A opinião de ...

O Entrudo 21

Escrevo antes do dia 16 de fevereiro, terça-feira de Entrudo. Não sei como vai passar-se o dia a que outros chamam Carnaval. (Como sou transmontano, aprendi que esta festa dedicada à folia e precede a quaresma é o Entrudo. Por isso, as raízes que ainda me prendem àquela terra obrigam-me a chamar-lhe assim).
Pois bem. Este ano, o Entrudo não vai ser como os que passaram. E é pena, porque já precisávamos de desanuviar desta odiosa situação a que uma universal e grave pandemia nos obriga! No próximo ano, provavelmente, voltará a ser como antes. Permito-me sugerir, então, que nos acautelemos, tenhamos paciência, conformismo e muita esperança.
Sem os bons momentos que o Entrudo proporciona, não posso deixar de pensar que muita gente irá ser privada dos negócios que tradicionalmente aconteciam nesta quadra – o que faz com que sofra uma dupla frustração: a do divertimento e, sobretudo a relativa à parte económica.
É que, embora o facto de se festejar o Entrudo obrigue a muita despesa, também leva a desenvolver o comércio, a indústria, a restauração, o turismo e os serviços. Trata-se, pois, de uma boa ocasião para muita gente repor o que perdeu durante o ano e, sobretudo, equilibrar a balança dos rendimentos ou até levá-la a inclinar-se para o saldo positivo.
Entretanto, não deixarei de lembrar que os foliões saudosistas e amantes destes festejos terão de recorrer às filmagens e às fotografias de anos anteriores para reverem a beleza das bailarinas, em trajes mais que reduzidos e provocantes, de corpo bronzeado, sambando freneticamente ao som da música festivaleira, em cima de carros primorosamente enfeitados.
Igualmente hão de servir-se dos mesmos recursos para admirar as vistosas e espampanantes matrafonas nos seus espalhafatosos vestir e andar, o balancear dos gigantones e dos cabeçudos, o ensurdecedor barulho dos zés-pereiras e as caricaturas de várias personalidades, meneando-se, gravemente, ao som da música.
Há de saltar-lhes à vista a magia das cores nos carros alegóricos; e também, nos carros alegóricos, as lantejoulas a brilhar ao sol e a alegrar o ambiente, tal como os enfeites de papel dependurados de cordéis a esvoaçar ao vento. E recordarão todo o mar de cores que, passando devagar diante de quem o observa, faz alegrar os corações e elevar a alma, pelo salutar e extasiante momento, que não deixa arredar pé a quem tem a felicidade de poder admirá-lo.
Lembrar-se-ão ainda da multidão que aplaude e se diverte com esta visão maravilhosa! E no meio da multidão, hão de entrever muitos e atrevidos mascarados, com as suas travessuras, a saltar de alegria.
Hão de ver os restaurantes e os cafés a abarrotarem de gente. E, entre ela, a que, enquanto saboreia petiscos e bebe a sua cerveja, aproveita para tratar de negócios ou para por a conversa em dia.
Por fim, será certo que não vão ver – só imaginar! – a tristeza e a desolação dos adereços que, por falta de informação, se interrogam por que motivo os deixaram assim abandonados, naqueles enormes armazéns!
Cansados de esperar, não resistiram ao sono. E será nos sonhos deste sono, que irão sentir-se ganhar vida e alegria – a vida e a alegria que, no Entrudo 21, lhes foram negadas e subtraídas.

Edição
3820

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