Autárquicas 2025 Poder Local – uma das maiores conquistas da democracia
Realizou-se, no passado dia 12, a 14ª edição das eleições autárquicas, após o 25 de Abril de 1974. Naturalmente que a maioria das pessoas mostra-se mais interessada em conhecer e analisar os resultados das diferentes candidaturas, neste acto eleitoral, do que propriamente em reflectir sobre a importância política da possibilidade de haver estas eleições.
No entanto, perante o avanço, incompreensível à luz da ética política, duma ideologia saudosista do regime que vigorou em Portugal desde Maio de 1926 até Abril de 1974, não podemos deixar escapar esta oportunidade de reflectir um pouco sobre o impacto que o Poder Local, criado no 25 de Abril de 1974, teve sobre o quotidiano dos portugueses, em geral, e os portugueses do interior, muito em particular. Efectivamente, a conquista do direito de os cidadãos poderem escolher o seus governantes regionais e de estes terem os seus orçamentos independentes da Administração Central foram, na minha opinião, uma das maiores conquistas do regime democrático. Basta reflectirmos um pouco sobre alguns factos incontestáveis.
1 - Em primeiro lugar, antes do 25 de Abril de 1974, as Câmaras Municipais e as Juntas de Freguesia eram de nomeação arbitrária do governo, em nada dependendo da vontade popular. Isso quer dizer que os escolhidos para essas funções tinham que ser do agrado dos governantes sediados em Lisboa e não dos residentes nos diferentes concelhos, pelo que, mais do que a sua competência de gestão, contava a sua fidelidade ao regime sediado em Lisboa.
Em segundo lugar, comparando o que se conseguiu, após o 25 de Abril, com o investimento feito pelos executivos das autarquias de qualquer partido, nos diferentes concelhos e, até, o investimento feito pelos diferentes governos em todo o país, por força da exigência dos municípios, não há comparação possível. Para confirmar esta situação basta compararmos o antes e o depois do 25 de Abril em 2 aspectos diferentes: os investimentos feitos pelas autarquias ao nível das infra-estruturas básicas de abastecimento de água, de saneamento básico e de transportes, e as infra-estruturas básicas construídas pela Administração Central por pressão da Administração Local.
Ao nível das infra-estruturas básicas de abastecimento de água, por exemplo, a grande maioria das autarquias do nosso distrito precisou de construir e construiu barragens. No caso de Bragança, recordo que, já nos finais do século XIX, se sentia um grave problema no abastecimento de água à população, que era altamente deficitário. A monarquia cedeu o lugar à I República e esta foi substituída pela ditadura militar do 28 de Maio. Durante todo esse período, de quase 100 anos, nunca o problema do abastecimento de água à cidade foi resolvido.
Mesmo após o 25 de Abril, os primeiros anos foram duma carência extraordinária a ponto de, nos meses de Agosto, só haver água canalizada da 1 da madrugada até às 6 da manhã. No entanto, só em 1986, após a adesão de Portugal à então CEE (agora UE), - o que seria impossível antes do 25 de Abril - é que o então presidente da Câmara de Bragança, José Luís Pinheiro, fez o projecto do Alto Sabor e o candidatou ao INTERREG, para o respectivo financiamento, tendo construído a 1ª fase do projecto – barragem da Serra Serrada – e recebido a verba correspondente. Só que as necessidades da população eram tantas e os recursos financeiros tão escassos que José Luís Pinheiro utilizou essa verba para pagar outras obras. Por essa razão, o INTERREG foi suspenso e quando Luís Mina tomou posse, em 1990, para poder usufruir das verbas do mesmo projecto para as fases seguintes, teve que pagar a barragem da Serra Serrada sem o dinheiro do INTERREG. Depois disso, em 8 anos entre 1990 e 1998, construiu e pagou a ETA, as condutas da Serra Serrada até à ETA e desta até à cidade, bem como a mini-hídrica, ficando por fazer apenas a barragem de Veiguinhas, que veio a ser adjudicada em 2013, no 16º ano da gestão de Jorge Nunes, e concluída em 2015, no primeiro mandato de Hernâni Dias. Ou seja, José Luís Pinheiro e Luís Mina resolveram, praticamente em 12 anos, o maior problema da cidade, que já se manifestara grave cerca de 100 anos antes.
2 - Como é óbvio, estes factos não nos permitem concluir que tudo é um mar de rosas nas autarquias eleitas democraticamente, porque, mesmo em democracia, não deixa de haver egocentrismos, incompetências e oportunismos, porque o povo, por razões diversas, pode deixar-se condicionar nas suas escolhas e eleger os menos competentes e os mais corruptos ou oportunistas. Só que os corruptos e desonestos da democracia não deixariam de tentar a sua sorte se vivêssemos num regime de ditadura como o anterior ao 25 de Abril, e cada um pode imaginar o que um corrupto de hoje não faria numa ditadura, em que não há oposição, nem liberdade de imprensa, nem o direito de criticar os governantes e seus acólitos e muito menos de agir judicialmente contra os governantes e seus subalternos incompetentes e corruptos.
Por outro lado, em democracia, há sempre a oportunidade de, nos actos eleitorais seguintes, emendar o erro e substituir quem nos desiludiu, o que não era possível na ditadura.
Por tudo isto e tendo em conta tudo o que as diferentes regiões conseguiram através do Poder Local, só podemos felicitar-nos pela sorte que temos de viver em democracia.