A opinião de ...

O Levantamento das Patentes

A propósito do combate à Covid19 surgiram várias vozes a pedir o levantamento das patentes que protegem e defendem a produção exclusiva das vacinas, por parte dos seus inventores e legais detentores dos respetivos direitos.
Na inovação, a propriedade intelectual é a principal matéria prima geradora dos proventos que sustentam os investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Na área da biomedicina tem aspetos complexos e característicos que deviam ser devidamente analisados antes de serem proferidas, em espaço público, afirmações que só se entendem que o sejam porque os seus autores desconhecem as verdadeiras consequências, a médio e longo prazo, da implementação das ações que defendem e que, não há dúvida, trariam benefícios no imediato.
Tive o privilégio de visitar, no início deste século, a divisão de patentes do Instituto Pasteur, em Paris e ser elucidado sobre o complexo e, sobretudo, moroso processo de gestão da propriedade intelectual. Apesar do grande portefólio daquele instituto, sobretudo no âmbito de vacinas, é bom referir que apenas uma ínfima parte da sua atividade científica resulta em produtos patenteáveis. Que, mesmo assim, destes, apenas um, em cada dez, em média, chega ao mercado. Os restantes noventa por cento constituem custos líquidos, consideráveis (uma patente só se encontra devidamente protegida se for registada e mantida em todos os países do mundo o que implica uma gestão complexa e onerosa) pois não resultam, durante o seu período de validade, em produtos minimamente rentáveis. Felizmente, os restantes dez por cento produzem lucros elevados que compensam os investimentos nos restantes.
Há instituições que, apesar de terem elevada produção científica, não vão além de uma diminuta carteira de patentes porque não havendo nenhuma capaz de gerar uma remuneração aceitável, a sua manutenção acaba por representar um fardo pesado. Este é, pois, um caminho arriscado que apenas continua a ser percorrido, precisamente por prometer uma recompensa sedutora, em caso de sucesso. A BioNtech, que este ano regista lucros assinaláveis, em 2019 teve mais de cinquenta milhões de euros de prejuízo. Por que razão haveria de abdicar desta oportunidade?
Se fosse decretado que quem ganhasse o Euromilhões tinha de abdicar do prémio em favor dos mais desfavorecidos... poderia ser socialmente justo, mas seria a morte da Santa Casa da Misericórdia e do enorme apoio que esta concede a quem dele precisa.
Quem pensa que a quebra das patentes democratizaria a distribuição e aplicação das vacinas, está redondamente enganado, como estava quando, em tempos, defendeu que a coletivização de todos os meios de produção, traria o desenvolvimento a todos, erradicando a pobreza e garantindo o bem estar geral e universal, como ficou provado com a queda da União Soviética.
No caso das vacinas, é, efetivamente, necessário fazê-las chegar a todos os cantos do planeta e garantir custos suportáveis para as nações mais pobres e menos desenvolvidas. Mas é bom que os países mais ricos paguem o preço que o mercado ditar porque essa é a garantia que numa nova pandemia futura haverá, igualmente, acesso a uma vacina, eficaz, em tempo cada vez mais curto.
A projeção internacional da portuguesa Bial só é possível por causa do respeito pela patente que tem sobre um medicamento de combate ao Parkinson. Sem ela seria esmagada pelas multinacinais farmacêuticas!

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