FUTEBOL FORMAÇÃO

“Quero ser campeão distrital de Iniciados já na época de estreia”

Publicado por Guilherme Moutinho em Qui, 2021-10-07 12:30

Jorge Martins, de 54 anos, cumpre o seu primeiro ano como treinador de iniciados no Futebol Clube Mãe d’Água e aponta à conquista dos títulos que lhe fugiram nas épocas ao serviço do GD Bragança. Em entrevista ao Mensageiro de Bragança, o técnico brigantino reflete sobre o estado da formação no distrito de Bragança e qual o papel do técnico da formação no desenvolvimento dos jovens atletas.

 

MdB - Como começou a sua caminhada no mundo do futebol?

 

JM - A minha caminhada no mundo do futebol, começou como a maioria dos jovens, na escola. Com maior destaque quando frequentei o Liceu, onde tive o prazer de ter bons colegas. Foi uma geração de grande qualidade, que ainda hoje recordamos com saudades, durante o qual tive o privilégio de fazer sempre parte da seleção distrital.

Com 13/14 anos, aos fins de semana, já me iam buscar à minha aldeia para ir jogar com os mais velhos em diversos torneios. Posteriormente, ainda realizei testes no Grupo Desportivo de Bragança (GDB, mas como morava na aldeia e na altura não havia as possibilidades de transporte que existem hoje em dia, acabei por ter de desistir. Mais tardem tive a oportunidade de jogar federado pelo Morais Futebol Clube, com o treinador Sr. Cancelinha, antes de entrar para a Polícia Segurança Pública.

Com a ida para a PSP em Lisboa, joguei ainda alguns anos na equipa de Futsal da Polícia que disputava o Distrital de Lisboa, tendo regressado ao Comando Distrital de Bragança, em 2001/02, onde estive em 3 anos em Mirandela antes de regressar a Bragança. Entretanto, surgiu o convite para a formação do GDB, onde me dediquei, inicialmente, como diretor, e mais tarde como treinador, a fazer aquilo que realmente gosto.

MdB – Como avalia o seu percurso como treinador?

 

JM - Seja qual for a etapa na formação, o treinador tem de ter um papel preponderante não só no sucesso desportivo, mas também na formação do atleta enquanto indivíduo.

O desporto tem um papel bastante importante no desenvolvimento e formação das crianças e jovens, onde os resultados até determinadas idades mais avançadas, não são o mais importante.

Espera-se que o treinador transmita aos seus atletas os principais fundamentos da modalidade bem como, as competências técnicas e táticas mais adequadas em cada idade e permitam a evolução contínua nos diversos escalões.

Além da dinâmica desportiva, existem outras áreas, em especial do desenvolvimento pessoal, onde o treinador acaba por ter uma grande influência no dia a dia do trabalho com os atletas;

— Construção de maior autonomia e independência para a tomada de decisões;

— Construção da autoconfiança, autoestima e segurança;

— Desenvolvimento da resiliência por forma a aprender a lidar com a falha, o insucesso, as frustrações ou a pressão;

— Desenvolvimento do espírito de equipa, cooperação e camaradagem;

— Desenvolvimento do sentido de compromisso;

— Criação de empatia e senso de justiça.

Ser treinador é muito mais do que treinar atletas ou uma equipa, quando conseguem estabelecer uma boa relação, os treinadores adquirem um lugar de elevada influência nos jovens, o que permite aumentar os benefícios da formação, tanto a nível individual ou coletiva, a interação com o outro está sempre presente.

O treinador é, frequentemente, visto como uma referência pelos mais novos e acaba por ter um grande impacto nas competências interpessoais, ao ajudar, muitas vezes através do exemplo os atletas a perceberem valores como o respeito pelas opiniões e o espaço do outro.

Esta dinâmica abre um local para que uma vivência saudável e íntegra, seja em grupo e em sociedade, onde o todo é por norma é mais importante do que a soma das partes.

MdB –Esteve muitos anos como treinador do Grupo Desportivo de Bragança e na época passada mudou para o Futebol Clube Mãe d’Água. Qual foi o impacto dessa mudança?

 

JM - A mudança não foi fácil, pois foram muitos anos a representar e dignificar o GDB, entretanto surgiu o convite do presidente do F.C. Mãe d`Água, António Parente, que gostaria que fosse trabalhar com ele e reforçar a estrutura técnica do clube.

Com o apoio dos meus familiares e dos Pais dos atletas que treinaram comigo em anos anteriores, tudo se tornou mais fácil e viável para aceitar este novo desafio.

O impacto da mudança foi normal, pois sabia que encontraria um clube organizado, que acompanhava atentamente como adversário na altura, tendo ido inclusive várias vezes, por iniciativa própria e ao serviço do GDB, observar os jogos do FCMA, onde rapidamente identifiquei coisas muito positivas.

Vim encontrar um grupo de pessoas, desde o Presidente, diretores e treinadores, unidos, em que o objetivo principal de todos é trabalhar exclusivamente para e em prol do clube, para podermos dar aos nossos atletas as melhores condições para evoluírem e se sintam felizes e acarinhados, assim como os pais.

Só tenho a agradecer a honestidade, carinho e apoio como me receberam no clube, pois é assim que gosto de trabalhar e não com pessoas dissimuladas, desleais com agendas de interesse próprias.

Atualmente paira a sensação de que o clube é visto como um clube menor, de “bairro”, uma visão redutora alimentada propositadamente pelos nossos adversários locais, mas quem entra nesta instituição verifica ser muito mais profissional, plural, competente, abrangente e inclusivo do que outras instituições que apenas aparentam essas características.

