A opinião de ...

Cuidado... porque a manta é curta

De há uns tempos a esta parte, é raro o dia em que, pelas mais diversas razões, não apareça quem reivindique tudo aquilo a que se julga com direito, só por ter nascido e por viver num país maravilhoso como o nosso.
Passado meio século depois do dia abençoado do vinte e cinco de abril de 1974, muito boa gente, ignorando a realidade dum pequeno país como o nosso, por má formação, ignorância ou interesses inconfessados, em vez de, responsavelmente, assentar os pés na terra, teima em continuar a viver nas nuvens, como se a esperança aberta na madrugada desse dia, por si só, fosse a punção milagrosa capaz de resolver, de um dia para o outro, todas carências, limitações, problemas e desigualdades criadas durante séculos.
Nada mais justo e democrático, dirão uns, fazendo lembrar os tristemente celebres educadores do povo de tempos recentes de má memória, do alto das suas certezas absolutas, impantes de vaidade e donos de todo o saber, enquanto outros, em cujo rol me incluo, embora subscrevendo totalmente os princípios que estiveram na génese da revolução dos cravos, prudentemente, reconhecem que as teorias e os princípios, por si sós, nunca levam a lado nenhum, acabando por se desacreditar a si próprios e, não raro, empurrar as pessoas que se deixam ir em fantasias, para becos sem saída, dos quais, dificilmente, ou mesmo nunca, conseguirão libertar-se com alguma dignidade.
Aqui chegado, e haja coragem para dizê-lo e assumi-lo, a situação atual do país é a confirmação inquestionável, o espelho cristalino, a imagem real de tudo que atrás foi dito e o diagnóstico sobre a melindrosa situação política, económica e social do nosso país, cuja verdadeiros responsáveis, porque isso lhes interessa, não tendo a lucidez nem a coragem de chamar as coisas pelo nome e de atacar as dificuldades como deveriam fazer, continuam embebecidos pelo folclore das manifestações de rua, pelas tiradas acaloradas, tão ridículas como demagógicas dos comícios e pelo coçar dos seus egos nas marchas e desfiles dos fins de semana e se sentem felizes e realizados a brincar com a espuma das coisas.
Entretanto, um número assustadoramente elevado de problemas graves e sérios que afetam a vida de todas as pessoas, mais que suficientes para tirar o sono a muito boa gente, que há muito tempo deviam estar resolvidos, dos quais se destacam, entre tantas outros, as crises na educação, na saúde, nas forças armadas e de segurança, na justiça, na habitação, nas migrações e no aumento do custo de vida, continua a crescer exponencialmente e a proliferar como os cogumelos tóxicos nascidos às carradas no Outono nos amontoados de folhas caídas das árvores, varridas pelo vento para a berma dos caminhos e apodrecidas pela humidade das chuvas.

Edição
3994

Assinaturas MDB