A opinião de ...

A presença das ausências

Por estes dias, nas nossas vidas, quer no âmbito pessoal, quer na esfera social, têm-se feito notar muitas ausências. Não sei se por especial sensibilidade advinda dos estados, mais de alma do que dos decretados, constato vincadamente isso mesmo.
Desde logo, não só porque neste mês de novembro lembramos de modo particular aqueles que fisicamente nos deixaram partindo para o Céu, mas também em razão das circunstâncias das medidas de combate à pandemia, em que sentimos fortemente as ausências daquelas e daqueles que, vivos, não podemos visitar, daquelas e daqueles, nossos familiares e amigos, com quem não trocamos gestos de afetividade e que nem nossos comensais podem ser, em partilha de pão, vida e paz.
Correlacionada ainda com o turbilhão existencial que a crise pandémica vem provocando na saúde, vêm a assinalável ausência de esperança e da crença de que “vai ficar tudo bem” na economia nacional, sentida um pouco por todos os portugueses, mas especialmente pelos empresários de micro, pequenas e médias empresas existentes em maioria no nosso concelho de Bragança, causada por quem, talvez, não se faz explicar convenientemente relativamente aos apoios que efetivamente existem, ou, talvez, não ousando dizer a verdade, não querem assumir que há uma enorme destruição da economia e que os apoios não estão a (não vão?) ser suficientes! Será por isso a ausência do Bloco de Esquerda na geringonça pré-orçamento de Estado 2021?
Neste momento, pelo evidenciado pelos nossos concidadãos, alguns amigos, com rosto fechado e lágrima a aflorar sobretudo pela ameaça aos seus projetos de vida, sustento da família e dos seus empregados e de tantas outras famílias e seus projetos de vida, já não adianta aumentar a capacidade de endividamento das empresas, sentindo que isso já não resolverá nada mas que terão de ser medidas de apoio a fundo perdido, pelo menos até à vinda da vacina, porque o País, sobretudo numa região de Interior como a nossa, tem de perceber que o seu futuro a médio e a longo prazo, sem estas empresas, será muito mais difícil ser positivo e sustentado, pois não haverá emprego e, logo, pessoas.
Precisamos de ver ultrapassada a ausência da ação dos responsáveis políticos, muito para lá dos meros anúncios, nas empresas, e pertinentemente também no cuidado das pessoas mais frágeis, ação que não é impossível compaginar, antes pelo contrário.
Precisamos de quem planeie bem, de quem crie cooperação e envolvimento de todos os atores com responsabilidades na res pública, pois os portugueses já demonstraram que são capazes também de fazer sacrifícios para resistir e ultrapassar as dificuldades.
A este propósito, devia-nos fazer pensar bem no que há a fazer sobre a notícia de que a Cáritas já apoiou, desde abril até outubro último, mais de 6000 pessoas, número que deve acrescer aos que já apoiava normalmente e a realidade que o Mensageiro de Bragança deu à estampa na edição da pretérita semana: há quase 3300 pessoas no distrito de Bragança que vivem sós ou isoladas. Quantas ausências, não?!!
Na quase totalidade, são habitantes do mundo rural. Este é um processo que está imparável. Os habitantes para além do natural envelhecimento, vão falecendo ou deslocam-se para as áreas urbanas, e os poucos que permanecem, a não ser pelo Pároco, pela sensibilidade das Juntas de Freguesia ou por alguma IPSS, vão caindo no esquecimento. São muitas pessoas que vivem longe de suas famílias, em condições de solidão verdadeiramente debilitantes e desoladoras.
Há algumas semanas, o Papa Francisco disse que “a solidão pode ser uma doença, mas com a caridade, a proximidade e o conforto espiritual podemos curá-la”. Estas palavras ajudam a compreender que, se é verdade que o coronavírus é mais mortal quando encontra um corpo debilitado, em muitos casos a patologia anterior é a solidão. Respondamos nós: presente!

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3808

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