Já reparou como, hoje em dia, é raro olharmos verdadeiramente nos olhos uns dos outros?
Quero convosco refletir sobre um tema que julgo muito pertinente. Vou dando conta que hoje, mais do que nunca, há uma gigantesca dificuldade de olharmos nos olhos uns dos outros e de sentir aquele olhar de predileção, aquele olhar que nos diz que somos muito valiosos e que nos garante: “fazes-me falta”! É uma graça imensa ter quem nos olhe desta maneira e termos o privilégio de dizer a alguém: “sinto a tua falta” ou “quero-te muito”. Sim, é um privilégio sentirmo-nos importantes na vida de alguém. Esta ideia é de tal maneira tão impactante que cria em cada um de nós um desígnio e uma missão, isto é, de sermos presença transformadora e consoladora.
Portanto, ter um olhar onde colocar o nosso olhar é um verdadeiro privilégio. Quem não procura, quase incessantemente, por alguém que fixe o seu olhar no seu? Somos assim: procuramos isto para nos sentirmos bem e integrados, para podermos viver sob um propósito e uma missão. Quando os olhares se cruzam, algo de mágico acontece. Apercebemo-nos que o cruzamento destes olhares transportam-nos para aquele olhar único e fundamental, aquele olhar que imprime sentido e propósito, aquele olhar que transforma e alimenta a alma.
Assim, compreendemos que entrar no tempo do outro é uma prova gigantesca de amor. E isso leva-nos a compreender que quem não o procura é porque não sente a sua falta! E quem não sente a sua falta, não merece espaço no seu coração. Mas, cada um de nós teima em adiar esta decisão fundamental, não é assim? Quantas vezes nós não insistimos e não vamos atrás – quase até ao limite – de quem não nos procura, de quem não nos valoriza e de quem não nos prioriza? Mas por que razão fazemos isso? Não sei, mas talvez seja porque queremos que o outro reconheça o quão especial ele é para nós; ou, talvez, queiramos que ele veja o quão bem lhe queremos; ou, talvez, só queiramos ser correspondidos neste bem-querer. Talvez...
Por isso, a vida é uma lição! É ela que nos conduz até Nosso Senhor; é ela que nos revela e nos abre os olhos para a compreensão da vida como dom; é ela que nos dá a conhecer o amor infinito e indizível que Deus tem por cada um de nós; é ela que nos conduz a este encontro fundamental com Nosso Senhor que acontece no silêncio do coração, bem olhos nos olhos, sem máscaras e sem filtros, sem pretensões ou veleidades, somente nós, nus, frágeis, carentes, pequenos. Quando este encontro acontece o milagre da vida envolve-nos num abraço eterno que nos faz sentir o quão amados e valiosos cada um de nós é, e perceber, com isso, que fazemos muita falta para Deus. Que descoberta esta! Deus tem falta de nós, tem saudades de ti, de mim, de cada um de nós! Como isto é transformador! Como isto é desconcertante! Não tenhamos medo de nos encontrar com Aquele que nos procura e que nos valoriza como ninguém. Façamos a experiência deste encontro e deixemos que Ele nos transforme em pessoas felizes e em paz.
Isto ajuda-nos a compreender que todo o amor e todo o bem-querer não podem, nem devem estar à espera de nenhuma atitude retributiva por parte do outro. Amar é, por si só, um acto sem medida. Quem dá, somente dá: não cobra, não espera, não julga, simplesmente dá. Dá porque ama e porque quer genuinamente fazer alguém sentir-se especial. Que belo! Quando não vivemos com este sentimento, nem com este espírito, nós ficamos deprimidos, tristes e frustrados.
Na sua magnanimidade, Ele coloca sempre as pessoas certas nas vidas de cada um de nós. Pessoas que farão questão de querer estar presentes, que farão fazer do longe perto, que manifestarão a sua saudade, que sentirão falta de cada um de nós.
Olhemos para a nossa vida! Olhe com atenção: quem é aquela pessoa que está sempre lá? Quem é aquela que vive sempre preocupada consigo? Quem é aquela que sempre toma a iniciativa de lhe ligar, de procurar saber como está? E quem é aquela que vive sempre na procura de formas que solucionem os seus problemas e os seus dilemas? Afinal, quem é aquele que o prioriza e que sente a sua falta?
Aprendamos, pois, a priorizar quem nos prioriza. Não é somente uma questão de justiça, mas é, acima de tudo, uma questão de reconhecimento, de gratidão e de lealdade. Com facilidade, apercebemo-nos que, aquele ou aquela que realmente se importa com cada um de nós, faz questão de se fazer sentir e de estar presente. Isto é um dom e um tesouro, é memória e privilégio, é ser presente no presente de alguém, é ser vida na vida de alguém. Por isso, priorize quem o prioriza. Reze, confie, e deixe que Deus revele quem realmente merece fazer parte da sua vida.