A opinião de ...

O IMTT e as Vítimas do Processo “Carta Branca”.

Em meados de Agosto de 2015, o Mensageiro de Bragança, no estrito cumprimento do dever de informar, difundiu, de forma séria e aprofundada, a notícia do atraso (de quase três meses) na marcação dos exames práticos de condução em Bragança, afectando mais de duas centenas de candidatos distribuídos pelas escolas que operam no distrito.
Pressionado pela comunicação social, o IMTT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres) não pôde negar aquilo que já todos sabíamos: a origem do atraso na realização das ditas provas estava o famigerado processo Carta Branca, que resultou na detenção de um número considerável de pessoas, entre as quais se encontravam três examinadores afectos à delegação de Bragança. Porque não houve a preocupação de substituir essas pessoas – o que seria recomendável -, a situação descambou nos inevitáveis constrangimentos dela decorrentes.
Dos 200 candidatos à obtenção da permissão de conduzir encontravam-se algumas dezenas de estudantes que, sendo de Bragança, e já depois de se terem inscrito nas respectivas escolas de condução, passaram a viver longe da sua área de residência. Uma condicionante que a muitos tornou impossível frequentar as aulas de condução, imediatamente a seguir à aprovação do código, vendo-se forçados a agendar o respectivo exame prático para uma altura que coincidisse com as férias lectivas de Verão.
No caso concreto do candidato a condutor que aqui represento, como familiar – embora, para meu conforto, tenha consciência de que, indirectamente, outros “representarei”, tendo em conta o número considerável de prejudicados pela trapalhada -, fica demonstrada a razão pela qual, tantas vezes, o cidadão comum, com a ligeireza própria da sua condição, se refere ao Estado como uma pessoa que não é de bem. Uma formulação que, em meu entender, é errada, porque o Estado, conceito abstracto, sendo, pois, o conjunto das instituições que regem, controlam e administram um país, é aquilo que gente de carne e osso, com poder de decidir, faz dele: ora dignificando-o, ora envergonhando-o.
No dia 4 (?) de Setembro de 2014, o meu familiar foi a exame de código, pela primeira vez, tendo sido aprovado. Considerando, pois, que a validade do código é de um ano, o prazo máximo para fazer o exame de condução seria até 4 de Setembro de 2015. Como foi estudar para Lisboa, decidiu requerer o exame de condução a partir de Junho, porque nessa altura, estando de férias, podia dedicar-se, a tempo inteiro, às aulas de condução.
Tendo em conta que os examinandos podem requerer, através dos estabelecimentos de ensino a que estão ligados, o exame prático de condução uma vezes por mês (refiro-me, naturalmente, às escolas de condução do distrito de Bragança), isso significa que, reprovando, os mesmos teriam, entre os meses de Junho e Setembro, a hipótese de mais três tentativas.
O meu familiar e a tantos outros candidatos a condutor, a quem foi marcado o exame de condução para o dia 29 de Setembro de 2015 (com o prazo de validade do código expirado), porque reprovaram nessa única tentativa, foi-lhe vedada a hipótese de repetir o exame que, em condições normais (se tivesse havido exames em Junho, Julho e Agosto), lhe seria assegurado. Ou seja: perderam o código, sendo que repeti-lo implica o pagamento de nova carta de condução.
Como não podia deixar de ser, resolvi expor superiormente o caso, fazendo questão de vincar os argumentos que me pareceram estar abrangidos pelos critérios da “razão atendível”, na convicção de que a resposta me seria favorável, e nela me fosse comunicado que, em razão do sucedido, iriam alargar o prazo de validade do código para os candidatos que foram prejudicados por uma situação à qual eram totalmente alheios.
De Lisboa, o “quartel -  general” do IMTT, a missiva foi remetida para a Direcção Regional de Mobilidade e Transportes do Norte, para ali ser apreciada pelo dirigente máximo, Fernando Lucas Oliveira, Director em regime de substituição.
O Estado, representado por este senhor, respondeu-me nos seguintes termos: “Após análise da reclamação apresentada (….) o contrato entre as partes interessadas (candidato a condutor e escola de condução) não é do âmbito das competências deste organismo, pelo que a haver algum litígio, o mesmo terá que ser resolvido nas entidades competentes (tribunais).”
Num registo informal, porque incomodado com a desfaçatez deste representante da res publica, não pude deixar de lhe devolver o troco, questionando-o, numa pergunta retórica, sobre quem mantinha o vínculo laboral com os examinadores que, à data, estavam em casa com pulseira electrónica.
Sendo a resposta o IMTT, e havendo da parte desta instituição apenas a preocupação de sacudir a água do capote, quando devia assumir as suas responsabilidades -  o que só lhe ficava bem e a credibilizava -, o único litigante que me poderia acompanhar em tribunal seria o representante do Estado que, mesmo sabendo que o(s) queixoso(s) estava(m) na posse da razão, não teve nem a humildade nem a decência de proferir a decisão que o bom senso recomendaria.
Porque o Estado, no vago e impreciso conceito que se lhe atribui, somos todos nós, não podemos consentir que ele, na pessoa dos seus representantes, nos falte ao respeito.
 
António Pires.

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3567

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