Aqui existe muita união e um espírito de grupo muito forte, com uma gestão rigorosa, competente, apaixonada e com muita ambição. O resultado está à vista, atingiremos este ano um número recorde de atletas, onde provavelmente corremos o sério risco de ser o clube de futebol mais representativo da cidade.

MdB – O que diferencia a qualidade do treino de formação?

 

JM - É essencial que o clube tenha uma estrutura sólida, um projeto bem definido e condições para poder providenciar a todos os atletas, o acesso a treinos de e com qualidade.

O treinador e a sua equipa técnica, têm de conseguir construir uma estratégia que lhes permita lidar com esta complexidade, conseguindo maximizar o potencial desportivo e humano dos jogadores, quer individualmente, quer coletivamente, para atingirem os objetivos globais da equipa.

Para este poder ser definido racionalmente devemos, em primeiro lugar, considerar e diagnosticar o nível de prestação dos atletas de que dispomos através do nível de desempenho e avaliação.

Só após estes requisitos estarem cumpridos, estamos efetivamente aptos a definir objetivos realistas e adequados e promover a melhoria do seu rendimento.

Inicialmente é importante perceber, entender e aceitar que de uma maneira geral todos os jogadores diferem, isto é, temos que compreender que numa mesma equipa há jogadores completamente diferentes, tanto a nível social, psicológico, técnico, tático, entre outros.

Devemos entender que várias equipas são constituídas por um número elevado de jogadores, no entanto, existem vários objetivos diferentes entre todos.

Equipas onde todos os jogadores têm o mesmo objetivo são poucas ao nível do Futebol de Formação, desta forma também são poucos os treinadores com equipas destas.

Podemos observar que temos jogadores a começar a prática da modalidade aos 4 anos e outros a começar aos 7,8,11 anos. Esta situação ajuda a perceber o porquê de algumas vezes observarmos jogadores com enormes diferenças a nível técnico e tático, pois enquanto uns começaram a jogar há, por exemplo, cinco anos outros talvez seja o primeiro ano da sua atividade.

No entanto, o treinador deve arranjar soluções para que todos os jogadores possam evoluir, conforme as suas capacidades, mas que todos consigam sentir que evoluem.

Sou treinador de futebol de formação, treinei equipas completamente heterogéneas, no entanto, sempre coloquei a mim mesmo o desafio de tentar que todos tivessem a mesma possibilidade de evoluir. 

A única coisa que posso garantir é que diariamente o meu objetivo nos treinos é que todos possam evoluir, juntos ou separados, com exercícios mais fáceis ou mais difíceis, para que todos os exercícios proporcionem situações de evolução individual/coletivo. Esse sim, é o meu foco principal.

Sou da opinião que o treinador deve explicar aos jogadores, independentemente da idade, todos os seus objetivos, tanto a nível prático como teórico, desta forma tudo fica mais simples e a probabilidade do trabalho em equipa alcançar o sucesso é maior.

Para finalizar apenas quero deixar um apelo a todos os apaixonados pelo Futebol de Formação, deixemos que as crianças sejam crianças, que se divirtam e sejam felizes com a prática desta apaixonante modalidade chamada futebol.

MdB – Quais os momentos mais marcantes na sua carreira como treinador?

 

JM - Como treinador, todos os momentos são marcantes. Tenho muitos bons momentos, onde destaco a disputa dos campeonatos onde participei e assistir à evolução dos meus atletas.

 

MdB – Como avalia o panorama do futebol de formação brigantina?

 

JM - O panorama do futebol de formação em Bragança, atualmente, devia e teria obrigação de estar muito melhor.

Seria importante que o Município tivesse a possibilidade de conseguir providenciar mais condições, um olhar ainda mais atento para os jovens atletas da cidade Bragança, pois é muito difícil trabalhar, com qualidade, face aos recursos disponíveis. É crucial que uma cidade como a nossa consiga ter mais complexos desportivos para disponibilizar às diversas instituições desportivas locais.

MdB – Existe talento a despontar no futebol de formação em Bragança?

 

JM - Apesar dos recursos limitados que temos ao nível dos equipamentos desportivos na cidade, considero que atualmente temos, na formação, atletas masculinos e femininos que podem despontar para o futebol. Também depende muito deles, muitas vezes deveriam ser mais responsáveis e ter maior compromisso com as oportunidades que vão surgindo, já que muitos não dão valor aos sacrifícios que os pais fazem.

Tenho vários atletas que iniciaram a prática de futebol comigo, onde me orgulho de poder treiná-los, de fazer parte do seu crescimento e evolução para atingirem patamares de rendimento superior.

MdB – Como gostaria de ser recordado no futebol?

 

JM - Num mundo como do Futebol, não podemos nem conseguimos agradar a todos, mas no meu percurso adquiri boas amizades e experiências, com as quais aprendo e desfruto.

Gostaria de ser recordado como alguém que se predispôs a ser útil em prol do futebol local e dos seus atletas, em que o seu trabalho foi realizado na base da sinceridade, honestidade e competência.

MdB – Quais as suas perspetivas futuras como treinador de futebol?

 

JM - Atualmente estou no F.C. Mãe d’Água, inserido num novo projeto, onde estou muito feliz e motivado, em que todos juntos trabalhamos arduamente em prol dos nossos atletas e da sua felicidade, contribuindo para o crescimento sustentável do clube bem como da sua reputação.

Gostaria de, neste primeiro ano, ser campeão distrital como treinador do escalão de Iniciados. Sinto que tenho um grupo de atletas com um espírito forte, com qualidade e muito unido, sempre com o apoio da direção do clube. Seria importante para o clube, assim como para estes atletas.

Foto: Guilherme Moutinho

Assinaturas MDB