A opinião de ...

Quarenta Anos

 
Em 1974 tinha eu por residência um pequeno quarto num primeiro andar, pertença da Pensão Restaurante Machado Cura, na confluência da Rua 5 de Outubro e a Avenida João da Cruz, mesmo em frente aos Correios, em Bragança.
No dia 25 de Abril acordei à hora habitual e fui até à rua Almirante Reis para tomar o pequeno almoço, como sempre fazia. O João, um dos irmãos Vitorino, que tinham um quarto duplo no mesmo andar, foi comigo. O outro preferiu ficar a dormir mais um pouco, tal como fazia o Zé Dias de Macedo que estava no quarto contíguo ao meu.
De regresso, a caminho do Liceu, acordámos o Manuel Vitorino e em vão tentámos que o Zé se levantasse. Estávamos enganados nas horas, garantia ele.
O Zé descia para o café da manhã. Tinha um pequeno rádio e que ligava e pelas notícias para se levantar. Nesse dia só ainda dera música e portanto não houve como o convencer que as oito já tinham passado e lá fiocu no meio dos lençóis. Atrasados, subimos pelo bairro da Mãe de Água atravessando a linha do comboio e chegámos à aula da manhã já com o professor na sala. Houve outros colegas que também chegaram tarde. Só soubemos das notícias de Lisboa no primeiro intervalo da manhã: houvera uma revolução em Lisboa. Era, certamente, a continuação do movimento das Caldas do mês anterior. Lembro-me de irmos para as janelas do Liceu a espreitar e adivinhar as movimentações dos militares. De tarde sabíamos da adesão brigantina ao movimento e da resistência de Chaves para onde teria ido um pelotão.
Os dias que se seguiram foram de alegria efusiva.
No primeiro de Maio viemos para a rua manifestarmo-nos. A vida renascia. E esse renascimento vinha prenhe de novas realidades:
Uma certeza:  a liberdade chegara!
Uma preocupação: resolver rápida e definitivamente a guerra ultramarina!
Uma novidade: militares de que apenas sabíamos o nome de alguns eram os novos heróis!
Uma ilusão: a nenhum dos que nesses dias explodia em alegria e felicidade passava pela cabeça que, algures no tempo, quarenta anos depois, alguém poderia impedir aos nossos heróis de então de, livremente se manifestarem, no fórum da democracia, sobre o rumo tomado pelo regime que acabavam de “fundar”!
 
É disto também que é feita a liberdade! Poder escolher qualquer caminho!
 
Com quarenta anos, a democracia que então nascia, já amadureceu o suficiente para andar, com os seus próprios pés, pelos caminhos que vai escolhendo!

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