A opinião de ...

O protesto

Não há dúvida de que protestar é uma condição de quem se vê contrariado no seu modo de estar e de fazer; de quem se vê privado da liberdade de agir a seu bel-prazer; e de quem entende que determinada imposição não cabe na lei ou, na falta dela, nos costumes e tradições. Contudo, falando da privação da liberdade, nunca é demais afirmar que a liberdade de cada um acaba no momento em que essa liberdade vai interferir com a liberdade dos outros.
De qualquer forma, é necessário que quem quer usar a sua liberdade a saiba utilizar para que, pelo seu uso, não vá prejudicar-se nem prejudicar terceiros: a liberdade indevidamente utilizada pode vir a causar dissabores a quem assim a utiliza. Mal comparado será o facto de alguém achar que é livre de passar uma rasteira ao seu vizinho, (que pode ficar magoado de tal modo que se veja obrigado a recorrer ao hospital); ou de igualmente alguém invocar a sua liberdade para conduzir em contramão, o que poderá levá-lo a provocar um acidente com consequências gravíssimas.
Dir-me-ão que ninguém de bom senso protagonizará qualquer um destes atos. É verdade! Nada me custa aceitar que serão apenas exemplos inverosímeis.
Mas, por falar em liberdade dos outros, também é verdade que há pessoas que são livres de caminhar sem que alguém lhes provoque uma queda, ou, no segundo exemplo, há também pessoas que são livres de cumprir escrupulosamente as regras do trânsito. Em que ficamos?
Tudo isto para trazer aqui o que se passa relativamente às restrições que, em contexto de pandemia, têm vindo a ser impostas pelo Governo – pandemia que dificilmente se retrai, mas, que, mal encontra uma brecha criada por algum descuido, consegue lavrar abruptamente e com desumana temeridade.
Concretamente, ouso referir-me a quem deve ficar em casa, mas não fica; a quem deve evitar grandes ajuntamentos, mas não os evita; a quem deve evitar grandes convívios e festejos familiares, ou outros, mas não prevê as consequências de tais atos; ouso referir-me ainda aos que entendem não deverem utilizar a máscara, aos que entendem não deverem cumprir o afastamento social recomendado, aos que, por falta de planeamento, todos os dias frequentam os locais de compras e aos que, ao volante do automóvel, pretendem alargar, sob insustentáveis pretextos, o raio da sua área de lazer...
Mas, sobretudo, quero referir-me ao protesto que imediatamente acontece, logo que as medidas do Governo são conhecidas.
Partindo do princípio de que nenhum Governo tem o prazer de massacrar a vida das pessoas, acredito que essas medidas, a cumprirem-se, vão certamente ajudar a melhorar a situação contra a pandemia. Eu sei que há muitas opiniões contrárias às medidas que são tomadas pelo Governo, e que, seguindo essas opiniões, tudo seria mais fácil de resolver para melhor. Não duvido de que, de acordo com os seus programas, todos queiram debelar os problemas; e, seguramente, não estarão longe da razão. Contudo, só quem está à frente dos desígnios do País é que, depois de aceitar o que de melhor lhe parecer de outras ideias aventadas, só a ele compete tomar uma decisão. O contrário levar-nos-ia a atraiçoar quanto a democracia tem de melhor.

Tires, 20 de junho de 2021
Manuel António Gouveia

Edição
3838

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