A opinião de ...

E a descentralização à Bloco Central pariu um monstro burocrático

Foi publicada no passado dia 16 de Agosto, no Diário da República, 1ª série, nº 157,  pp. 4102- 4108,  a Lei 50/2018, denominada «Lei-quadro da transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais».
Como Lei-Quadro que é, tem de ser regulamentada através de decretos-lei, decretos e portarias, o que significa que esta Lei ainda não é descentralização, isto é, criação de instituições, pessoas colectivas distintas e separadas do Estado. Neste caso, é apenas mais transferência de competências porque as instituições a investir, as autarquias locais municipais, as autarquias locais de freguesia e as entidades intermunicipais, já existem.
Trabalhada sobre a proposta de Lei apresentada à Assembleia da República há dois anos, esta Lei obteve os votos favoráveis do PS e do PSD e, por isso, mexeu levemente no conteúdo da proposta apresentada inicialmente, mantendo o seu essencial, proposta que aqui analisámos em oito artigos, de Abril a Junho de 2017.
A Lei transfere por via burocrática e universal, mais competências nas áreas da educação, da acção social, da saúde, da protecção civil, da cultura, do património, da habitação, das áreas portuário -marítimas e áreas urbanas de desenvolvimento turístico e económico não afetas à atividade portuária, das praias marítimas, fluviais e lacustres, da informação cadastral, da gestão florestal e áreas protegidas, dos transportes e vias de comunicação, das estruturas de atendimento ao cidadão, do policiamento de proximidade, da protecção e saúde animal, da segurança dos alimentos, da segurança contra incêndios, das modalidades afins de jogos de fortuna e azar, e do estacionamento público.
O legislador é muito zeloso dos seus poderes burocráticos, isto é, de regulação e de igualização de todos, sejam quais forem as condições de cada um. Todas as entidades ficam obrigadas a aceitar esta «descentralização» a partir de Janeiro de 2021 podendo, até lá, adiá-la, nos tempos pré-determinados (até 18 de Outubro para 2019 e até 30 de Julho de 2019, para 2020).
Em nenhum articulado da Lei se permite que uma autarquia não se sinta preparada ou julgue que os recursos e pessoal a transferir não são suficientes. Ao contrário de todos os princípios da administração autónoma e autonomizante, as entidades autarquias municipais e intermunicipais têm de aceitar as competências que o «Senhor Poderoso» lhes transfere. Só as autarquias de freguesia podem recusar a possível delegação de competências que as câmaras municipais queiram outorgar-lhes mas não as que «Soberano Central» transfere.
Igualmente não se cuidou de saber se as entidades estão preparadas em termos técnicos, em termos humanos, em termos logísticos e em termos de infraestruturas para as novas competências. Pensou-se apenas em que, com esta Lei, se rompia com a estrutura do Estado Centralizador ignorando-se que uma das formas de reforçar este é justamente fazer com que a entidades inferiores a ele, a ele recorram como ajuda nas dificuldades.
Enfim, não sei se voltarei a este tema mas, na impossibilidade de recusar as competências a partir de 2021, recusá-las-ia até lá, por «dictat» abusivo de poder por parte do «Imperador», e preparar-me-ia para o monstro com que as autarquias e entidades municipais ficarão em mãos.
 
 
 

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