A opinião de ...

Mudam-se os tempos, mudam-se as palavras

De um momento para o outro, a nossa vida levou uma reviravolta de filme de ficção científica. O mundo virou-se do avesso. Ficámos atordoados. Estamos ainda incrédulos. De manhã, quando acordamos, julgamos que foi um pesadelo. E, quando sentimos que até o chão nos foge, queremos crer que não passa de uma partida de mau gosto. Custa tanto acreditar que isto está a acontecer, a nós e em todo o mundo.
Apanhada de surpresa, a população mundial foi aprisionada pelo medo nas suas múltiplas declinações. Medo do coronavírus, medo de perder os entes queridos, o emprego e os rendimentos, medo de sair à rua, medo de ir à consulta hospitalar, medo de tocar nas pessoas e nas compras do supermercado, medo da morte e da vida. A realidade mudou tanto que tivemos de reinventar hábitos e rotinas, redescobrir forças para ganhar resiliência, ajudar os outros e ter esperança.
Quando a realidade muda, mudam os termos com que a verbalizamos. Novas palavras entraram no léxico português. Velhas palavras saíram do dicionário para o nosso quotidiano com novos sentidos. Voaram da terminologia médica e científica para os media, aterraram nas nossas casas e mudaram as nossas vidas. Na origem de tudo está o “coronavírus” que veio da Ásia para a Europa, foi provocando “contágio”, gerando “cadeias de transmissão” e “epidemias” por onde foi passando até atingir todos os continentes e todos os países e se transformar em “pandemia”.
Por causa dele, o vírus, familiarizámo-nos com termos, expressões e conceitos médicos. Ficámos a conhecer a categoria dos “infetados” com sintomas e dos “assintomáticos”, bem como dos “imunes” e dos “imunizados”, cuja certificação é ainda prematura. Os “infetados” e os que com eles conviveram ficaram de “quarentena”, não literalmente os tais quarenta dias que lhe estão na origem, apenas duas semanas em média. Observando e aprendendo com o que se passava noutros países, cedo se começou a falar de “ventiladores”, “testes”, “zaragatoas”, “máscaras”, “luvas”, “viseiras” e “gel desinfetante” para prevenir e tratar a “Covid-19”.
Porque este vírus se pega a tudo e todos, através de “gotículas” respiratórias, que são disseminadas quando uma pessoa tosse, espirra ou fala, e não olha a género (mas a número), estatuto social, etnia, orientação sexual, ou idade (ainda que revele preferência pelos mais velhos), a primeira medida preconizada foi o “distanciamento social” (ou “distância social”), que deverá vigorar até à descoberta da vacina. Com o agravamento da situação em alguns pontos do país, surgiram a “cerca sanitária”, também na versão masculina de “cerco sanitário”, e o “cordão sanitário”, expressões que designam o encerramento temporário de um determinado território por razões de saúde, com proibição de entradas e saídas. Com a declaração do “estado de emergência”, o encerramento de escolas, empresas, comércio e repartições de atendimento público, vieram o ensino “a distância”, a “telescola”, o “teletrabalho”, o recurso ao lay-off (dispensa temporária de pessoal), o “isolamento social” ou “confinamento”, ou seja, ficar em casa, sem contactos sociais no exterior. Em todo o mundo, parece haver mais de 900 milhões de pessoas confinadas. Uma calamidade! Há de surgir a luz ao fundo do túnel, mas não se sabe quando. Saúde e cuide-se, caro(a) leitor(a).

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