Ninguém deve envelhecer sozinho
Uma sociedade mede-se pelo cuidado aos seus idosos
No interior de Portugal, a Igreja continua a ser presença de proximidade e humanização para muitos idosos esquecidos. Mas esta missão não pode ser só dela: cuidar dos mais velhos é um dever de toda a sociedade civil.
Entre aldeias quase desertas cresce um inimigo silencioso: a solidão dos idosos. Não faz barulho, não ocupa manchetes, mas corrói a esperança, tira anos de vida e mina a dignidade. Muitos são os últimos habitantes da sua rua, da sua casa, da sua história.
Sem família por perto, sem vizinhos, resta o silêncio. Para muitos, o único momento de encontro é a Santa Missa dominical. E a Missa, no interior, é mais do que rito: é vida. Antes e depois da celebração há conversa, partilha de notícias, sorrisos e memórias. O sacerdote não é apenas quem preside: é quem escuta, chama pelo nome, visita e acompanha. A liturgia é fé, mas também é abraço, proximidade e dignificação.
Ainda assim, a solidão permanece como doença silenciosa. Mata gota a gota, dia após dia. É aqui que a Igreja tem mostrado um rosto que importa valorizar. Nas aldeias mais isoladas, através das suas instituições sociais — Centros Sociais Paroquiais, Fundações Canónicas, Misericórdias — chega com refeições quentes, cuidados básicos e visitas amigas. Uma refeição partilhada, uma tarde de jogos, uma conversa breve quebram muros de silêncio e devolvem sentido à vida. Não é apenas assistência social: é humanidade.
O Papa Francisco denunciava a “cultura da indiferença”, que torna invisíveis milhões. É o perigo da parábola: passar ao lado dos nossos idosos como o rico passou ao lado de Lázaro (cf. Lc 16,19-31). A Igreja no interior (de Portugal) lembra-nos que ainda é possível o contrário: parar, olhar e cuidar.
Mas esta não é missão só da Igreja. Famílias, vizinhos, autarquias, associações locais: todos somos chamados a ser resposta. A solidão combate-se com proximidade organizada: visitas de vizinhança, redes paroquiais e cívicas de acompanhamento, transporte solidário para consultas, clubes de convívio, telefonemas de rotina e pequenos gestos que, somados, fazem diferença. Cada comunidade pode criar um “mapa de proximidade”: identificar quem vive só, mobilizar recursos e assumir turnos de presença. É simples, barato e salva vidas.
Numa sociedade que acelera, é urgente desacelerar para olhar. A dignidade de uma comunidade mede-se pela forma como cuida dos seus membros mais frágeis. Se não aprendermos a cuidar deles, perderemos a nossa própria humanidade. Porque o que hoje é deles, amanhã será nosso.
A solidão mata. A ternura salva.
O amanhã começa no gesto que hoje ousarmos fazer. A pergunta é simples e inadiável: que lugar queremos ocupar — o da indiferença ou o da ternura
