ofensa levemente gravosa da minha integridade física, e forte no que tange aos valores éticos e morais.
A memória guarda acontecimentos relacionados com a Justiça e seus membros na cidade de Bragança. Não conheci o juiz Bernardino que levou uma facada na então sombria Cidadela devido a um desajuste de saias, não conheci o juiz (e ainda bem para mim) Campilho presidente do tribunal Plenário no Porto, conheci o juiz Sebastião aboletado e amante de salpicões crus e assados na Pensão Moderna, que procurou apoucar grotescamente o meu pai no decurso de um julgamento, também conheci os senhores Guimarães e Duarte Vaz excelentes no trato sempre empenhados no suavizar as prolongadas esperas e burocracia no Tribunal de Bragança, cuja construção operada pelos trabalhos forçados dos presos conforme directrizes do bragançano ministro Cavaleiro de Ferreira, o famigerado autor da sinistra lei das medidas de segurança, da qual guardo opúsculo publicado pela Seara Nova onde o legislador figura na companhia de Salazar.
Por dever de cidadania acompanho acontecimentos, episódios, diligências e rábulas vindas do universo da justiça a levarem-me a procurar manter prudente distância desse mesmo universo apesar do meu único filho ser (ao que dizem os especialistas) auspicioso, com provas dadas, advogado na competitiva profissão.
O circular, opaco, corporativo e empáfio universo está a sofrer os efeitos do posso, mando e quero, protagonizado por alguns membros dessa nobreza de toga que resvalou ao tilintar das moedas escurecendo-a porque sendo majestática, na essência a maioria é avessa a indignidades.

PS. Mantenho excelentes relações com vários advogados, de e em Bragança saliento os estimados Júlio Carvalho, Guedes de Almeida e Nuno Maia com o qual festejei a data da sua licenciatura, numa noite chuvosa do mês de Novembro. Recordo afectuosamente Domingos Ponte e Hermógenes Mazeda Pereira que nos deixaram prematuramente.

Edição
3801

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