Bragança - Entrevista a Jorge Nunes (segunda parte)

“Sei que se cometeram erros, não tenho dúvidas disso, mas não nos faltou determinação para tentar cumprir uma missão”

Publicado por António G. Rodrigues em Qui, 2022-07-14 11:59

Nesta segunda parte da entrevista ao antigo presidente da Câmara de Bragança, Jorge Nunes recorda os quatro mandatos que fez à frente do concelho e fala sobre algumas das polémicas que enfrentou enquanto autarca e político, das guerras com os diferentes governos até às próprias guerras dentro do PSD.

MB.: Foi presidente da Câmara de Bragança durante quatro mandatos. Que balanço faz? Entre aquilo que encontrou no final de 1997 até à saída, em 2013, quais as maiores dificuldades que encontrou?

JN.: Em primeiro lugar, devo destacar que foi um período excecional da minha vida, de dedicação e de entrega à causa pública e não o fiz sozinho. As pessoas que me acompanharam, na área política, fosse do executivo ou da oposição, os autarcas das freguesias, os trabalhadores do município, a população em geral e as instituições do concelho. Creio que vivemos um período em que se levantou uma onda que uniu todos, na luta pelo progresso e pelo desenvolvimento de Bragança e da região.

É certo que Bragança estava um pouco desqualificada, até no contexto regional, face a outras cidades próximas. Falava-se nisso. Bragança tem uma história incomparável em termos regionais face a qualquer outro concelho, sem desvalorizar nenhum deles, pois todos são importantes e todos contribuem para este conceito de região e de província distintiva no quadro nacional.

Bragança estava com alguma dificuldade em termos de qualificação urbana, de atratividade e de competitividade da economia, de afirmação no sistema urbano regional e nacional.

A primeira grande preocupação, foi a de assegurar uma mudança na gestão, de reequilibrar as contas do município. Como primeiro pilar da governação foi assumido assegurar a boa gestão administrativa e financeira da Câmara. Uma instituição bem governada tem as bases essenciais necessárias para o seu progresso. Gerir os recursos com responsabilidade, de forma eficiente, e assegurar um ciclo de investimento que pudesse superar muitas das fragilidades que tinha o concelho.
Na área do ambiente, Bragança tinha problemas graves de limpeza urbana, de recolha de lixo quer na cidade quer nas aldeias. Tinha uma imagem de cidade suja, desqualificada, com lixeiras às portas da cidade, libertando, durante o verão, grandes colunas de fumo. Não era um bom cartaz de atração turística.

Não era uma cidade verde, havia poucos espaços verdes, não havia parques urbanos, as pessoas pediam coisas tão simples como bancos no espaço público, parques infantis para as crianças, parques para jovens, acesso à cultura e desporto. Era preciso investir no ambiente urbano. O rio Sabor e o Fervença tinham esgotos lançados diretamente nas linhas de água. Foi preciso fazer um esforço grande a nível de saneamento básico.

A reabilitação urbana carecia de uma grande intervenção, especialmente no centro histórico, que tinha uma grande degradação do parque habitacional, que vinha de alguns anos e em que era preciso fazer um investimento significativo para requalificar todas as infraestruturas subterrâneas do centro histórico e o espaço de superfície.
Em geral, no urbanismo era preciso dar maior harmonia ao conjunto edificado. Era necessário um exercício de planeamento mais fino, mais estratégico, dentro do conceito de competitividade e afirmação da cidade, de uma cidade verde e atrativa para o turismo, mas também para a economia. O ambiente foi o segundo pilar da gestão autárquica.

A cultura e o ensino foram considerados o terceiro pilar. Na área da cultura era preciso afirmar Bragança, sendo que a cultura é um pilar estratégico tanto na governação municipal como nacional, de afirmação dos valores, da identidade, de uma boa e sã estruturação da comunidade.

Na área da cultura fez-se, de facto, uma revolução e, hoje, Bragança tem essa marca cultural distintiva, que deve continuar a afirmar, neste âmbito as oportunidades de crescer não se esgotam. Creio que Bragança, reúne condições plenas para, em cooperação com municípios próximos, liderar uma candidatura e poder receber o título de Capital Europeia da Cultura, sem qualquer reserva, uma decisão nesse âmbito corresponderá a um novo salto afirmativo dos equipamentos e programação cultural, no concelho e na região.

Tivemos como preocupação um quarto pilar, o da economia. Sem emprego, sem desenvolvimento das instituições económicas, das empresas, sem progresso da economia, não há possibilidade de a comunidade em geral progredir.

No conjunto destes quatro pilares, trabalhados de forma estratégica e enérgica, do primeiro ao último mandato, como se não houvesse tempo no dia de amanhã para o fazer. Trabalhou-se sempre com o mesmo nível de intensidade, compromisso e de entusiasmo, dando sempre prevalência ao interesse público e acho que correu bem. Por exemplo, na cultura, em 1997 Bragança não tinha uma biblioteca a funcionar. Era preciso fazer um trabalho muito extenso, em muitas frentes, e era preciso envolver muitas pessoas e a cooperação de todos. Ninguém poderia ser deixado para trás, fosse da maioria ou da oposição e o que eu senti é que houve o envolvimento de todos. Todos queriam o melhor para Bragança, para a sua terra, vivessem em Bragança ou fora dela.

Senti a importância para muitos dos brigantinos que estavam fora o seu entusiasmo, a sua satisfação quando aconteciam coisas boas em Bragança.
Tinham de ser chamados a esse processo, e foram, e deram contributos importantes.

Foi um esforço muito alargado de muita gente, que permitiu reabilitar a imagem de Bragança em termos regionais e nacionais. Bragança passou a ser vista com outro olhar.
Bragança sempre foi vista de uma forma afirmativa no quadro nacional. Não foi nada que surgisse de novo, pois Bragança tem uma história muito rica. O que fizemos foi seguir esse percurso de afirmação de Bragança no quadro regional e nacional. Diria que, nesse âmbito, a articulação da gestão municipal com os cinco Governos nacionais com quem trabalhámos também funcionou bem.

Respeitámos a governação nacional, o Governo respeitou a governação local e, nesse quadro de respeito recíproco, sem perda de capacidade afirmativa e reivindicativa (há momentos em que é precisa muita exigência e determinação), as coisas funcionaram bem. Nunca sentimos, da parte dos Governos, recusa, em última instância, em assegurar a resolução de problemas para Bragança, sendo que foi preciso lutar muito em determinadas situações.
 
MB.: Quais os dossiês mais difíceis que enfrentou?

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